Grupos de media portugueses pressionam Google a partilhar receitas

Impresa, Media Capital e RTP pressionaram publicamente a Google a partilhar receitas com os media. Diretor-geral da multinacional no país responde que "não há pote de ouro no final do arco-íris".

Da esquerda para a direita: Bernardo Correia (Google), Hugo Figueiredo (RTP), Luís Cunha Velho (Media Capital) e Francisco Pedro Balsemão (Impresa).Hugo Amaral/ECO

Responsáveis da Impresa, Media Capital e RTP defenderam esta quarta-feira que as grandes plataformas digitais, como o Google e o Facebook, devem remunerar os grupos de media pelos seus conteúdos. Em resposta, o líder da Google em Portugal considerou que os apelos destes grupos assentam em “vários mitos”.

Meses depois de as duas grandes tecnológicas norte-americanas terem cedido e firmado acordos de partilha de receitas com grupos de media na Austrália e em vários países da Europa, o tema foi central no painel “Estado da Nação dos Media”, um dos momentos altos do congresso anual da Associação Portuguesa para o Desenvolvimento das Comunicações (APDC).

Questionado acerca do tópico, Francisco Pedro Balsemão, presidente executivo da Impresa, que controla a televisão SIC e o jornal Expresso, começou por admitir que “o papel desempenhado pelas redes sociais e grandes agregadores” é “muito importante”. Mas ressalvou que o modelo de negócio da comunicação social tem sido “destruído” face à ameaça dos dois “players dominantes”. “O que é um modelo de negócio possível deixa de o ser quando há esta hegemonia”, apontou.

O líder da Impresa acusou ainda as plataformas como o Google de serem “árbitros” de um mercado em que também são “jogadores”, tendo, por isso, um “duplo papel”. “Por um lado, são árbitros. Por outro, estão a concorrer com as plataformas de media. Têm um incentivo para desenvolver algoritmos para se favorecerem a si mesmos”, criticou.

Francisco Pedro Balsemão destacou ainda que, no primeiro trimestre, a Google “teve um crescimento de 36%” face ao mesmo trimestre de 2020 e que “todos os GAFA” (acrónimo para Google, Amazon, Facebook e Apple) “subiram muitíssimo por mérito próprio, mas também à custa de nós”, afirmou, referindo-se aos grupos de media e criadores de conteúdo.

“Para nós, media privados, claro que queremos que aconteça [a partilha de receitas]. Que um valor seja atribuído aos nossos conteúdos. Um valor justo, digno, pago pelas grandes plataformas”, rematou.

Também Luís Cunha Velho, administrador da Media Capital — grupo que controla a TVI, a rádio Comercial e a produtora Plural –, concordou com a premissa de que Google e Facebook devem pagar à comunicação social pela utilização que fazem dos seus conteúdos: “Os conteúdos cada vez mais vão ser o foco principal, custam dinheiro e precisam de ser pagos.” Por isso, destacou que é necessário “encontrar modelos que trabalhem de certa maneira os algoritmos no sentido de não desviar os conteúdos em que nós gastamos dinheiro para outro tipo de sites e devices que fogem ao nosso controlo.”

Assumindo existir uma “preocupação” no sentido de “uma remuneração justa”, Luís Cunha Velho assegurou que a Media Capital não é “contra” as grandes plataformas. Mas apelou a que seja atribuído “real valor” ao conteúdo dos media. O gestor afirmou ainda esperar que, “mais tarde”, os media venham “a ser remunerados em relação a isso”.

Do lado do serviço público, Hugo Figueiredo, administrador da RTP, indicou que este é um “tema mundial” e defendeu que o “jornalismo é um dos principais garantes da democracia”. Por isso, negociar com as plataformas acordos que prevejam pagamentos pelos conteúdos dos media “são medidas importantes para a RTP”.

“Todas as medidas que contribuam para que a qualidade do jornalismo são sempre bem-vindas. Não interessa a ninguém que os operadores do setor dos media sejam obrigados a cortar custos repetidamente, o que depois, claramente, tem uma influência enorme na qualidade dos conteúdos e, por via indireta, que a democracia venha a sofrer porque não tem informação de qualidade”, destacou.

“Existe alguma obrigatoriedade de estar no Google? Não existe”

Em contrapartida, a Google, representada no painel pelo diretor-geral em Portugal, Bernardo Correia, não concorda que tenha de pagar aos media pelos seus conteúdos. E tentou quebrar o que disse serem “vários mitos” em que assentam os apelos dos media.

Começando pela “ideia de que o Google rouba conteúdos ou está a fazer dinheiro com conteúdos” alheios, o responsável assegurou que “não rouba conteúdos a ninguém”. “O Google cria links e canaliza tráfego”, gerando oito biliões de cliques por mês para sites de notícias. “As pessoas não leem notícias no nosso site”, retorquiu.

De seguida, o gestor afirmou: “Existe alguma obrigatoriedade de estar no Google? Não existe. Qualquer publisher pode sair. Basta pôr no site uma coisinha muito simples chamada ‘no follow’, que nós lemos”, argumentou.

Bernardo Correia, diretor-geral da Google Portugal, considerou que os apelos dos grupos de media assentam em “vários mitos”.Hugo Amaral/ECO

Bernardo Correia disse ainda que os oito biliões de cliques “têm valor económico” para os grupos de media e que é por isso que lhes “interessa lá estar”. “Não usamos conteúdo. Pomos links e fazemo-lo em massa. O valor desse tráfego é enorme para os media”, defendeu.

O responsável continuou, assegurando que a empresa não gera receitas com publicidade com conteúdos noticiosos e que apenas o promove porque “é relevante para o utilizador”. “O Google News não tem anúncios”, explicou, indicando que a empresa faz negócio com outro tipo de pesquisas, como quando um utilizador procura por um produto no Google, como uma televisão.

“Não existe aquele pote de ouro no final do arco-íris que muitas vezes a indústria [dos media] acha que existe”, garantiu.

Mais à frente no painel, e num piscar de olho aos gestores da Impresa, Media Capital e RTP, Bernardo Correia disse que não são os grandes grupos de media que estão em dificuldades: “É o jornalismo local que está ameaçado”, contrapôs. Por isso, prometeu que vai “passar muito tempo” nos próximos meses a “suportar jornalismo local e independente”.

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