EDP diz que venda das barragens “não gera ganho”. Vai declarar mais valia de 216 milhões às Finanças

A empresa revelou aos deputados que "à venda de ações está associada uma mais-valia contabilística de 216 milhões de euros", que será agora declarada no Modelo 22 a entregar pela empresa às Finanças.

A EDP garante que “em termos reais e económicos, a transação [de venda de seis barragens no Douro à francesa Engie] não gera um ganho” para a empresa. “O preço recebido em 2020 pela EDP (cerca de 2,2 mil milhões de euros) não é superior ao valor despendido com estes aproveitamentos hídricos, com a regularização dos títulos de Miranda, Picote e Bemposta, em 2007, somado ao investimento nos reforços de potência e ao investimento em Baixo sabor, Feiticeiro e Foz Tua”, respondeu a elétrica às perguntas dos deputados e ao pedido de informação adicional enviado pela Comissão parlamentar de Ambiente, Energia e Ordenamento do Território, na sequência da audição do CEO da EDP, Miguel Stilwell d’Andrade, perante aquela comissão.

No documento, ao qual o ECO/Capital Verde teve acesso, a EDP explica que “não existe neste processo mais-valia contabilística ou fiscal associada a cada uma das barragens, pois trata-se da venda de um portfólio, e não da venda ou trespasse de concessões”.

No entanto, revela que à venda de ações da Camirengia (empresa criada por cisão simples a partir da EDP Produção para deter as barragens) à Movhera (empresa criada pelo consórcio liderado pela Engie para adquirir estes ativos) “está associada uma mais-valia contabilística de 216 milhões de euros”, que será agora declarada no Modelo 22 a entregar pela empresa às Finanças (e que será escrutinado no âmbito da inspeção em curso pela Autoridade Tributária).

Ao todo são 28 páginas, 21 perguntas e 21 respostas, ao longo das quais a EDP confirma que não pagou o imposto de selo no valor de 110 milhões de euros, justifica porquê, e garante que cumpriu a lei e acautelou o interesse estratégico nacional na venda das barragens. O dossiê está agora entregue à Autoridade Tributária, que tem 12 meses para decidir se a EDP fez planeamento fiscal abusivo e se deve ou não 110 milhões de imposto de selo pela venda das seis barragens da EDP no Douro à francesa Engie, mas na esfera política o tema continua a servir de arma de arremesso entre oposição e Governo.

Esta terça-feira, o PSD entregou no Parlamento um novo requerimento dirigido ao Ministério do Ambiente e Ação Climática, no qual questiona porque não foi feita a “avaliação económica aprofundada” defendida num parecer intermédio da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), de julho de 2020. Nesse documento, frisam os sociais-democratas, os cálculos da APA “mostravam que a EDP mais do que triplicava o investimento realizado na transmissão das concessões” comparativamente ao valor pago ao Estado no âmbito da renegociação das concessões em 2007.

Tal como o ECO/Capital Verde já tinha noticiado, esta avaliação da APA apurou que o valor das barragens aumentou até 33 vezes entre 2007 e 2020, dando um salto de um valor contabilístico de 78,1 milhões para um valor atual de 1,7 mil milhões. A EDP vem agora esclarecer que este montante mais recente é “meramente indicativo” e não reflete a decomposição do preço oferecido pelo consórcio liderado pela Engie”.

A EDP diz que foi a própria APA a insistir em querer saber o valor individual de cada uma das barragens, “o que não constitui uma informação de que necessitasse para fazer a avaliação que lhe competia nos termos da lei”, aponta a elétrica.

“A EDP recebeu mais de 10 ofertas, todas elas traduzindo-se num único preço a pagar pela compra da empresa detentora do portfólio de barragens. A determinação do preço pelo comprador resultou num preço único de 2,2 mil milhões de euros. Não foi definida uma repartição individual para cada barragem. A avaliação resultou da gestão integrada do portfólio que implica um prémio estratégico quantificado em 20-30% do valor global da transação, pelo projeto industrial, pela oportunidade de entrada no mercado português e ibérico e pelas sinergias associadas”, esclarece a elétrica em reposta aos deputados.

Ainda assim, alerta agora o PSD no seu mais recente requerimento que, a meio do seu processo de avaliação, a APA referiu não estar “em condições de autorizar a transmissão já que está em causa o interesse público e a situação não é clara face aos processos judiciais, nacional e comunitário, que estão a decorrer”.

“Esta é uma questão que não pode deixar de ser muito preocupante e que obriga a uma avaliação jurídica e económica aprofundada, avaliando também a necessidade de se dar conhecimento da presente situação ao Ministério Público, apesar de ser público”, referia a APA nesse parecer, citado pelos sociais-democratas, que agora questionam o Governo porque é que não se promoveu a reavaliação do equilíbrio económico e financeiro dos contratos de concessão, antes de autorizar o negócio da venda das barragens.

Nos esclarecimentos adicionais aos deputados, a EDP dá já a resposta pedida entretanto pelo PSD e diz que “o portfólio avaliado em 2007 pelas entidades independentes contratadas pelo Estado [no âmbito da extensão do domínio hídrico, hoje alvo de processo judicial a decorre no Ministério Público] não é diretamente comparável com o portfólio abrangido pela transação de 2020” de venda das barragens. E diz ainda que essa mesma transação, por si só, não implica uma reavaliação do valor económico dos títulos de utilização do domínio público hídrico, como tem vindo a ser defendido.

Em 2007, três das barragens (no Douro Internacional) foram avaliadas por bancos independentes, no total, em 891 milhões de euros, sendo que apenas 661 milhões foram de facto pagos pela EDP para ver as concessões que lhe tinham sido atribuídas estendidas até perto de 2030. Caso a empresa realizasse investimentos nas mesmas, tal como aconteceu, essa extensão aumentaria por mais alguns anos: até 2042 no caso de Miranda Douro; até 2063 no Picote; e até 2056 na Bemposta.

No entanto, frisa a elétrica, apesar dos 661 milhões pagos, para os registos contabilísticos ficaram apenas os 78 milhões referidos no parecer da APA. “Em termos reais, é possível demonstrar que o preço a receber não permite à EDP compensar na totalidade o custo suportado com as concessões do Douro Internacional, e que este é claramente superior ao valor a receber por parte do comprador”, tinha já referido a elétrica num outro documento a que o ECO teve acesso.

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