Após trimestre “fantástico”, Cushman já sente o impacto. “Não se compra um centro comercial por videoconferência”

Na consultora imobiliária Cushman & Wakefield, os colaboradores já estavam mais do que preparados para uma situação destas. Mas, ainda assim, os impactos desta crise estão a ser sentidos.

Apesar de o primeiro trimestre ter sido “o melhor de sempre” na história da Cushman&Wakefield (C&W), a crise já está a afetar a atividade da consultora imobiliária. Eric Van Leuven passa os dias em casa, dividido entre reuniões com a equipa e os investidores. Embora a empresa já estivesse tecnicamente preparada para o teletrabalho, o diretor-geral da C&W admite que tem sido difícil fechar negócios, principalmente com imóveis comerciais. Na rubrica diária do ECO, Gestores em teletrabalho, Eric Van Leuven conta como, ainda assim, é possível celebrar com toda a equipa o negócio do mês. “Cada um nas suas casas, de copo na mão”.

Eric Van Leuven está de “auscultadores na cabeça” das 8h30 às 19h30. “Trabalhar em casa é muitíssimo mais stressante do que trabalhar no escritório”, confidencia ao ECO. É por isso que começa o dia às 6h30, com uma corrida matinal que diz ser necessária para a sua saúde mental. As primeiras chamadas começam às 8h30, conta, e todos os dias, às 13h, tem reunião virtual marcada com a restante direção europeia da C&W. Os temas são sempre os mesmos: “questões operacionais” e “questões dos clientes”. Apesar de stressante, nem tudo é mau. “Há coisas positivas no meio disto tudo. A situação puxa pela criatividade e pela inovação”, nota.

“Todos os dias falo com, pelo menos, três ou quatro clientes e cinco ou seis colaboradores”, diz o responsável pela Cushman, notando que está em “reuniões virtuais o tempo todo”. Na empresa “já se começa a pensar no regresso ao escritório, mas obviamente ainda não há data”. “Até porque os clientes pedem isso”, continua. Contudo, reconhece que esse regresso será “gradual” e que trará “restrições” em termos de densidade e limpeza.

Mas as equipas da C&W estão minimamente preparadas, garante, assim como já estavam preparadas para o teletrabalho. “Já fazemos formações há muitos anos, o teletrabalho não é de agora”, diz, acrescentando: “de há uns anos para cá possibilitámos e incentivámos a trabalhar a partir de casa”. “Em termos técnicos estávamos mais do que preparados”, afirma, referindo que, para além disso, a consultora tem acordos com o LinkedIn e promove formações. Mas, acima de tudo, Eric Van Leuven reitera que “o crucial é manter contacto com toda a equipa”.

E é isso mesmo que a Cushman põe em prática. Eric Van Leuven tem um escritório em casa, onde diz que pode estar “sossegado”, mas reconhece que tem colegas com filhos e em casas sem jardim ou espaço exterior. “Isto é duro para muita gente”, afirma, notando a importância de manter as pessoas motivadas. É por isso que, na última sexta-feira de cada mês, como sempre, se vai reunir — virtualmente — com os colaboradores e continua a celebrar o negócio do mês. “Na última sexta-feira de março fizemos isso, mas cada um na sua cada, de copo na mão”, conta o responsável. “Foi uma grande balbúrdia, mas foi muito giro e é uma maneira de manter as pessoas envolvidas e lhes alegrar um pouco o dia”.

“Obviamente que estamos a sentir o impacto”

“Março acabou por ser absolutamente fantástico e foi o melhor trimestre de sempre na nossa história”, diz Eric Van Leuven. Para abril, a Cushman tem já vários negócios imobiliários de tal forma avançados “que já não vão recuar”, faltando apenas tratar de certas formalidades. Contudo, o responsável admite que estes bons ventos não serão duradouros e que o impacto da crise provocada pelo novo coronavírus já está a ser sentido. “Há operações que vão a meio, em que o processo foi lançado, há interessados, houve visitas e esses processos continuam, mas com atrasos. Porque o facto de as pessoas não se poderem juntar e de ser mais difícil visitar os imóveis atrasa os processos”, explica.

Talvez o vendedor de uma habitação consiga vender um apartamento a quem queira comprar um golden visa, mas no nosso tipo de negócio isso não acontece. Não se compra um centro comercial através de videoconferência.

Eric Van Leuven

Diretor-geral da Cushman & Wakefield Portugal

E depois há ainda “processos que estão no início, que estavam para ser lançados, e que foram quase todos abortados, congelados. Obviamente que isso vai ter um efeito no final do ano em termos de volume“, antecipa o gestor imobiliário, notando que, acima de tudo, é importante manter o contacto com os clientes. “Até porque eles estão certamente mais perdidos do que nós”. Mas, ainda assim, as consequências práticas estão à vista. “Talvez o vendedor de uma habitação consiga vender um apartamento a quem queira comprar um golden visa, mas no nosso tipo de negócio isso não acontece. Não se compra um centro comercial através de videoconferência“, refere. “Iniciar e concluir um negócio de investimento parece-me difícil”.

Recuperação? “Se soubéssemos a resposta, íamos a caminho de ser milionários”

Para o diretor da Cushman, é ainda impossível “vaticinar qual será o resultado final” que esta crise vai deixar no mercado imobiliário. E sobre uma recuperação do setor, Eric Van Leuven diz que “essa é a grande questão: quando e como?”. “Se soubéssemos a resposta, íamos a caminho de ser milionários”, completa. O gestor nota que muito se discute sobre a recuperação da economia, se será em “V”, “U”, “W” ou “L”. Mas o responsável pela Cushman acredita que, tal como leu há dias num artigo, a recuperação acontecerá em forma do logótipo da Nike: “uma queda abrupta e depois uma recuperação mais prolongada”. E afirma desde logo que “o mundo será diferente e o mercado será diferente” depois desta crise.

Antecipando “grandes mudanças” para o setor imobiliário, Eric Van Leuven diz estar convencido de que “o imobiliário sempre existirá e vai sempre precisar de ser comercializado, vendido, avaliado e gerido”. “Não tenho medo que no nosso setor, de repente, deixe de haver procura pelos nossos serviços. Mas admito que haverá alterações na forma como as empresas trabalham”, nota, acreditando que, no futuro, “uma percentagem dos trabalhadores estará sempre em teletrabalho”.

Na zona de conforto da Cushman, no mercado imobiliário comercial, o responsável acredita que a procura por escritórios deverá diminuir, dado que as empresas procurarão escritórios não para todos os colabores, mas com mais espaço por colaborador. No retalho, haverá o “grande teste ao online”. “Se tudo correr bem, pode haver uma maior faixa da população que descubra a conveniência da encomenda online” e o comércio alimentar “vai ter de se adaptar a essa realidade e melhorar os sistemas”.

Uma coisa que esta crise não fez foi diminuir o capital disponível para investir e essa liquidez no mundo continua a haver, está só à espera de ser aplicada.

Eric Van Leuven

Diretor-geral da Cushman & Wakefield Portugal

Em termos de investimento, o diretor da consultora imobiliária diz que, nas últimas semanas, falou com cerca de uma centena de investidores imobiliários e que, “obviamente, as opiniões divergem”. Mas, de um modo geral, nos “edifícios menos novos”, Eric Van Leuven acredita que “haverá um ajuste de preços”. Contudo, os “ativos muito bons, edifícios novos e com bons inquilinos, que requerem taxas de rentabilidade mais baixas, não perderão e, eventualmente, poderão ganhar valor”. E remata, afirmando que “uma coisa que esta crise não fez foi diminuir o capital disponível para investir e essa liquidez no mundo continua a haver, está só à espera de ser aplicada”.

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