Transparência nos benefícios fiscais?

É com base na transparência que os comportamentos são corretamente adotados e o regime plenamente aproveitado.

Fala-se muito no princípio da transparência como norteador do sistema fiscal e de toda a estrutura de estabilidade do mesmo, como garante da gestão das legítimas expectativas dos contribuintes e administrados. É com base na transparência que os comportamentos são corretamente adotados e o regime plenamente aproveitado.

Mesmo considerando que os tempos pandémicos são avassaladores em termos de decisões políticas, entendemos ser de assinalar dois exemplos no campo dos benefícios fiscais, em que a transparência tarda em ser cumprida – e por razões muito diversas.

O primeiro tem a ver com o Programa Regressar – aprovado para vigorar para regressos de emigrantes entre 2019 e 2020, foi publicitado pelo Conselho de Ministros (RCM n.º 124/2020, de 31 de dezembro) o prolongamento até ao final de 2023, incluindo o reforço dos instrumentos de política pública nele integrados – como incentivos financeiros e reduções fiscais de 50% no IRS. No seu preâmbulo da referida RCM, menciona-se até que “o Programa Regressar teve interesse e procura significativos, inclusivamente no contexto atual de crise pandémica e de acentuada incerteza económica (…)”. do mesmo na fase de retoma e recuperação da economia e do emprego em Portugal e, ainda, a prorrogação até 2023 do benefício fiscal associado. Tudo até aqui são boas notícias – mas até hoje, quase seis meses volvidos, não há qualquer iniciativa aprovada que contemple a prorrogação dos referidos benefícios fiscais em sede de IRS, da competência da Assembleia da República. E isso provoca incerteza nos operadores, neste caso emigrantes, estão a contar com este anúncio de redução para poder reorganizar sua vida.

O segundo exemplo tem a ver com a recente alteração ao Estatuto dos Benefícios Fiscais, empreendida pela Lei n.º 21/2021, de 20 de abril, em que se prorrogam uma série de benefícios fiscais que originariamente estariam sujeitos a uma cláusula de caducidade de 5 anos desde 2008 – entre eles incluem-se, entre outros os benefícios fiscais à propriedade intelectual e o regime dos fundos de investimento. Como é de ver, esta cláusula foi sendo prorrogada ao longo do tempo para uma série de benefícios que foram permanecendo no nosso ordenamento, sem que houvesse perspetiva de revogação, nem sedimentação no ordenamento. Ora, mesmo que possamos pensar que a prorrogação é uma benesse para o contribuinte, isso é meramente falacioso – o contribuinte quer ter a certeza de vigência do ordenamento e não ficar dependente do beneplácito legislativo periódico de benefícios que, como o nome indica, são excecionais e temporários. Neste campo devia ser tomada uma medida de força no sentido de reformar a estrutura dos benefícios fiscais dominado pela transparência e certeza consequente.

Visto tudo, a prática reiterada torna estes casos cada vez menos isolados no campo da transparência (ou falta dela). Veja-se, aliás, que governo anunciou que irá aprovar em breve um regime excecional de execução orçamental para simplificação de procedimentos dos projetos aprovados no Plano de recuperação e Resiliência – faz todo o sentido que assim seja, mas fica uma grande questão por responder: havendo uma imposição legal a cumprir neste campo, porque razão não temos Decreto-Lei de Execução Orçamental desde a entrada em vigor do Orçamento para 2020? A mesma incerteza aplica-se ao orçamento de 2021. Será um novo paradigma de transparência?

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