Humano, sustentável e digital. Eis o “hotel do futuro”
Empresários e outros agentes do setor hoteleiro antecipam que as unidades turísticas vão focar-se na proximidade com os clientes, ser cada vez mais flexíveis e sustentáveis e apostar na digitalização.
A pandemia trocou as voltas a vários setores e o turismo foi um dos mais penalizados. Com a reabertura de rotas aéreas e o levantamento de restrições, o setor hoteleiro volta a ganhar um novo “fôlego”. Mas, afinal, como vão ser os hotéis do futuro? Empresários e representantes do setor antecipam que as unidades hoteleiras vão focar-se na proximidade com os clientes, ser cada vez mais flexíveis e sustentáveis e apostar na digitalização.
Nos últimos meses, a atividade turística em Portugal tem vindo a recuperar do impacto criado pela crise pandémica. Em agosto, o país registou 2,5 milhões de hóspedes e 7,5 milhões de dormidas em território nacional, segundo o último balanço do INE. O “caminho” para se chegar aos níveis pré-pandemia ainda é logo, com a secretária de Estado do Turismo a estimar que só aconteça em 2023. Ainda assim, empresários e representantes da hotelaria estão confiantes na retoma e sinalizam que há “uma revolução em curso”, que a pandemia acelerou.
O “hotel do futuro” vai ter de ser “mais humano, mais sustentável e mais digital”, sintetizou Gonçalo Rebelo de Almeida, administrador Grupo Vila Galé, durante um debate sobre o tema organizado pela DecorHotel, uma iniciativa que aconteceu esta semana na Feira Internacional de Lisboa (FIL).
O empresário olha para esta transformação digital como um meio para “libertar” os trabalhadores dos hotéis de “tarefas e funções que são repetitivas, chatas e burocráticas” para que sedediquem em pleno “a criar relações de proximidade” e “empatia” com os clientes. “E isso não há nenhum smartphone que consiga”, sublinhou.
A sustentabilidade da nossa atividade não depende exclusivamente da decisão da nossa empresa. Depende também da nossa capacidade de influenciar os comportamentos dos consumidores.”
A opinião é partilhada pela arquiteta Sara Afonso, que aponta que os utilizadores dos hotéis querem “sentir-se em casa” e valorizam o “conforto do lar”. Tendo em conta que há uma fatia de turismo sénior, a também fundadora da Something Imaginary defende que devem ser criadas parceiras com centro de saúde próximos.
Tal como Gonçalo Rebelo de Almeida, Sara Afonso considera ainda que os hotéis vão ter de ser “adaptáveis”, de modo a que, caso aconteça outra pandemia, não tenham de fechar portas. Além disso, deve haver uma aposta maior no marketing, já que esta digitalização passa também pelas redes sociais.
Esta flexibilidade dos projetos joga ainda com aquele que vai ser um dos desafios do setor hoteleiro — e não só — no futuro: a sustentabilidade. No grupo Vila Galé, o “horizonte médio” da renovação de um hotel, desde as mudanças mais profundas às menos profundas, “andará entre os 10 e os 12 anos”, explicou o administrador. Pelo que um dos desafios é tentar encontrar “soluções mais neutras que possam durar um bocadinho mais” e mudar mais frequentemente outros aspetos, como os sofás ou as camas.
Neste aspeto, a opinião dos empresários é unânime. A sustentabilidade vai ser uma das grandes apostas do setor nos próximos anos e deve começar logo no projeto, isto é, desde a forma como é projetado, passando pela escolha dos materiais até à iluminação.
“Para se ter uma ideia, mil quilos de cimento são 800 quilos de CO2. Sem árvores, ao fim de 20 anos só resgata 650 quilos de CO2. Portanto, um hotel de 30 quartos vai ter, no mínimo, 200 metros cúbicos de betão… Podemos imaginar as árvores que esse hotel teria de plantar para fazer a compensação”, calculou Miguel Barbas, arquiteto e CEO da Sabrab, reiterando a importância de se pensar nesta questão logo na fase de projeto, por forma a evitar “uma pegada ecológica no dia da abertura”.
Ainda assim, como em todos os negócios que contactam diretamente com o cliente, quem manda é o consumidor. Caberá aos hotéis “influenciar comportamentos dos consumidores”, quer seja na redução de consumo de água, gás, energia ou alimentação. Ainda que possa não ser tarefa fácil. “A forma como a organização vai ter de se adaptar às pessoas — e não as pessoas à organização — vai ser diferente”, refere Cristina Siza Vieira.
Há uma revolução em curso que a pandemia acelerou. (…) Somos uma indústria de serviço e isso significa que o serviço tem que ser mais custoso e valer muito mais. Já não podemos crescer reduzindo custos. Temos que crescer em valor e no preço com que vendemos estes serviços.”
“Há comportamentos que induzimos, há comportamentos que vêm de fora e nos obrigam a alterar a organização, há comportamentos que vão ter de ter reflexos nas convenções coletivas de trabalho e na forma como o trabalho é encarado, nas escolas de hotelaria e turismo e na forma como a profissão é praticada e é ensinada”, sintetizou a presidente da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP).
Cristina Siza Vieira lembrou ainda que a economia portuguesa é fortemente sustentada numa “indústria de serviços” e que, por isso, deve haver uma maior valorização do setor, quer aonível dos salários dos trabalhadores, quer relativamente ao “preço com que vendemos estes serviços”. Apesar da recuperação de dormidas e hóspedes, as receitas do setor do alojamento estão ainda quase 20% abaixo do valor atingido em 2019, segundo o último balanço do INE.
Esta visão é partilhada por Tim Vieira, CEO da Bravegeneration, que sublinhou que está “muito positivo” em relação à retoma do setor, mas alertou que é preciso “melhorar o serviço”. “Gostava de poder pagar melhores salários e pagar menos impostos”, atirou o empresário. Tim Vieira queixou-se ainda da burocracia imposta aos investidores. “Com as dificuldades que estamos a ter, vamos precisar de um Governo muito mais ágil, vamos precisar de muito menos burocracia”, concluiu.
No plano do investimento, a arquiteta Sara Afonso realça ainda que o modelo de negócio do setor hoteleiro está a “inovar”, dado que começam a existir cada vez mais negócios em copropriedade. “O risco deixou de ser só do hoteleiro. Temos modelos de negócio, hoje em dia, que são de risco partilhado. E isso é uma inovação do negócio”, completou a fundadora da Something Imaginary.
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