A maior exportadora nacional, a Volkswagen Autoeuropa retomou a produção a 27 de abril, com um plano "detalhado" que contempla mais de 100 medidas para proteção dos trabalhadores.
Quase dois meses depois de ter suspendido a produção devido ao novo coronavírus, a Volkswagen Autoeuropa retomou a produção na fábrica de Palmela, a 27 de abril. Com um “plano detalhado” de segurança, que inclui um número reduzido de trabalhadores e medidas de higiene apertadas, agora a maior exportadora nacional não produz apenas carros. A “nova vida” da fábrica de Palmela passa também pelo fabrico de material de proteção individual para os colaboradores e doar a instituições.
Este “plano detalhado de adaptação à nova realidade” provocada pela pandemia do Covid-19 conta com mais de 100 medidas e foi delineado durante “cerca de seis semanas”, período em que a fábrica de Palmela esteve de portas encerradas. Isto sempre em colaboração com “a rede de fábricas na China e na Europa”, bem como o contribuído das entidades oficiais como a Direção-Geral da Saúde”, explicou Miguel Sanches, diretor-geral da Volkswagen Autoeuropa.
Parte importante de todo este processo tem sido a melhoria contínua. Ou seja, esta é uma realidade nova, é uma realidade para a qual não estávamos preparados (…) e continuamos continuamente a melhorar, quer com a ajuda dos nossos parceiros sociais, quer dos nossos colaboradores e de todos os que têm oportunidade de nos visitar.
A prioridade da fabricante de automóveis foi, desde logo, assegurar que fossem estabelecidas medidas de higiene e “proteção dos trabalhadores”, que começaram “muitas” delas a ser tomadas desde o dia “28 de fevereiro”, já antes de o plano estar concluído. “Tivemos de nos reinventar”, assinalou o diretor-geral, durante a visita oficial do primeiro-ministro, António Costa, e do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, às instalações.
Nesse sentido, e de forma a minimizar o risco de um eventual contágio do vírus, a Autoeuropa criou “50 rotas para transportar os trabalhadores, que vêm de locais como Alcácer do Sal, Grândola e Loures. Normalmente, cada rota tem um autocarro. Só que como limitámos a lotação dos veículos, tivemos de triplicar o número de autocarros, passando para 150 veículos”, detalhou Miguel Sanches.
Controlo de temperatura, menos trabalhadores e uma cantina adaptada
A partir do momento em que entram nas instalações da fábrica de Palmela, os funcionários ou visitantes são sujeitos a um controlo de temperatura e nem os altos representantes do Estado escaparam a esse procedimento, efetuado já dentro do autocarro da fabricante de automóveis que dava o mote para o início da visita.
Com uma área total de 1.100.000 metros quatros (cerca de 154 campos de futebol), face a esta “nova realidade”, os turnos de trabalho nestas instalações foram também reduzidos. Antes da pandemia, a fábrica operava em três turnos, mas face às medidas implementadas os turnos foram reduzidos para dois (manhã e tarde), sendo que atualmente estão cerca de 2.300 pessoas a trabalhar na fábrica, no total dos cinco mil funcionários já que a empresa tem trabalhadores em regime de lay-off simplificado.
Além disso, todas as pessoas são obrigadas a trabalhar máscara e muitas delas de luvas também. Quanto às refeições, a Autoeuropa voltou a reabrir a cantina para os funcionários poucos dias depois de retomar a atividade, mas com divisões de acrílico para separar os lugares e cumprir o distanciamento social recomendado. Mas para os trabalhadores que queiram evitar ao máximo o contacto estão a ser distribuídas “snack boxes” até aos locais de trabalho. Neste último caso, o subsídio de alimentação é pago.
Menos carros, mais máscaras e viseiras
Com 25 anos de existência, naquela que é considerada a maior exportadora produziam-se cerca de 900 veículos por dia antes da pandemia — no ano passado alcançou uma produção recorde que colocou a Autoeuropa no topo das exportadoras nacionais. Contudo, a redução do número de trabalhadores encurtou esse número. Certo é que em todos os postos de trabalho foram adotadas pedidas de higiene e segurança.
À entrada da porta principal da área onde se localiza o laboratório de impressões 3D e alinha de montagem final, estão também fitas a indicar a distância de segurança que deve ser garantida entre trabalhadores, assim como gel desinfetante.
Neste espaço, com mais de 53 mil metros quadrados, trabalham cerca de um terço do total de funcionários, sendo que aqui localizam-se duas das partes mais importantes da produção. No centro de inovação da montagem, mais conhecido como “laboratório de impressões 3D”, são feitas ferramentas de auxílio à montagem de peças no carro.
Mas face à paragem da fábrica, a unidade de produção reinventou-se e adaptou a tecnologia utilizada para começarem a produzir equipamentos de proteção individual de combate ao Covid-19. Até segunda-feira, foram produzidos nesta sala 3.166 viseiras, que foram posteriormente doadas a 50 instituições, e 932 esticadores para máscaras.
Neste espaço situa-se também a montagem final. Aqui transforma-se uma carroçaria — que é basicamente chapa pintada –, num carro acabado montado. “Nós montamos todo o interior. Tudo o que são peças que não é chapa é montado aqui nesta área”, explica um dos funcionários ao ECO. Contudo até chegar a este patamar, um carro passa por várias fases. Numa primeira fase, “a chapa vem em rolos, é cortada com o tamanho certo e depois prensada. As peças prensadas são depois enviadas para o departamento das carroçarias, que tem de soldar as peças para a forma que têm. A seguir passa para a pintura, seja normal ou bicolor”, detalha o trabalhador.
Até estar completamente finalizado, um veículo passa por mais de 200 estações, sendo que na linha de montagem o distanciamento entre colaboradores é mais difícil de cumprir já que é um trabalho que pode ser feito “a várias mãos”. Assim, depois de um carro estar completamente montado, tem de passar pela linha de testagem, de forma a garantir que cumpre todas as normas de segurança para circular.
Durante a visita oficial, Presidente da República, primeiro-ministro e ministro da Economia tiveram a oportunidade de andarem “prego a fundo” na pista de 2,5 quilómetros, como gesto simbólico da retoma da Autoeuropa à atividade.
E o futuro?
Com as várias economias mundiais a retomarem a atividade de forma gradual o futuro da indústria automóvel é ainda uma incógnita. Certo é que a paragem da produção de carros já se faz sentir em Portugal. De acordo com os dados da Associação do Comércio Automóvel de Portugal (ACAP), a produção automóvel caiu 95,7% em abril quando comparada com o mesmo mês homólogo. Foram produzidos “apenas” 1.238 automóveis ligeiros e pesados no país e pela primeira vez não houve um único carro comercial ligeiro produzido no país. Já as vendas de carros afundaram 84,6% em abril.
Ainda assim, segundo o diretor-geral da Autoeuropa até ao momento a cadeia de fornecimento da fábrica “não foi interrompida por qualquer incidente ou por qualquer problema de produção nas suas fábricas respetivas”, disse na reta final da visita.
Ainda estamos a fazer um pouco de gestão de crise. Temos encomendas que não são recuperáveis, para já.
Contudo, o responsável assumiu perante ao primeiro-ministro que ainda há pouca procura pelos carros fabricados pela fábrica portuguesa e cujos principais destinos são Espanha, Itália, França, Alemanha e Reino Unido. “Ainda estamos a fazer um pouco de gestão de crise. Temos encomendas que não são recuperáveis, para já”, disse Miguel Sanches.
Como sinal de confiança para a indústria, António Costa anunciou que o Governo iria comprar uma viatura a cada uma das quatro fábricas que produzem automóveis em solo nacional, de diferentes categorias. A aquisição vai ser efetuada no próximo Conselho de Ministros.
Mas para já o objetivo da Autoeuropa passa por voltar a ganhar a confiança dos “fornecedores”, bem como na “melhoria continua” de adoção de medidas para “uma realidade para a qual não estávamos preparados, lembrou Miguel Sanches. Isto apesar de ter sido noticiado num início desta semana que um funcionário da Autoeuropa tinha sido diagnosticado com o novo coronavírus.
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Motor das exportações já arrancou, mas a meio gás. E já não faz só carros
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