“Dear CTO”. Uma carta aberta que vai fazê-lo pensar na sua empresa

"Quer queira ou não, o teletrabalho veio para ficar. É adorável que a sua empresa não seja adepta do trabalho remoto, mas saiba que isso trará, inevitavelmente, consequências", lê-se na carta.

O trabalho remoto veio para ficar e vai mudar a realidade das empresas para sempre. Esta é uma das conclusões que alguns estudos e especialistas têm vindo a avançar e com a qual o engineering manager João Alves, de 29 anos, não podia estar mais de acordo. Numa carta que escreveu aos CTO (chief technical officer), intitulada “Dear CTO, remote will change your company forever”, defende que o trabalho remoto, já implementado por algumas empresas e, sem dúvida, acelerado com a pandemia mundial, é incontornável. E que cabe às empresas adaptarem-se a esta nova realidade.

“Quer queira ou não, o teletrabalho veio para ficar. Não há problema se acreditarmos que as equipas no local trabalham melhor. É adorável que a sua empresa não seja adepta do trabalho remoto, mas saiba que isso trará, inevitavelmente, consequências ao nível do talento. Está disposto a fazer essa troca?”, começa por questionar o profissional, que gere uma equipa de desenvolvimento de software de 10 pessoas na Adevinta, uma empresa com cerca de 5.000 trabalhadores.

Ser uma empresa remote first significa aumentar o leque de talento, podendo ir procurar e contratar a qualquer parte do mundo. Mas isso traz também alguns desafios para as empresas, nomeadamente no que toca ao estabelecimento de uma distância tolerada na hora de contratar, que pode ser apenas dentro do mesmo país, em países com fusos horários semelhantes ou até em qualquer parte do globo, sem restrições.

Por outro lado, João Alves refere, também, desafios ao nível da decisão dos benefícios, que podem ou não variar consoante a localização do colaborador, e das ferramentas e processos necessários para apoiar esta transição para o trabalho à distância, são algo que considera “fundamental”.

Abraçar o remote, renovar a cultura empresarial

Outro benefício que o profissional tecnológico considera que o trabalho remoto traz é o maior equilíbrio entre aquilo que é a vida pessoal e a vida profissional das pessoas. “Se as pessoas confiarem na comunicação assíncrona, podem levar os seus filhos à escola, tomar conta de um familiar ou assistir a uma aula de ioga às 10 horas da manhã”, refere, acrescentando que é uma questão de renovar a cultura empresarial. E, com projetos e produtos bem geridos e com propósitos definidos, as pessoas também tenderão a ficar mais tempo nas empresas, o que contribuirá para diminuir a taxa de rotatividade.

Além disso, João Alves considera a contratação de talento júnior e inexperiente um investimento importante. Apesar de as ofertas para cargos de trabalho remoto serem, sobretudo, para engenheiros sénior, o programador afirma que é impressionante ver como os colaboradores júnior se adaptam às novas formas de trabalho, absorvem a cultura empresarial e começar a produzir.

"Até podemos pensar que ter equipas on-site é melhor. Mas, gostemos ou não, a possibilidade de os trabalhadores conseguirem oportunidades em remoto muda as regras do jogo. E muda-as de uma maneira drástica.”

João Alves

Gestor de engenharia

“Se tiver a cultura certa e lhes der uma oportunidade de crescer, também criará uma ligação com eles”, escreve, acrescentando que, talvez, também contribua para as melhores métricas de retenção das empresas. No entanto, para isso, é preciso melhorar os processos de onboarding, desenvolver as capacidades de coaching dos profissionais séniores, bem como documentar melhor os sistemas e práticas da empresa.

“Se as pessoas sentirem que pertencem à organização, criarão uma ligação à sua empresa que será mais difícil de destruir”, afirma João Alves. E questiona os CTO: “Quando foi a última vez que implementou uma ideia de um trabalhador no seu produto ou empresa? Preocupa-se com a saúde física e mental do seu empregado? Que ações levou a cabo para melhorá-la?”. Empresas que têm uma missão e um conjunto de valores para além do seu EBITDA, e que se preocupam com a felicidade dos seus colaboradores, estão claramente em “significativa”.

Em conversa com a Pessoas, o gestor de engenharia assinala que a intenção desta “carta aberta” era, sobretudo, fazer uma “reflexão acerca do que significa este movimento do trabalho remoto, sobretudo em empresas de base tecnológica”. “O cerne da questão vai além daquilo que eu, ou o CEO/CTO de uma empresa possamos pensar. Até podemos pensar que ter equipas on-site é melhor. Mas, gostemos ou não, a possibilidade de os trabalhadores conseguirem oportunidades em remoto muda as regras do jogo. E muda-as de uma maneira drástica”, sublinha.

De acordo com dados recolhidos pela CTO’s Portugal, organização sem fins lucrativos que junta cerca de três centenas de diretores de tecnologia em Portugal, quase metade dos CTO portugueses acredita que o futuro do trabalho no país passará por um modelo híbrido que permita aos trabalhadores laborar, a partir de outro local, determinados dias por mês, coordenando-os com outros tantos dias a trabalhar a partir do escritório. Considerando os modelos híbrido, remote first ou 100% remoto, a percentagem de profissionais técnicos que acredita que o futuro assentará nestes é de 88% (quase nove em cada dez).

João Alves conta ainda que, se há um ano conhecia entre 10 a 15 pessoas a trabalharem em empresas americanas a partir do Porto, de Lisboa ou de Barcelona, atualmente conhece “50”. “Aqui há várias coisas que devemos analisar. E são essas perguntas que eu mesmo me faço, e que tento provocar no leitor. Estamos preparados para que uma empresa que paga cinco vezes mais mais venha concorrer connosco? Como é que nos preparamos? Que tipo de riscos corremos? Se acabamos a ceder ao trabalho remoto — por convicção ou por forças do mercado — há toda uma panóplia de perguntas que surgem de seguida”.

Com Mariana de Araújo Barbosa.

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