UTAO “deixará de existir” tal como está se nova LEO for aprovada
Unidade Técnica de Apoio Orçamental diz que atividade da entidade "deixará de existir" tal como está agora caso tenha de analisar propostas "incomportáveis", como proposto na nova LEO.
O coordenador da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) considerou que a atividade da entidade “deixará de existir” tal como está agora caso tenha de analisar propostas “incomportáveis”, como proposto na nova Lei de Enquadramento Orçamental (LEO).
Num memorando assinado por Rui Nuno Baleiras enviado à Comissão Parlamentar de Orçamento e Finanças (COF), a que a Lusa teve acesso, o coordenador da UTAO conclui que a proposta do Governo para alterar a LEO de 2015 usa a unidade “para limitar consideravelmente o número de iniciativas legislativas dos deputados, passando a exigir estudos técnicos de avaliação de impactos económico-orçamentais em número e variedade incomportáveis”.
O também professor universitário alerta que “toda a demais atividade atual da UTAO deixará de existir”, estimando igualmente que “serão bem reais os riscos de conflitualidade interna na AR [Assembleia da República] e de degradação da imagem pública do parlamento” caso a proposta seja aprovada.
A votação na especialidade ocorrerá esta quarta-feira às 10:00.
“Se o objetivo dos proponentes é reduzir o número de iniciativas legislativas com impacto orçamental potencial por ano, por que é que não se limitam a estatuir na lei um número máximo de iniciativas a submeter?“, questionou ainda Rui Nuno Baleiras.
As críticas do coordenador da UTAO têm base na proposta do Governo para alterar a LEO de 2015, que imputa à unidade independente “a responsabilidade de avaliar o impacto nas contas públicas de todas as iniciativas legislativas […] que tenham um valor potencial na receita ou na despesa superior a 0,01% da despesa”.
“Só é possível saber se uma iniciativa supera aquele limiar depois de a estudar, pelo que a exigência de avaliação se aplica aos milhares de iniciativas da AR com impacto orçamental que são propostas todas as sessões legislativas”, argumenta o coordenador da UTAO.
Rui Nuno Baleiras acrescenta que a alteração para 0,02% e uma exigência de número mínimo de deputados subscritores em sede de Orçamento do Estado, proposta pelo PS, “não muda a essência do problema”.
“Só quem não faz a mais pálida ideia do que está em causa poderá inscrever em letra de lei tal obrigação. E nem com uma redução em 99,9% nesse número, os objetivos da PPL 37 [proposta de lei 37, em causa] e da proposta do GP [grupo parlamentar] do PS serão exequíveis”, denuncia o economista.
O memorando assinado por Rui Nuno Baleiras observa também a desproporcionalidade da nota explicativa do Governo emitida após as primeiras críticas da UTAO à nova LEO, considerando inclusive a referência ao Congressional Budget Office (CBO) dos Estados Unidos por parte do executivo.
“Talvez tivesse sido útil reconhecer que o CBO tem um quadro técnico com mais de 200 profissionais, a maioria do qual habilitada com o grau de Doutor e enorme experiência útil adquirida noutras indústrias antes de aderir ao CBO, abrangendo economistas, mas também engenheiros, farmacêuticos, geógrafos”, entre outros, “muito conhecedores de mercados e setores específicos de atividade económica”, refere o memorando.
Baleiras observa, para justificar a impossibilidade de cumprir as funções caso as alterações à LEO forem aprovadas, que na elaboração de dois relatórios recentes “foram necessários 33 dias de trabalho de 1,25 pessoas” e o sacrifício da apreciação em contabilidade nacional das contas do primeiro trimestre de 2020.
A UTAO dispõe de cinco analistas e de um coordenador, pelo que se se dedicarem exclusivamente a estudos de impacto orçamental “não farão mais nada” e “a AR e o país perdem o acompanhamento técnico independente que a UTAO lhes tem proporcionado há quase 14 anos”.
Caso a proposta seja aprovada, Rui Nuno Baleiras afirma ainda que passará a existir uma “desigualdade de oportunidades de avaliação entre Governo e AR” no que diz respeito às propostas, coloca a UTAO “a tomar decisões sobre quais serão as iniciativas legislativas a ter que ser instruídas com o seu estudo técnico”, e com o “ónus […] de atrasar o processo de decisão política”, e ainda sob “pressão política para abaixamento da qualidade”.
Num relatório em junho, a UTAO já tinha criticado as alterações, considerando que tem mais pontos negativos do que positivos, tendo as propostas sido também objeto de críticas do Tribunal de Contas e do Conselho das Finanças Públicas.
A secretária de Estado do Orçamento, Cláudia Joaquim, afirmou na semana passada que a proposta de avaliação do impacto orçamental de iniciativas legislativas pela UTAO não pretende ser um visto e admitiu que esta função poderá exigir um reforço de recursos daquela unidade.
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