Será a bazuca suficiente?
Urge a criação de medidas que permitam acomodar os interesses específicos de cada empresa e seus credores. Desde logo, desconhece-se as condições previstas para a transição no período pós-moratórias.
A Comissão Europeia acaba de desembolsar 2,2 mil milhões de euros a Portugal referente ao pré-financiamento de 13% do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). Este representa o primeiro passo da execução do PRR, e o primeiro plano NextGenerationEU aprovado pela UE vocacionado para o Pacto Ecológico Europeu e digitalização da economia. Mas será suficiente abrir a torneira? Será quem vem a tempo?
O verdadeiro problema da nossa economia não é novo, nem fruto da pandemia. A pandemia não ajudou, de todo, mas o lastro vem de trás. Basta olhar para os indicadores de risco publicados pelo Banco de Portugal, com referência a 2019, relativo às micro e pequenas e médias empresas, para concluir isso mesmo.
Com efeito, antes da pandemia, 25% micro e PME’s apresentava capitais próprios negativos e 37% resultados líquidos negativos. No sector do alojamento e da restauração (dos mais afectados pela pandemia), esses indicadores ascendiam, respectivamente, a 40% e 45%. Por seu turno, na indústria do vestuário, a 28% e 40%. O têxtil tem sido, de resto, bastante falado nos últimos dias, não apenas a respeito das duras palavras do Ministro da Economia a respeito da Dielmar, mas, sobretudo, por se tratar de um sector com mais de 6000 empresas, com um peso anual nas exportações superior a 5 mil milhões, e cujos empresários se endividaram (ainda mais) em 2020.
Vale isto por dizer que limitar os apoios do PRR apenas a empresas que eram “saudáveis” antes da pandemia, representará sacrificar talvez 40% ou 50% do nosso tecido empresarial.
O problema de fundo não se resolve com empréstimos do Estado. É necessário assegurar que os apoios sejam bem canalizados para empresas viáveis. O Banco de Fomento ou o Turismo de Portugal têm, também aqui, um papel decisivo na seleção das empresas cujos problemas sejam meramente financeiros.
Mas não podemos ficar por aqui. Urge a criação de medidas que permitam acomodar os interesses específicos de cada empresa e seus credores. Desde logo, desconhece-se as condições previstas para a transição no período pós-moratórias legais – o que, na falta de iniciativa governamental, dependerá da negociação individual entre empresas e Bancos, com todas as dificuldades que se antecipam.
Também muito há a fazer para tornar mais eficazes os instrumentos legais de reestruturação, que, presentemente, estão reconhecidamente desajustados. Por exemplo, deverá ser repensado o acesso ao PER, nos moldes que existiam até 2017 (e que não limitava o seu acesso à adesão de um credor(es) titular(es) de, pelo menos, de 10% de créditos não subordinados), e cuja intenção legislativa, ao tempo, tem de ser reajustada à realidade empresarial nacional. Deverá também ser alargado o poder de supervisão dos Administradores Judiciais ou, mesmo, limitada a responsabilidade tributária dos novos corpos sociais de empresas revitalizadas perante dívidas constituídas no período anterior.
E porque não retomar, de forma séria, a transposição da directiva de reestruturação preventiva da UE (Directiva n.º 2019/1023), que definiu os regimes de reestruturação preventiva, perdão de dívidas de empresas e de empresários e inibições? Recorde-se que, até ao momento, o Governo apenas criou o PEVE, em condições até mais restritivas do que as previstas na Directiva. A transposição dos referidos mecanismos de alerta precoce permitiriam aumentar a eficiência dos processos relativos à reestruturação e detetar as circunstâncias suscetíveis de originar uma probabilidade de insolvência e avisar os devedores da necessidade de agir sem demora, potenciando, com isso, a sua maior viabilidade.
Há, pois, ainda muito por fazer.
Nota: O autor escreve ao abrigo do antigo acordo ortográfico.
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