Isenção do IVA nas prestações de serviços médicos “Finalidade terapêutica” e dificuldade de prova
Toda esta temática carece de maior regulamentação, enquanto isso, frequentemente a prova feita pela AT, falha ou é pouco esclarecedora.
No art. 9º, n.ºs 1 e 2, do Código do IVA estão isentas de imposto prestações de serviços efetuadas no exercício das profissões de médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas; prestações de serviços médicos e sanitários e as operações estreitamente conexas efetuadas por estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares.
Estabelece esta norma que as prestações de serviços realizadas no exercício da profissão de médico ou em meio hospitalar estão isentas de imposto. A aplicação da isenção está longe de ser inequívoca e a sua interpretação tem sido feita por recurso à Diretiva IVA e às decisões do Tribunal de Justiça da UE.
De acordo com a jurisprudência comunitária, a norma abrange as prestações de serviços realizadas por médicos que se destinem a diagnosticar, prevenir, tratar e curar doenças físicas ou psíquicas, bem como, os serviços médicos que tenham como finalidade a proteção, manutenção e restabelecimento da saúde das pessoas, ou que visem a reposição do bem-estar psíquico e social do indivíduo, face às considerações subjetivas do paciente atestadas por um clínico, e desde que tenham – finalidade terapêutica.
Diríamos, em consonância com o decidido pelo TJUE que para efeitos da isenção são elegíveis as prestações de serviços de assistência médica, que não obstante a natureza da intervenção, visem assegurar objetivos mais amplos de bem-estar físico, mental ou social completo e não a mera ausência de doença ou enfermidade.
Várias são as especialidades médicas em que podem surgir dúvidas, sendo a mais frequente a cirurgia plástica, reconstrutiva e estética, em que a questão da preponderância da finalidade estética pode colocar-se. Tratar varizes, operar a miopia, rinoplastia e correção do septo nasal são intervenções com intuito terapêutico ou estético?
A AT tem fiscalizado prestadores de serviços médicos nestas áreas da saúde, no entanto, sempre que emite uma liquidação adicional no sentido de fazer incidir IVA sobre atos em que considera não ser aplicável a isenção, é sobre si própria, de acordo com o art.º. 74, n. 1 da Lei Geral Tributária que incide o ónus de provar a existência do facto tributário. Cabe à AT demonstrar que existe uma finalidade puramente estética, não terapêutica, no ato médico em causa e que o mesmo não é isento.
As dificuldades de fazer esta prova são evidentes. Segundo a Diretiva IVA, as faturas (art.º.226/6) devem conter a menção e natureza dos serviços prestados, mas não a sua discriminação minuciosa. Para aferir se existe um quadro clínico associado ao tratamento que vá para além da finalidade estética, a AT esbarra com informação protegida por sigilo médico, nomeadamente, o que incide sobre o processo clínico dos doentes. O acesso a esta informação depende de autorização judicial, (art.º. 63/2 da LGT), mediante pedido fundamentado por parte da AT e a dispensa do sigilo profissional tem caráter excecional (Regulamento 707/2016, DR 21 de Julho 2016 e Regulamento de Deontologia Médica). O interesse público da cobrança de impostos não permite ultrapassar este caráter excecional sem quaisquer restrições ou limites. Mesmo que o tribunal o defira, este acesso terá de ser feito através de um médico (Lei 12/2005 de 25/01).
Toda esta temática carece de maior regulamentação, enquanto isso, frequentemente a prova feita pela AT, falha ou é pouco esclarecedora. Vale por isso a pena, na maior parte das situações, sindicar a legalidade destes atos de liquidação adicional de IVA, junto dos tribunais, fazendo prevalecer a isenção.
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