PSD quer “corrigir erro” que privou a Península de Setúbal de fundos europeus
Revisão das NUTS pode ser feita até fevereiro, confirmou o INE. Municípios do Norte da Área Metropolitana de Lisboa também querem uma NUTS III para garantir acesso a mais fundos europeus.
Corrigir um erro. É desta forma que o PSD justifica o pedido para debater com urgência, esta terça-feira, a necessidade de classificar a Península de Setúbal de forma diferente para que possa ter acesso a mais fundos europeus. Os social-democratas consideram que o pedido “vai muito a tempo”. E Setúbal não está sozinho nesta guerra.
Em causa está a necessidade de classificar a Península de Setúbal como uma NUTS III (Nomenclatura de Unidade Territorial) para que haja informação estatística sobre a mesma, mas, acima de tudo, para poder ter acesso a mais fundos europeus. “Queremos uma reconsideração das NUTS II e III para que a Península de Setúbal, que está agora subsumida à zona de Lisboa, ganhe autonomia e tenha acesso a fundos europeus com percentagens mais elevadas”, avançou ao ECO Adão Silva, para explicar a razão pela qual convocaram o debate de urgência. “A percentagem de apoios que os empresários podem esperar agora na região é de 40%, no máximo, e nos concelhos vizinhos vai até 70%. Faz toda a diferença na captação de investimento”, acrescenta.
A Associação da Indústria da Península de Setúbal (AISET) e a Associação de Municípios da Região de Setúbal (AMRS) defendem que, “nos dois últimos quadros comunitários de apoio, a limitação de apoios decorrente da inserção na Área Metropolitana de Lisboa sem acautelar as assimetrias intrarregionais e entre regiões do país, levou à perda de oportunidades e de competitividade da Península de Setúbal”. De acordo com os cálculos feitos pela AISET, a região de Setúbal perde cerca de dois mil milhões de euros de fundos comunitários por cada quadro financeiro plurianual devido a esta situação.
Uma situação que resulta da revisão do mapa territorial, em 2013, pelo ministro Miguel Relvas, que ditou a integração da Península de Setúbal nas NUTS II e III da Área Metropolitana de Lisboa. “As consequências estão agora à vista e estão erradas”, reconheceu Adão Silva. “A correção desse erro é um imperativo porque está a prejudicar as gentes de Setúbal e a retirar competitividade à região”, acrescentou.
Para já, o que os agentes no terreno pretendem é “dar o primeiro passo”, ou seja, “constituir a NUTS III”, isto “fará com que a Península de Setúbal passe a ter dados, eliminando o apagão estatístico do ponto de vista socioeconómico em que a Península está, porque os dados estão diluídos na área metropolitana de Lisboa”, disse ao ECO, Nuno Carvalho, cabeça de lista do PSD por Setúbal. “Após esse passo, a equação de uma NUTS II é algo que acreditamos que tem de acontecer com toda a naturalidade”, acrescenta.
A discussão não é nova e sempre que um elemento do Executivo, com responsabilidade na área dos fundos comunitários, vai ao Parlamento é questionado sobre este tema, sobretudo pelo Partido Comunista. Do lado do Governo as respostas apontam sempre para que mudar a classificação destas unidades administrativas, que correspondem a entidades intermunicipais, não vai ter qualquer resultado prático em termos de fundos.
O secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, há duas semanas, reiterou que a criação de uma NUTS III não influenciará o acesso a fundos comunitários pela Península de Setúbal se esta permanecer integrada na Área Metropolitana de Lisboa. “Para além de termos uma NUT III era [preciso] termos essa NUT III numa outra NUT II. Ou seja, não na NUT II Área Metropolitana de Lisboa, mas numa outra a seguir. E a que está a seguir é o Alentejo. Aí é que poderíamos ter apoios diferentes. E, por isso, é bom que se ponha a discussão nestes termos”, salientou Carlos Miguel, no Parlamento.
“Ir para o Alentejo ou ficar na Área Metropolitana de Lisboa, com uma reconfiguração da mesma a outros níveis, desde que se mantenha coesa, não tem problema”, garante Nuno Carvalho. Mas “o principal pressuposto é conseguir uma melhoria de acesso aos fundos com a Península de Setúbal na AML”, acrescenta.
Para já o problema tem sido resolvido com uma majoração especial para as regiões dentro da AML que têm um PIB per capita mais baixo. Mas esta é uma solução “conjuntural” e o que os autarcas destes nove municípios — Almada, Alcochete, Barreiro, Palmela, Moita, Montijo, Seixal, Sesimbra e Setúbal — pretendem é que o Governo tenha dados estatísticos para decidir e que potencie “os mecanismos de apoios ao investimento público e privado para a AML para que chegue a quem mais precisa e onde o PIB per capita é mais baixo”, sublinhou Nuno Carvalho. A solução “estrutural” passa pela revisão das NUTS.
Para o PSD é possível permanecer na AML e criar uma nova NUTS II porque “o Governo ainda não indicou onde existe um impedimento legal a nível europeu de existir uma área metropolitana com mais de uma NUTS II”. “O que existe é uma lei nacional que pode perfeitamente ser alterada no sentido de harmonizar esta questão e eliminar esta injustiça”, frisa o cabeça de lista do PSD por Setúbal.
Municípios do Norte da AML também querem uma NUTS III
Mas a Península de Setúbal não está só. “Noutros concelhos a norte de Lisboa também existem disparidades iguais em termos de PIB per capita, nomeadamente face a Lisboa e a Cascais que têm os valores mais elevados”, sublinhou Nuno Carvalho.
Em causa estão os concelhos de Mafra, Sintra, Loures, Odivelas, Vila Franca de Xira e Amadora com mais de um milhão de habitantes, mas que têm um PIB capita idêntico ao das regiões de convergência. Na passada quinta-feira, na reunião do concelho metropolitano, os concelhos da AML norte decidiram juntar-se à reivindicação dos colegas a sul para reivindicar a constituição de uma NUTS 3, contou ao ECO, Hélder Sousa Pinto, vereador do PSD da Câmara de Mafra. O responsável frisou o facto de o PIB per capita ser mais próximo dos municípios com os quais confina: Torres Vedras, Sobral de Monte Agraço e Arruda dos Vinhos, que já pertencem à CIM Oeste.
Hélder Sousa Pinto sabe que a constituição da NUTS III é apenas “um meio passo” para melhorar o acesso aos fundos europeus, mas para já vão lutar para que o “Governo olhe” para eles “com critérios de igualdade com o todo nacional e com os vizinhos que na margem sul e norte têm iguais taxas de comparticipação. O responsável admite que não querem “pressionar politicamente e ostensivamente o Governo”, mas antes “sensibilizá-lo para o facto de a AML não ser uniforme e coesa, mas assimétrica”. E o objetivo não é sair da AML, garante.
Revisão das NUTS pode ser feita até fevereiro
“Temos condições para conseguir quer a NUT III, quer equacionar a NUT II, porque o prazo é até fevereiro de 2022, garantiu ao ECO, o cabeça de lista do PSD por Setúbal. “Estamos perfeitamente a tempo”, diz Nuno Carvalho.
O INE confirma esta interpretação. “A revisão regular das NUTS ocorre com uma periodicidade não inferior a três anos e a prática mais recente tem sido de três em três anos. É neste contexto, que a formalização das propostas pelos Estados membros para a alteração aos Anexos do Regulamento das NUTS deverá ser efetuada junto da Comissão Europeia pela Representação Permanente em fevereiro 2022”, explicou ao ECO fonte oficial do INE. “Caso se verifiquem alterações, os dados correspondentes às novas geografias terão de começar a ser transmitidos pelo INE ao Eurostat a partir de 2024”, precisou a mesma fonte.
Em janeiro, a ministra da Coesão disse que “o processo regular de revisão regular das NUTS, em concertação entre o Eurostat e os Estados-membros, é feito com uma frequência não inferior a três anos. A próxima revisão regular está prevista para agosto deste ano, o que significa que deverá terminar em 2027”, disse Ana Abrunhosa numa audição no Parlamento esta quarta-feira. Ou seja, concluiu a ministra, “qualquer alteração a ser feita às NUT não seria feita em tempo útil para aplicar ao Portugal 2030”.
O PSD está expectante para perceber qual o grau de abertura do Executivo para acolher estas mudanças, mas vê como um sinal positivo o facto de ser a própria ministra da Coesão que estará presente no debate desta terça-feira. “Temos de elogiar a disponibilidade da senhora ministra”, frisou Adão Silva.
O ECO questionou o gabinete da ministra Ana Abrunhosa, mas a responsável não quis avançar nada antes do debate. Em novembro, numa audição no âmbito da apreciação, na especialidade, da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2021, a ministra disse que “é urgente” que os nove concelhos da Península de Setúbal se constituam como NUT III para poderem construir Investimentos Territoriais Integrados (ITI), ainda que possam “ficar na AML”, disse Ana Abrunhosa.
Adão Silva deu o exemplo da Bélgica, um país territorialmente mais pequeno do que Portugal, mas que tem mais NUTS II e III, para justificar que este tipo de divisão administrativa não tem de significar uma fragmentação territorial. “Talvez estejamos num momento em que vale a pena fragmentar para potenciar, para fazer justiça, par dar coesão”, admitiu, alertando, contudo que esta é uma posição pessoal. “Trás-os-Montes também está na mesma região em que está toda a região norte, talvez valesse a pena repensar isto”, diz. “Mas é preciso ter cuidado porque a excessiva fragmentação gera deslaçamento”, alerta.
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