Sem estratégia conjunta, mercado prepara-se para inundação. Petróleo afunda 5%
Acordo de cortes de produção que está em vigor desde início de 2017 chegou ao fim num momento crítico. Com a procura afetada, a oferta poderá disparar. Os preços serão os mais castigados.
Com 3,5 mil milhões de pessoas a viver em confinamento a nível global, as deslocações são limitadas e a procura por combustíveis afunda. É neste cenário de perturbação do mercado petrolífero que um conflito entre os dois maiores produtores de petróleo do mundo pôs fim ao alinhamento da oferta.
Desde 2017 que a Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP) — cartel liderado pela Arábia Saudita — e um grupo de outros grandes produtores, liderado pela Rússia alinhavam a estratégia num acordo que limitava a produção de cada um com o objetivo de limitar o excedente do mercado e manter a estabilidade dos preços.
Com maiores ou menores dificuldades, a estratégia mantinha-se há três anos. Até esta terça-feira. É que os dois gigantes não conseguiram chegar a acordo sobre o que fazer em relação à pandemia de Covid-19 e o conflito levou ao fim do acordo, numa altura crítica para o mercado.
“A situação fundamental no mercado petrolífero continua a deteriorar-se. As projeções para a procura estão em queda livre devido ao coronavírus. Ao mesmo tempo, a oferta está a aumentar”, alerta Barbara Lambrecht, analista de commodities do Commerzbank, sublinhando que o crude russo já negoceia próximo dos 15 dólares por barril e, no Canadá, a matéria-prima afundou menos para os cinco dólares por barril.
O Brent de referência europeia não negoceia a preços tão baixos, mas também sofreu com o conflito. A evolução da cotação do barril valorizou de forma gradual desde a implementação do corte de produção, tendo atingido em outubro de 2018 o máximo de 86 dólares por barril e fechou 2019 nos 68 dólares. Este ano, já perdeu 65% e está no valor mínimo desde 2002.
Em reação ao fim do acordo, bem como à subida dos inventários nos EUA, a matéria-prima desvaloriza, esta quarta-feira, pondo fim a uma curta recuperação. O Brent cai 5% para 25 dólares por barril e o norte-americano crude WTI perde 1,5% para 20,50 dólares.
Brent abaixo dos 30 dólares
Fonte: Reuters
“Com o fim do acordo conseguido em 2016 passa a ser ainda mais relevante que a Arábia Saudita e a Rússia resolvam as suas disputas, inesperadamente iniciadas face à posição da Rússia em não participar num novo acordo de redução da produção para mitigar os riscos da epidemia do Covid-19 e sustentar o preço do barril, isto numa altura que o impacto do coronavírus ainda era desconhecido”, aponta Ângelo Custódio, trader do Banco Best.
Mas a Arábia Saudita já disse que pretende aumentar as exportações para um volume recorde de 10,6 milhões de barris por dia. O anúncio escalou ainda mais as tensões entre os países e levou mesmo o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a intervir sem sucesso.
A incerteza fez cair as projeções para o preço da matéria-prima. As sondagens da Reuters indicam que o Brent de Londres deverá ficar abaixo de dos 40 dólares este ano (contra a estimativa superior a 60 dólares em fevereiro) e que o crude WTI negoceie nos 35 dólares (contra 56 dólares esperados anteriormente).
“Verificando o forte impacto que o novo coronavírus já está a ter na economia mundial e com as perspetivas da evolução do preço do petróleo a serem revistas em baixa, aumenta ainda mais a pressão para um acordo entre a OPEP e parceiros de modo a evitar perdas significativas nos mercados e reduzir o desequilíbrio entre oferta e procura”, refere Custódio.
Da mesma forma, Carlos Jesus, diretor-adjunto do CaixaBI, sublinha a curta margem de manobra que os dois produtores têm. “No fim do dia, nem os sauditas nem os russos têm capacidade de manter esta guerra por muito tempo. Tendo uma economia mais diversificada, a Rússia estaria, em teoria, mais bem equipada para resistir mais tempo. Mas com o surto de Covid-19 a atingir as economias de todo o mundo de forma violenta, nenhum pode dar-se ao luxo de prolongar esta guerra indefinidamente”.
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