Governo quer formar melhores líderes na administração pública
Para a secretária de Estado da Inovação e da Modernização Administrativa, Maria de Fátima Fonseca, é urgente capacitar as lideranças no setor público e a inovação deve começar "a partir de dentro".
Bons líderes precisa-se. É uma urgência da maior parte das organizações que queiram garantir a sobrevivência no futuro, mas o tema parece surgir, a maior parte das vezes, a partir da perspetiva de empresas do setor privado. O que acontece afinal na função pública? A Pessoas conversou com a secretária de Estado da Inovação e da Modernização Administrativa, Maria de Fátima Fonseca, sobre o que tem sido feito para capacitar os líderes na administração pública.
A direção-geral da Qualificação dos Trabalhadores em Funções Públicas (INA) entregou a 16 de dezembro os certificados aos finalistas de mais um Curso Avançado de Gestão Pública (CAGEP), destinado a profissionais com cargos de direção superior na administração pública.
Presente na ação de capacitação, a secretária de Estado da Inovação e da Modernização Administrativa, Maria de Fátima Fonseca, defendeu a necessidade de inovar na liderança e da capacitação dos atuais e futuros líderes em funções nos vários setores da administração pública, melhorando assim a gestão das entidades do setor público em matéria de recursos humanos.
O que é ser um bom líder?
“Ser um bom líder hoje em dia é muito exigente, porque as competências dos trabalhadores também adquiriram novas dimensões“, defende a secretária de Estado da Inovação e da Modernização Administrativa. “Compor e organizar equipa, compreender o perfil de cada trabalhador, organizar as equipas em função de alavancas que cada perfil individual pode trazer para o seu desempenho, essas são características muito importantes“, exemplifica.
"No fundo, essa apropriação do setor privado de valores que eram tipicamente valores do setor público tem vindo a aproximar os dois universos. Porque é que o setor público ainda é diferente? Porque, neste caso, não se trata de uma renovação do modelo de negócio.”
“Quando pedimos aos trabalhadores que, além do perfil mais técnico, tenham uma camada muito significativa de competências mais humanas e relacionais, o que nós estamos a exigir a um líder é que também saiba construir em cima disso“, explica Maria de Fátima Fonseca.
Público e privado: dois universos cada vez mais próximos
“Qual é o fator diferenciador do setor público que, na verdade, está cada vez mais atenuado? É a questão da missão”, sublinha a secretária de Estado, que acredita que há mais coisas que unem do que aquelas que separam entre as abordagens da liderança dos setores público e privado.
“No fundo, essa apropriação do setor privado de valores que eram tipicamente do setor público tem vindo a aproximar os dois universos. Porque é que o setor público ainda é diferente? Porque, neste caso, no setor público não se trata de uma renovação do modelo de negócio. O setor público tem de viver com o enquadramento das missões de serviço público“, explica Maria de Fátima Fonseca.
“O líder tem de ter uma componente de competência técnica de compreensão da área do negócio, de pensamento estratégico sobre a área de negócio da organização que lidera, mas é sobretudo um gestor de pessoas”, acrescenta.
Preparar novos líderes e capacitar os atuais
Em julho deste ano, o INA anunciou a criação do Centro de Desenvolvimento de Liderança, em parceria com o Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública: um polo de formação e incentivo à liderança no contexto público, destinado aos gestores atuais e aos futuros líderes na administração pública. Os programas inseridos no centro de desenvolvimento promovem a “aprendizagem, criação e difusão de conhecimento sobre liderança em contexto público, com um modelo de atuação inovador e um portefólio de ações orientadas para as necessidades dos líderes em matéria de desenvolvimento de competências”, lê-se no site oficial.
“Globalmente precisamos de renovar o pessoal dos organismos públicos, mas precisamos de renovar com pessoal qualificado, porque aquilo que foi verdade no passado, em que a administração pública tinha centros de competências técnicas que eram utilizadas inclusive pelo setor privado, foi algo que se foi diluindo ao logo do tempo“, sublinha a secretária de Estado.
"O líder tem de ter uma componente de competência técnica de compreensão da área do negócio, de pensamento estratégico sobre a área de negócio da organização que lidera, mas é sobretudo um gestor de pessoas”
O Centro de Desenvolvimento de Liderança tem disponíveis vários programas de capacitação de liderança de longa duração, de curta duração, conferências e grupos de discussão, para “permitir que os trabalhadores vão, ao longo da sua vida profissional, ganhando não só as competências técnicas como as competências humanas e relacionais que ninguém aprende lendo um livro, ou fazendo um curso de formação instantâneo“, explica a secretária de Estado.
Administração pública quer talento e diversidade
Os modelos de recrutamento são um dos fatores mais diferenciadores entre o setor público e o privado. A contratação na administração pública depende de concursos, que contam com um quadro jurídico específico que regula os recursos humanos. Com a aposta na capacitação da liderança de forma contínua, Maria de Fátima Fonseca tem esperança que esta seja uma forma de atrair novos talentos e renovar gerações nas funções de liderança da administração pública.
É também uma forma de os profissionais “não se eternizarem nos cargos, para haver democracia interna no acesso aos cargos, que é um indicador da saúde organizacional da própria administração pública“, destaca.
"Precisamos de inovação em tudo. Precisamos de inovar por dentro também. Uma organização inovadora na sua gestão, naturalmente é uma organização que é inovadora nos produtos e nos serviços.”
A capacitação da liderança de forma contínua “vai permitir-nos que, num prazo razoavelmente curto, tenhamos mais pessoas a candidatar-se aos procedimentos concursais, portanto mais pessoas com portefólios de competências pessoais interessantes para os cargos de liderança, mais diversidade”, reafirma a secretária de Estado.
Para breve, está previsto o lançamento de um programa de mentoria para profissionais da administração pública em funções de liderança, revela.
“Direito ao desafio”: experimentar novos modelos de gestão
“Precisamos de inovação em tudo. Precisamos de inovar por dentro também. Uma organização inovadora na sua gestão, naturalmente é uma organização que é inovadora nos produtos e nos serviços”, reafirma a secretária de Estado.
Em 2018, o Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública lançou o programa “direito ao desafio”, no âmbito do Sistema de Incentivos à Inovação na Gestão Pública (SIIGeP). O “direito ao desafio” é um sistema de incentivo à inovação na gestão pública que apoia organizações a testar novos modelos de gestão.
“O que a equipa vai propor ao Governo é que suspenda temporariamente as normas que estão a inibir aquela experimentação e substituir por um quadro jurídico temporário que diz como é que a organização vai funcionar”, esclarece Maria de Fátima Fonseca. Sem impedimentos legais, é possível testar novas soluções de gestão efetiva, de planeamento e até de monitorização, propostas pelas próprias organizações, em ambiente real. Se forem válidas, serão aplicadas em todos os organismos públicos. Valorização dos recursos humanos, melhoria dos ambientes de trabalho e desenvolvimento de modelos de gestão, são os três das áreas para as quais as entidades podem candidatar-se.
O sistema estreou-se em duas categorias de projetos experimentais, nos agrupamentos de centros de saúde (ACeS) e em sete entidades da administração central. No primeiro ano, envolveu mais de 150 entidades de quase todas as áreas de governo e 36 projetos sendo que, só em agosto deste ano foi publicada a legislação (decreto-lei n.º 126/2019, de 29 de agosto), que cria e autoriza a implementação dos primeiros projetos experimentais.
O “direito a desafio” permitiu ainda “lançar o encorajamento para que as equipas, os dirigentes, possam ser mais ousados, por vezes, na experimentação de novos modelos de funcionamento”, remata a secretária de Estado.
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