Poder versus empatia. Pandemia criou dois mundos e duas lideranças

O mundo mudou, as pessoas mudaram e, consequentemente, as organizações também. A liderança dividiu-se em dois: numa perspetiva hierárquica e tradicional e numa ótica coletiva e empática.

Quase se pode falar de uma liderança antes da pandemia mundial e de outra depois dela. O mundo alterou-se, as pessoas mudaram e, consequentemente, as organizações também tiveram de adaptar-se a novas dinâmicas e ritmos de vida. A liderança deixou de ser apenas um título, e passou a ser uma atitude. E pode ser desenvolvida por qualquer pessoa. No entanto, nem todos os líderes mudaram de perspetiva e souberam mergulhar neste novo mundo que a pandemia veio acelerar.

“Tivemos dois mundos a funcionar em paralelo. Primeiro, um mundo de controlo, em que as pessoas estão muito cansadas. O não presencial fez com que se inventassem coisas para saber se as pessoas estavam ou não em casa a trabalhar, ao ponto de controlarem se as câmaras estavam ligadas. Por detrás disso, estão posicionamentos de liderança muito tradicionais“, começa por dizer Ana Tereza Maçarico, human capital & management consulting da Optimistic Consulting e associate senior consultant da CEGOC, durante o painel “As skills dos novos líderes: quem são, de que maneira a pandemia os mudou e como eles vão mudar o mundo e as empresas?” integrado na conferência que assinala o segundo aniversário da revista Pessoas, sob o tema “Trabalho, esse lugar estranho”.

Conferência “Trabalho, esse lugar estranho” - 25MAR21
Ana Tereza Maçarico é human capital & management consulting da Optimistic Consulting e associate senior consultant da CEGOC.Hugo Amaral/ECO

Por outro lado, Ana Tereza Maçarico fala de um segundo mundo, distinto e completamente oposto, em que há mais autonomia, propósitos e empowerment. “Estas pessoas também trabalharam muito mas com um novo propósito, com uma alegria muito grande e com outra energia”, continua, acrescentando que viu líderes adquirirem uma capacidade de compaixão enorme, estando empáticos com quem tem, por exemplo, filhos em casa ou familiares doentes.

Anabela Chastre também fez parte deste painel e confessou também ter visto dois tipos de líderes. A CEO da Chastre Consulting considera que a pandemia trouxe competências, sobretudo sociais, que, até então, não eram muito observadas. Empatia, interação e comunicação constituem o caminho que os líderes têm de percorrer para encontrar formas de chegar às pessoas, face à ausência de partilha de um espaço físico comum. “No outro dia ouvi uma frase que dizia que estamos todos na mesma tempestade, mas em barcos diferentes. É real. É isso que o líder tem de ver”, afirma.

"No outro dia ouvi uma frase que dizia que estamos todos na mesma tempestade, mas em barcos diferentes. É real. É isso que o líder tem de ver.”

Anabela Chastre

Chastre Consulting

O estudo sobre “Future Leaders” desenvolvido pela LLYC, também demonstra que os líderes do futuro têm, agora, uma presença emocional muito maior. “Têm menos receio de expor as suas emoções pela positiva face àquilo que eram os modelos de liderança tradicionais e, portanto, no fundo, têm um perfil mais humano”, revela Tiago Vidal, sócio e diretor geral em Portugal da LLYC.

Da liderança hierárquica à liderança coletiva

Para Tiago Vidal, o conceito de liderança sempre esteve muito associado à questão hierárquica. Agora, fala-se mais da liderança coletiva, algo que já estava em cima da mesa dos gestores, mas que, com a pandemia, se tornou ainda mais urgente, relevante e evidente. A liderança coletiva, mais do que a questão do poder, leva-nos ao tema de liderar pelo know-how, pela experiência e capacidade criativa relativamente a um determinado tema.

“Eu tenho projetos na minha empresa em que sou liderada por pessoas que têm menos 20 anos do que eu, porque sabem muito mais daquele tema do que eu sei. O meu papel de líder aí é agregar esse talento e conduzi-lo para os objetivos, porque eles lideram o processo pelo conhecimento”, conta o sócio e diretor geral em Portugal da LLYC.

"Eu tenho projetos na minha empresa em que sou liderada por pessoas que têm menos 20 anos do que eu, porque sabem muito mais daquele tema do que eu sei.”

Tiago Vidal

Sócio e diretor geral em Portugal da LLYC

A liderança torna-se, portanto, cada vez mais transversal e está ao alcance de qualquer um, pois lideram-se opiniões, projetos, momentos, ideias… É o “estar” líder e não tanto o “ser” líder numa ótica de poder. “Quanto mais hierárquicos ou formais forem estes modelos, menos as empresas têm oportunidade de se destacar”, considera Anabela Chastre.

Conferência “Trabalho, esse lugar estranho” - 25MAR21
Anabela Chastre é CEO da Chastre Consulting.Hugo Amaral/ECO

Carla Sequeira, secretária-geral da CIP, acrescenta que é, também, muito importante que o gestor seja cuidador das suas pessoas e que seja capaz de dar-lhes esse espaço de autonomia e de momentos de liderança. “A liderança sempre foi um processo de influência social. Quem está a mudar são os gestores. Estão a sentir que têm de ser mais líderes e menos gestores de processos”, afirma a secretária-geral da CIP, acrescentando que, desde o líder ao trabalhador, as pessoas mudaram e isso reflete-se nas organizações. “Percebem que há coisas mais importantes e que nós não estávamos a valorizar”, continua.

Uma nova caixa de ferramentas para líderes

Essa mudança obriga, também, a uma aprendizagem e adaptação. Os próprios líderes gestores têm de aprender a liderar neste “novo mundo”, a liderar pessoas e empresas diferentes. “Eu não sei bem muito bem como vou liderar num futuro híbrido“, confessa Tiago Vidal.

“Nós não podemos ir para o escritório fazer o mesmo que fazemos em casa. Temos de aproveitar esse momento conjunto de outra forma. Portanto, há aqui um conjunto de ferramentas que temos de aprender. Vão ajudar-nos a fazer esse upskiling enquanto gestores e até a trazer aqueles que ficaram mais para trás”, considera.

Conferência “Trabalho, esse lugar estranho” - 25MAR21
Tiago Vidal é sócio e diretor geral em Portugal da LLYC.Hugo Amaral/ECO

Para Ana Tereza Maçarico, atravessamos um período de incerteza demasiado grande para tomar decisões arrojadas. “Esta não é uma altura de decisões. É uma altura para aprender muito e para apanhar tudo o que vem com otimismo”, diz.

Sobre o futuro há poucas certezas mas um modelo híbrido é, tal como alguns estudos e especialistas têm vindo a indicar, o mais expectável. “A mobilidade vai ser o tema. Não tanto se fica dentro ou fora, mas mais o estar móvel. O trabalhar deixa de ser um local e passa a ser uma ação”, diz Carla Sequeira. O diretor-geral da LLYC está de acordo, considera que serão os modelos híbridos e as as situações intermédias que permitirão tirar o melhor de todos os modelos existentes.

Conferência “Trabalho, esse lugar estranho” - 25MAR21
Carla Sequeira é secretária-geral da CIP.Hugo Amaral/ECO

Se não teve oportunidade de assistir em direto à conferência “Trabalho, esse lugar estranho”, realizada pela Pessoas, poderá assistir agora através deste link.

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