Anacom recorre de condenação no 5G. Alega que tribunal “não é constituído por engenheiros”
Condenada por excluir uma proposta no concurso público para criar plataforma do leilão do 5G, a defesa da Anacom alega que a sentença "padece de vários vícios" e "viola separação de poderes".
A Anacom já recorreu da sentença que readmitiu a empresa de software ANO ao concurso público para o desenvolvimento da plataforma do leilão do 5G. O advogado do regulador argumenta que a decisão da juíza Clara Ambrósio “padece de vários vícios”, incluindo o que diz serem contradições e violação do “princípio da separação de poderes”.
Num documento datado de 8 de janeiro de 2021, ao qual o ECO teve acesso, José Luís Esquível, em defesa da Anacom, considera que o tribunal “invade a esfera de livre margem de apreciação da Administração Pública”, uma vez que “nenhuma norma jurídica impede que a Administração reserve para si a faculdade de apreciar se determinada solução é ou não um meio alternativo à plataforma de leilão”.
Em causa está o facto de o júri do concurso público da Anacom ter excluído a proposta da ANO, alegando que a mesma não apresentava uma redundância que permitisse continuar o leilão em caso de alguma avaria técnica. A ANO considera, em contrapartida, que a sua proposta, na verdade, previa uma plataforma redundante, pelo que considerou que a exclusão foi ilegal. O tribunal de primeira instância deu-lhe razão.
Porém, a Anacom não se conformou. O advogado do regulador alega que o tribunal “violou a reserva da atividade administrativa que a Constituição da República Portuguesa e a lei guardam para a Administração Pública”, lê-se no recurso. Esse é o primeiro “vício”. O advogado elenca também aquilo que considera serem contradições no teor da sentença, justificando assim que a proposta da ANO foi legalmente excluída, sendo este o segundo problema observado pela defesa na sentença.
O terceiro e último “vício”, na visão da defesa, é o de que a sentença do tribunal não explica “com que base é que considerou” que a proposta da ANO “dá resposta à exigência do caderno de encargos”. “Assumindo que o tribunal a quo não é constituído por engenheiros informáticos, desconhece-se o fundamento que permitiu chegar à referida conclusão”, escreve o advogado.
“Nestes termos, requer-se a vossas excelências que se dignem julgar o presente recurso provado e procedente e, em consequência, revogar a sentença recorrida, com as respetivas consequências legais, assim fazendo justiça”, conclui o advogado da Anacom, nas alegações remetidas ao Tribunal Central Administrativo do Norte.
Com trânsito em julgado, solução é indemnização
O ECO noticiou a 1 de abril o teor da sentença do tribunal de primeira instância, que considerou que a proposta da ANO não era válida para o referido concurso público. O trabalho acabou por ser adjudicado a uma empresa de Aveiro, a Ubiwhere, que, numa primeira fase, chegou a ser excluída do concurso por motivos semelhantes aos da proposta da ANO. No entanto, o júri acabou por considerar que a Ubiwhere tinha apresentado, efetivamente, um mecanismo de redundância em caso de falha na plataforma do leilão — a apresentação das licitações por email.
Na altura, contactada, a Anacom tinha confirmado que iria recorrer da sentença do tribunal nortenho. “Nos termos previstos na lei e no exercício de um direito que lhe assiste, a Anacom apresentou recurso da decisão do tribunal administrativo de primeira instância, por discordar da mesma, pelo que, não tendo ainda a referida sentença transitado em julgado, não cabe, na presente data, proceder à execução da mesma”, afirmou fonte oficial do regulador.
E caso perca a ação? “Se o tribunal de recurso mantiver a sentença de primeira instância, a Anacom analisará o acórdão que vier a ser proferido e, em função do teor do mesmo, avaliará a situação em concreto de entre as diversas alternativas legalmente previstas”, acrescentou fonte oficial da entidade liderada por João Cadete de Matos.
O contrato com a Ubiwhere foi assinado há mais de um ano, depois do concurso público, e não só a plataforma já foi desenvolvida como o leilão vai já em mais de 60 dias de licitações por parte das operadoras. Por isso, nesta fase, ao que o ECO apurou, uma coisa é tida como praticamente certa em ambos os lados da barricada: mesmo no caso de a Anacom perder o recurso, o leilão em curso não deverá ser travado e a solução poderá passar por uma indemnização à ANO no valor da proposta que apresentou (menos de 100 mil euros).
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