Maioria dos parceiros sociais rejeita intervenção da Comissão Europeia no salário mínimo
Grande parte dos parceiros sociais portugueses afirma que a Comissão Europeia não deve interferir nos aumentos do salário mínimo, consideram um tema exclusivo de cada Estado-membro.
A maioria dos parceiros sociais portugueses afirma que a Comissão Europeia não deve interferir nos aumentos do salário mínimo, sublinhando que este é um tema da exclusiva responsabilidade de cada Estado-membro.
Esta é a resposta de três das quatro confederações patronais portuguesas com assento na Concertação Social e da CGTP à Comissão Europeia que, no dia 14 de janeiro, anunciou que irá lançar uma fase de consultas com os parceiros sociais com vista a assegurar que todos os trabalhadores na União Europeia (UE) tenham salários mínimos justos.
“A presente iniciativa é suscetível de manifesta crítica e, assim, forte oposição”, afirma à Lusa o presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal, António Saraiva.
“Estamos perante uma iniciativa muito preocupante e eventualmente perigosa no sentido de que, pela primeira vez, a Comissão pretende atuar diretamente sobre a matéria de salários, a qual, na nossa perspetiva, deve continuar a ser da competência nacional dos diferentes Estados”, reforça António Saraiva.
O presidente da CIP lembra que a maioria dos países da UE tem salário mínimo e defende ser “crucial ter em conta e respeitar a diversidade dos sistemas de relações laborais vigentes nos diferentes Estados-membros, assim como os seus métodos de fixação de salários”.
Por outro lado, Saraiva sublinha que a Comissão Europeia, “no âmbito das políticas sociais estabelecidas pelo Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, não tem competência para introduzir instrumentos relativos aos salários, uma vez que tal faculdade interferiria significativamente nos sistemas de fixação de salários dos Estados-membros”.
Também o presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), João Vieira Lopes, afirma à Lusa que “Portugal tem um sistema consolidado de consultas em torno dos aumentos do salário mínimo” e por isso “não se justifica a intervenção da Comissão Europeia”.
Em Portugal, o salário mínimo nacional, que este ano é de 635 euros brutos, é fixado pelo Governo, após ouvidos os parceiros na Concertação Social.
A posição é ainda partilhada pela Confederação do Turismo de Portugal (CTP), presidida por Francisco Calheiros, que, em declarações por escrito à Lusa, considera que “há assuntos bem mais relevantes na Europa por discutir neste momento”.
“Sobre o tema da fixação de um salário mínimo europeu, a CTP demonstra, para já, a sua não concordância com a iniciativa”, uma vez que a atualização de remunerações “tem de respeitar o espaço da negociação, em especial, da negociação coletiva”, frisa Francisco Calheiros.
Por outro, continua o presidente da CTP, “a fixação de um salário mínimo europeu, muito embora em termos percentuais à média salarial de cada Estado-membro, é uma tentativa de mais uma imposição administrativa comunitária de fixação de algo que deve ser aferido Estado-membro a Estado-membro, mediante as suas circunstâncias internas, em diálogo entre parceiros sociais e governos”.
Do lado das centrais sindicais portuguesas, as posições divergem, com a CGTP a criticar a “ingerência” da Comissão Europeia no salário mínimo e a UGT, por seu lado, a concordar com a proposta do executivo comunitário.
Para o secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos, “a proposta da Comissão Europeia visa claramente assumir uma lógica de ingerência naquilo que é responsabilidade de cada Estado-membro, que é definir as políticas de contratação coletiva e simultaneamente de aumentos salariais”.
“Estamos perante um embuste porque não há um salário mínimo europeu. O que há é uma discussão sobre critérios que, a serem aplicados, seriam prejudiciais para os trabalhadores portugueses”, sublinha o líder da intersindical, acrescentado que a UE “continua apostada em manter as desigualdades e uma legislação do trabalho que acentua os desequilíbrios das relações laborais”.
Já o líder da UGT, Carlos Silva, manifesta o seu “apoio a esta proposta da Comissão” por ter como objetivo “garantir a existência de um salário mínimo em todos os Estados-membros, mas deixando aos vários governos e aos parceiros sociais a possibilidade de determinar a forma de fixar e atualizar o valor do salário mínimo, em linha com a realidade económica, empresarial e social de cada país”.
Em 14 de janeiro, a Comissão Europeia anunciou o lançamento de uma primeira fase de consultas com os parceiros sociais com vista a assegurar que todos os trabalhadores na UE tenham salários mínimos justos.
O executivo de Ursula von der Leyen adotou, em Estrasburgo, uma comunicação sobre a “construção de uma Europa social forte para transições justas”, com propostas de ação ao nível comunitário que se propõe colocar em marcha nos próximos meses, sendo uma das primeiras ações o lançamento da primeira fase de consultas com empresas e sindicatos sobre a questão de salários mínimos na UE, esclarecendo que a ideia não é uniformizar o salário mínimo na Europa.
“Não haverá um salário mínimo universal. Qualquer potencial proposta refletirá tradições nacionais, seja a nível de acordos coletivos, seja em termos de disposições legais”, aponta a Comissão Europeia, acrescentando que “alguns países já têm excelentes sistemas em vigor”.
O objetivo do executivo comunitário é, então, “assegurar que todos os sistemas são adequados, têm cobertura suficiente, incluem consultas aprofundadas com os parceiros sociais e têm um mecanismo de atualização apropriado”.
A ‘Comissão Von der Leyen’ justifica esta iniciativa apontando que, embora a taxa de emprego na UE esteja num máximo histórico, “muitos trabalhadores têm dificuldades em fazer o salário chegar ao final do mês”, pelo que trabalhará no sentido de assegurar que “cada trabalhador tem um salário mínimo justo que lhe permita ter uma vida decente, independentemente de onde trabalhem” na União.
Relativamente à consulta agora iniciada, a Comissão indica que “está em modo de escuta”, já que o seu objetivo nesta fase é “saber se os parceiros sociais acreditam que é necessária ação da UE e, em caso afirmativo, se desejam negociar a questão entre si”.
De acordo com dados publicados em dezembro passado pela Comissão Europeia, as variações entre os salários mínimos praticados na Europa continuam a ser vincadas, oscilando entre os 286 euros na Bulgária e os 2.071 euros no Luxemburgo (valores de 2019), surgindo Portugal na segunda metade da tabela, na 12.ª posição entre os 22 países que praticam um vencimento mínimo.
O salário mínimo em Portugal aumentou em 01 de janeiro para os 635 euros, face ao valor de 600 euros praticado em 2019, o que, ajustado tendo em conta os 14 meses, equivale a um aumento de 700 para 740 euros, os valores tidos em conta nos cálculos do Eurofund para estabelecer uma comparação entre os Estados-membros.
Seis Estados-membros da UE não têm salário mínimo: Áustria, Chipre, Dinamarca, Finlândia, Itália e Suécia.
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