Lagarde, a coruja com estilo próprio que não vai deixar nenhuma pedra por virar no BCE
A revisão estratégica do banco central vai começar em janeiro e ficar fechada até ao final do ano. Na primeira reunião como presidente do BCE, Lagarde quis mostrar que traz ventos de mudança.
Christine Lagarde estreou-se na presidência do Banco Central Europeu (BCE) sem qualquer referência ao antecessor Mario Draghi, mas com um pedido e uma garantia: pede que não se façam comparações e promete que não se vai focar no passado. A francesa, que garante que terá o seu próprio estilo, chegou com uma revisão estratégica debaixo de olho. “Vão ser levantadas cada e qualquer pedra” no banco central.
A expectativa era grande. Esta quinta-feira foi a primeira vez em oito anos que a conferência de imprensa, em que são explicadas as decisões tomadas na reunião de política monetária do BCE, não foi liderada pelo italiano. As atenções estavam viradas para a francesa, tentando-se perceber diferenças entre os dois.
O statement introdutório (acordado dentro do Conselho de Governadores) trouxe muito poucas mudanças face ao que Draghi costumava dizer. E Lagarde sabia o escrutínio a que estava sujeita. “Vou ter o meu próprio estilo. Não interpretem demasiado. Não façam segundas interpretações. Eu vou ser eu própria e, por isso, provavelmente diferente“, disse, nas primeiras palavras após o discurso lido.
"Vou ter o meu próprio estilo. Não interpretem demasiado. Não façam segundas interpretações. Eu vou ser eu própria e, por isso, provavelmente diferente.”
O seu estilo começou esta quinta-feira a definir-se e deixou já claro que não parece interessada em jogar o jogo das pistas nas entrelinhas. Além deste comentário, rejeitou (tal como já tinha feito numa entrevista ao alemão Die Zeit) a classificação clássica dos banqueiros centrais.
“De uma vez por todas, não sou nem uma pomba nem um falcão. A minha ambição é ser uma coruja que é normalmente associada à sabedoria”, referiu quando considerou que uma das perguntas — sobre os conflitos internos no Conselho de Governadores — tinha como objetivo perceber o seu posicionamento.
“Não estou cheia de vaidade, mas vou certamente tentar trazer ao de cima o melhor dos membros do meu Conselho de Governadores com vista a alcançarmos decisões de política monetária e usarmos os instrumentos da forma mais consensual possível”, acrescentou.
Não queria falar da revisão, mas foi o grande tema
Se a primeira nota de Lagarde foi sobre as potenciais interpretações das suas palavras, a segunda foi sobre a revisão estratégica que está a ser preparada dentro do BCE. “Sei que estão à espera de pormenores, mas não vou dar, e de propósito, que assim seja”, afirmou.
No entanto, este foi um dos grandes temas falados e já foram conhecidos vários pormenores, a começar pelo timing: vai começar em janeiro e pretende estar fechada antes do final do ano. “Tem de ser exaustiva, olhar para todo e qualquer assunto e virar toda e qualquer pedra. Por isso, irá demorar tempo, mas não demasiado tempo. O nosso objetivo é que esteja fechada antes do final de 2020“.
Lagarde lembrou que esta será a primeira revisão do género desde 2003 (ou seja, ainda antes da crise financeira que levou o BCE a implementar nunca antes vistas na Zona Euro). “Após 16 anos da mesma estratégia, penso que já é tempo”, disse, sublinhando que “com a chegada ao novo emprego” considera que a reflexão é “apropriada”.
"Tem de ser exaustiva, olhar para todo e qualquer assunto e virar toda e qualquer pedra. Por isso, irá demorar tempo, mas não demasiado tempo. O nosso objetivo é que esteja fechada antes do final de 2020.”
A expectativa é que este exercício resulte numa redefinição da meta de inflação, um tema que é, há anos, alvo de críticas e que o próprio Draghi já tinha abordado. Lagarde sinalizou que será assim, mas explicou que a revisão será abrangente e irá incluir vários intervenientes, incluindo o Parlamento Europeu, académicos ou membros da sociedade civil.
“Todos os bancos centrais que estão a conduzir este exercício de revisão estratégica estão a olhar para as suas metas, em particular como é definido o objetivo de médio prazo e como é conseguida a estabilidade de preços dos mandatos”, disse. O BCE tem um mandato única de inflação próxima, mas abaixo de 2% pelo que “esse assunto será efetivamente central para a revisão estratégica”.
Tecnologia, alterações climáticas e desigualdade são alguns dos temas que Lagarde quer ver incluídos na revisão. Quanto a instrumentos, haverá de certeza uma avaliação aos juros negativos e à compra de ativos, mas não é tão certo que se explorem novas opções. “É completamente legítimo que se avaliem os efeitos dos instrumentos usados no passado. Quanto ao futuro, penso que será o Conselho de Governadores a decidir”, acrescentou.
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