Carlos Alexandre recusa levantamento do arresto de bens de Salgado

Juiz usa os argumentos "da bem elaborada promoção das medidas de coação por parte do Ministério Público, com a qual se concorda e que aqui se acolhe na íntegra". Recusa fundamentada em quatro linhas.

O juiz de instrução criminal Carlos Alexandre recusou o pedido de Ricardo Salgado de levantamento do arresto dos seus bens móveis, pensão e contas bancárias, no âmbito do processo do Universo Espírito Santos e do Monte Branco.

Em Junho, a defesa de Ricardo Salgado requereu ao juiz o levantamento do arresto dos bens do ex-banqueiro às cauções que prestou para restituir os 10,7 milhões de euros à massa falida do GES, segundo dizia a contestação da defesa do ex-banqueiro.

Nos termos e com os fundamentos constantes da bem elaborada promoção das medidas de coação por parte do Ministério Público, com a qual se concorda e que aqui se acolhe na íntegra, indefiro o pedido de Ricardo Salgado”. Foi assim, em quatro linhas, que o magistrado do Ticão justificou essa recusa, no despacho a que o ECO/Advocatus teve acesso, com cerca de 15 páginas. Ou seja: pegando na promoção de medidas de coação do Ministério Público (MP), sem apresentar qualquer argumento novo para a decisão. Fundamentos como o perigo de fuga ou de perturbação do inquérito, fase processual em que o processo já nem se encontra.

Segundo o MP, aceitar este levantamento do arresto “revelaria uma total desconsideração pelas vítimas de crime, no que poderia ser visto como a salvaguarda do exercício abusivo dos interesses da defesa noutros processos que não este”, o que levou a Carlos Alexandre a assinar por baixo. Mais ainda pelo facto do arresto preventivo, “que incidiu sobre bens da titularidade dos arguidos e também de terceiros e sociedades por aqueles dominadas, visou acautelar o risco da perda ou de dissipação patrimonial da vantagem obtida com a prática do crime por parte dos arguidos, e assim garantir o pagamento de eventuais penas pecuniárias e de outros créditos, designadamente de lesados e do Estado”.

A defesa, por seu lado, diz que Ricardo Salgado cumpriu “todos os deveres processuais e no momento presente já não se verifica qualquer receio de fuga: o arguido tem 77 anos de idade, tem múltiplos processos pendentes e de diversa índole, tem-se defendido e participado ativamente em todos eles; reside em Portugal onde tem centrado toda a sua vida, incluindo a familiar”. Assumindo que atualmente “também já não existe qualquer possibilidade de existir perigo de perturbação do inquérito ou do decurso da instrução do processo”.

O arguido “não demonstrou nem demonstra nenhum comportamento suscetível de causar suspeita sequer de destruição, modificação, ocultação ou falsificação de meios de prova. Pelo que é impossível afirmar que se mantêm as exigências cautelares em relação a este perigo do inquérito que já se encontra findo”, escreveu a defesa quando fez o pedido do levantamento do arresto. Concluiu ainda que, perante isto, é patente que, neste momento, “é uma medida manifestamente excessiva. Já não é possível descortinar quais os fins visados com tal medida. De facto o arguido não pretende usar o montante em causa para ‘fins supérfluos’. Pretende utilizá-la para extinguir a responsabilidade criminal”.

Diz o Código Penal que se extingue a responsabilidade criminal, “mediante a concordância do ofendido e do arguido (…) até à publicação da sentença da primeira instância, desde que tenha havido restituição da coisa ou do animal furtados ou ilegitimamente apropriados ou reparação integral dos prejuízos causados”, explica o artigo 206ª do Código Penal. Mas, para isso, seria necessário que o arresto que pende sobre os vários bens e contas bancárias de Salgado fosse levantado.

O antigo presidente do BES está em julgamento por três crimes de abuso de confiança no âmbito da Operação Marquês. E de forma autónoma face aos restantes arguidos, já que Ivo Rosa, na altura da decisão instrutória, anunciou que iria proceder à separação de processos de Salgado, Armando Vara, Carlos Santos Silva, João Perna e José Sócrates, os únicos arguidos que o juiz de instrução pronunciou a 9 de abril. As alegações finais deste julgamento do ex-líder do BES estão marcadas para dia 22 de outubro.

 

E o que é que está efetivamente arrestado?

  • A 24 de Julho de 2014, no processo Monte Branco o Tribunal Central de
    Instrução Criminal obrigou que Salgado pagasse uma medida de caução no valor de 3 milhões, que foi prestada a 5 de Agosto de 2014;
  • A 11 de Dezembro de 2015, no processo-crime BES, pelo mesmo tribunal foi determinado que metade da caução inicialmente prestada no processo Monte Branco (i.e., EUR 1,5 milhões) fosse transferida para o processo-crime BES;
  • Em Junho de 2015, foram arrestados os bens móveis do processo-crime do BES/GES;
  • Em dezembro de 2015, o arguido auferia uma pensão mensal de reforma, no montante total líquido de 15 mil euros. Em janeiro e Fevereiro de 2016, passou a auferir de uma pensão mensal de reforma, no montante total líquido de quase 24 mil euros; No entanto, em outubro de 2017, a reforma e complemento de reforma foram arrestados pelo Ticão, no âmbito do BES passando a auferir uma reforma e um complemento de reforma mensal líquido no total de cerca de 1600 euros, depois (incluindo em 2021), cerca de 1900 euros;
  • As contas bancárias na Suíça, detidas conjuntamente com a sua mulher, foram inicialmente arrestadas pelas autoridades suíças e, posteriormente, também passaram a estar arrestadas pelo Ticão;

E qual o valor do que foi arrestado?

  • O valor arrestado nas contas na Suíça no processo-crime do BES/GES corresponde, pelo menos, a um valor equivalente a 8.540.316,90 euros;
  • A data do arresto da pensão do arguido e o valor líquido arrestado no processo-crime do BES estima-se que o valor arrestado da pensão ascenda já, aproximadamente, a 1.450.944,00 euros;
  • Estes valores perfazem o montante de 9.991.260,90 euros (quase 10 milhões de euros):
    Já o valor dos bens móveis arrestados à conta do processo do BES “supera muitíssimo o montante de EUR 726.350,10″;

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