Efacec: “A banca é uma limitação ao crescimento das empresas”

O propósito de Ângelo Ramalho é cumprir o plano estratégico da Efacec. Sobre a acionista de referência, Isabel dos Santos não faz comentários, mas adianta que "não nos tem faltado nada".

Ângelo Ramalho é o presidente executivo da Efacec desde novembro de 2015 — o presidente do conselho de administração é Mário Leite Silva –, altura em que a Winterfell, empresa controlada por Isabel dos Santos, adquiriu 66% do capital da portuguesa. O gestor afirma que o seu propósito é cumprir o plano estratégico da empresa. Até porque, acrescenta Ângelo Ramalho, “não nos tem faltado absolutamente nada para conseguirmos fazer da Efacec uma referência nacional que é e uma referência internacional cada vez mais forte“. Afirma que a banca nunca esteve bem, mas considera que tem vindo a piorar. E que esse é um fator que limita “o crescimento das empresas em Portugal”.

A Efacec é uma empresa com forte vocação exportadora. Nesse aspeto, está preocupado com o efeito Trump e com o Brexit?

A pergunta é pertinente mas a diversidade de mercados a que estamos expostos tem os seus riscos mas também tem os seus benefícios. Não temos um mercado que, apenas por si, tenha um significativo efeito na empresa.

Mas um conjunto de factos perniciosos eventualmente…

Certamente que sim, mas a um conjunto de alterações teremos de responder com um conjunto de alternativas que nos permitam mitigar esses riscos. E se os conseguirmos antecipar, tanto melhor. A nossa convicção é que hoje temos os dados e a capacidade para mitigar riscos dessa natureza. Mas, apesar de tudo, os Estados Unidos e o Reino Unido continuam a ser mercados importantes para a Efacec. E ambos são mercados sofisticados onde pensamos continuar a estar de forma cada vez mais envolvida atendendo, claro, às circunstâncias. Vamos ver o que acontece com o Brexit e vamos ver o que nos reserva o futuro relativamente aos Estados Unidos. Mas não posso deixar de encarar o futuro de forma positiva, obviamente com os pés bem assentes.

Está muito otimista?

Otimista não, positivo. Não se consegue catalisar uma equipa se não tivermos uma abordagem positiva à realidade, por mais difícil que ela seja. Temos de ter uma abordagem positiva e é isso que pretendo na Efacec.

O que é que os acionistas da Efacec lhe pediram?

Cumprir com o plano estratégico. Os acionistas da Efacec estiveram fortemente envolvidos no desenho do plano estratégico, foram eles que o aprovaram. Portanto, o meu propósito e o da equipa por mim liderada, não pode ser outro que não seja o de cumprir com o plano estratégico.

O que é importante é sabermos que os nossos acionistas não nos faltarão com nada para que atinjamos os objetivos que nos propusemos atingir. E é isto que eu gostava que ficasse bem referenciado.

Ângelo Ramalho

Presidente da Efacec

Como é trabalhar com Isabel dos Santos?

Trabalho na Efacec e os meus acionistas nomearam-me para trabalhar na Efacec. Por isso, o meu foco é a Efacec. Não faço comentário, em particular, sobre nenhum dos meus acionistas. Seria uma indiscrição da minha parte fazê-lo. O que é importante no fim do dia é entregarmos resultados, sabermos que os nossos acionistas não nos faltarão com nada para que atinjamos os objetivos que nos propusemos atingir e é isto que eu gostava que ficasse bem referenciado. E, durante este ano e meio, não nos têm faltado absolutamente nada para conseguirmos alcançar os objetivos a que nos propusemos. E que façamos da Efacec, mais do que uma referencia nacional que é, uma empresa portuguesa fortemente exportadora, e uma referência internacional cada vez mais forte. É esse o nosso propósito maior.

A Efacec tem sede em Portugal e o mercado português vale 20% nas contas da empresa. Como é que olha para a conjuntura nacional?

Gostamos muito de Portugal, é aqui a nossa base, aqui desenvolvemos as nossas tecnologias, temos os nossos clientes de referência. Mas depois a realidade é a que é. É verdade que queremos condições de contexto que nos permitam operar neste país numa base tão competitiva quanto possível. E gostaríamos que Portugal cuidasse melhor e reforçasse este perfil de plataforma exportadora, seja para empresas portuguesas como para empresas internacionais que se queiram aqui instalar e a partir daqui exportarem os seus produtos. Os sinais mais recentes que temos tido — e separaremos a retórica daquilo que é a realidade — não vão tanto nesse sentido quanto gostaríamos. Mas, dito isto, não gostaria de me alongar muito mais.

Como é que viu a questão do aumento do salário mínimo? A Efacec paga salário mínimo a alguém?

A Efacec paga acima do salário mínimo. O salário mínimo é sempre uma referência, um indexante. E temos muitos receios quando se mexe nesse indexante de forma distorcida relativamente àquilo que é a realidade do país, nomeadamente à sua capacidade de gerar riqueza e de criar crescimento económico. Temos sempre muitos receios, mas o salário mínimo não tem a ver connosco.

O salário mínimo é sempre uma referência, um indexante. E temos muitos receios quando se mexe nesse indexante de forma distorcida relativamente aquilo que é a realidade do país, nomeadamente à sua capacidade de gerar riqueza e de criar crescimento económico.

Ângelo Ramalho

Presidente da Efacec

Preocupa-vos as perturbações que existem no sistema financeiro nacional?

Não seria correto da minha parte se lhe dissesse que não me preocupa: a banca é um dos ‘calcanhares de Aquiles’ da economia portuguesa e para o qual se antevê um caminho comprido no sentido de termos em Portugal ou, a partir de Portugal, um sistema bancário bem estruturado e credível aos olhos dos múltiplos stakeholders. Entenda-se que estes múltiplos stakeholders é a visão de fora. Quanto à visão de dentro… nós toldamos tempo de mais com a visão de dentro: preocupemo-nos verdadeiramente com a visão de fora e façamos políticas, nomeadamente ao nível dos decisores governamentais, que sejam adequadamente percecionadas de fora do país. De facto, é uma limitação ao crescimento das empresas portuguesas e, em particular, das empresas exportadoras, a condição em que o sistema bancário português hoje se encontra em Portugal.

Mas a Efacec já sentiu na pele…

Não ia entrar em pormenores mas certamente que não estamos afetados. Caso contrário, não teríamos crescimento ou não poderia anunciar uma vontade grande de crescer como acabei de fazer. Mas, que isso é uma preocupação permanente é incontornável.

A banca está pior ou melhor do que há um ano?

Nós nunca estivemos bem e, esse, é muitas vezes o erro coletivo. Achamos que, um dia, a banca nacional esteve bem mas nunca estivemos bem, estamos é um bocadinho pior. Mas como sou positivo e acredito na vontade dos portugueses e, em particular, dos líderes políticos, acredito que, a prazo, os constrangimentos vão sendo resolvidos. Mas é um processo.

Claro que o resto da Europa também tem perturbações no setor bancário mas, como costuma dizer-se, ‘com o mal dos outros vivo eu bem’. Portugal tem de ter especial atenção — sobretudo porque estamos envolvidos num contexto difícil –, às nossas fragilidades. E Portugal não tem condições enquanto país para resistir durante muito tempo a contextos envolventes que sejam difíceis. Portanto, tratemos de fazer em casa o que é importante que se faça em casa. Se o fizermos, seremos mais capazes de nos gerirmos na adversidade. Se não o fizermos, a adversidade afeta-nos de forma incontornável.

O ano de 2016 foi o seu primeiro ano completo à frente da Efacec, como é que correu?

Correu bem, foi o primeiro passo no caminho certo, um caminho comprido, mas que vamos tentar fazer tão rápido quanto possível e há um primeiro passo de resultados positivos com crescimentos a dois dígitos na maior parte das rubricas do orçamento.

Quando diz resultados positivos, quer dizer que a Efacec voltou aos lucros?

Sim, a Efacec voltou aos lucros, mas ainda não temos ainda as contas aprovadas em assembleia geral, o que só acontece em abril, por isso não posso dar mais detalhes sobre os números. A Efacec fechou 2015 com prejuízos de 20 milhões de euros, e em 2016 posso dizer que voltamos a ter lucros.

E o volume de negócios é de que ordem?

O volume de negócios atingiu os 440 milhões de euros, tinha sido de 416 milhões de euros. Estes números estão em linha com as nossas expectativas.

Como é que se dá esta passagem de 20 milhões de euros de prejuízos para lucros?

Trabalhando… É público que a nova gestão empreendeu um novo processo de reflexão estratégica que envolveu toda a empresa, definimos os objetivos onde queremos chegar e estamos a fazer o caminho que nos leve até lá. É um trabalho exigente e que exige o envolvimento de todos. O ano de 2016 foi difícil, trabalhoso, mas com a equipa alinhada, os resultados vão surgindo naturalmente. Este é apenas o primeiro passo de um caminho comprido que a Efacec tem de fazer e, vai fazê-lo de forma tão rápida quanto possível, sempre de forma sustentada, e envolvendo, tanto quanto o saibamos fazer, toda a equipa focada nestes objetivos.

O ano de 2016, foi um ano difícil, trabalhoso, mas com a equipa alinhada, os resultados vão surgindo naturalmente. Este é apenas o primeiro passo de um caminho comprido que a Efacec tem que fazer e, vai fazê-lo de forma tão rápida quanto possível

Ângelo Ramalho

Presidente da Efacec

Esse crescimento é feito graças ao mercado externo?

O crescimento é feito à custa do mercado externo, o mercado português tem as limitações que são conhecidas, a Efacec é uma empresa portuguesa fortemente exportadora. Os mercados externos valem neste momento 80% nas contas da companhia.

A Europa continua a ser o principal mercado?

A Efacec tem os seus mercados bastante dispersos, mas a Europa continua a ser o principal mercado. Continuamos a ser uma empresa muito dirigida ao mercado europeu que é um mercado mais sofisticado, sem esquecer que somos uma empresa de tecnologia e infraestruturas pelo que estamos muito orientados para os mercados onde as infraestruturas são mais necessárias que são claramente os países emergentes, quer em África, quer no Médio Oriente, quer na América Latina, mas também na América do Norte, não pelas infraestruturas novas que são necessárias mas pela renovação de infraestruturas que sempre acontece. Quando falo na América do Norte falo dos Estados Unidos, a nossa presença no México é muito casual.

O vosso crescimento passa por consolidar esses mercados ou por entrar em novos mercados?

Deixe-me dizer que a Efacec tem referências em mais de 90 países e uma presença regular em mais de 60, portanto falar em novos mercados não faz muito sentido, o que faz sentido é perceber como é que em cada mercado em que estamos reforçamos a nossa presença e qual o momento adequado para o fazermos. Este é o exercício diário da nossa empresa enquanto organização que desenvolve produtos e soluções ajustados à realidade do mercado. Como os nossos projetos de infraestruturas são sempre projetos de ciclo longo temos que o fazer com a maior antecipação possível para ajustarmos os meios que são necessários para darmos no momento certo uma resposta eficiente.

O processo de restruturação da Efacec está concluído?

O processo de restruturação aconteceu antes da entrada deste novo acionista, são processos de transformação e de ajustamento permanente às necessidades da envolvente, e a envolvente em primeiro lugar são os nossos clientes. Há momentos com mais intensidade, mas o processo é contínuo, não há propriamente um processo em que hoje se restrutura e amanhã não se passa nada, à espera da restruturação seguinte. Não é isso que pretendemos o que pretende é um processo de renovação e alinhamento constantes às necessidades do mercado.

Mas em termos de número de colaboradores…

Nem nessa matéria podemos falar de um processo fechado porque todos os dias entra gente e sai gente. Hoje somos cerca de 2400 pessoas e é um processo de renovação constante por necessidade de acrescentarmos e renovarmos novas competências quer ao nível da área de produção quer ao nível de áreas de desenvolvimento de produto ou de desenvolvimento de soluções. Sempre a renovar.

A Efacec sofreu um processo de emagrecimento, tendo-se desfeito de áreas consideradas não 'core'...

Um processo de emagrecimento que ficou no processo de restruturação e passou por um redefinir daquilo que é o seu ‘core’ e, que de alguma forma sempre foi o seu ‘core’. Todas as áreas consideradas não ‘core’ ficaram de fora. Hoje a Efacec está concentrada em duas grandes áreas: produtos e sistemas. Nas áreas de produtos temos transformadores, automação de sistemas de energia e mobilidade elétrica. Na área de sistemas, temos o grande grupo da área da energia, sistemas na área do ambiente, e sistemas na área dos transportes ferroviários.

O que é que pesa mais nas contas da empresa?

Estes dois blocos, a área de produtos e a área de sistemas equivalem-se, mais ou menos 50% cada um.

Já falou no plano estratégico da Efacec que se estende até 2020, quais são os objetivos para esse ano?

A Efacec investe permanentemente em I&D. Somos uma empresa de tecnologia, é a tecnológica portuguesa, todos os produtos que aqui fazemos são tecnologias desenvolvidas dentro da própria empresa e cerca de 3% nosso volume de negócios anual é investimento em I&D. São cerca de dez milhões de euros anuais. Este é o nosso ponto de partida, sem isto este projeto Efacec que vai fazer 70 anos em 2018, não teria sentido. Para além disso, temos sempre investimentos em melhoraria das nossas infraestruturas, nomeadamente as infraestruturas fabris, melhorar os nossos processos produtivos, melhorarmos os nossos equipamentos e é um processo onde vamos reforçar nos anos que aí vêm.

Ainda ao nível de investimento está a reforçar as operações de mobilidade elétrica.

Um dos investimentos que estamos a fazer é reforçar toda a capacidade produtiva da mobilidade elétrica e nesse âmbito vamos investir dois milhões de euros.

Ao nível da faturação, o que tem previsto para 2020?

Os números são sempre importantes, mas é um crescimento sustentável, com as variáveis que conhecemos hoje, consideramos que crescemos de forma sustentável em 2020 para os 700 milhões de euros. Este é um processo como muitos outros em interação permanente, os planos estratégicos são uma referência mas são revistos e adaptados com a frequência que for necessária, este é o quadro que definimos há meio ano a esta parte.

700 milhões é quase duplicar o volume de faturação…

Estes processos são interativos, não é amanhã, para chegarmos lá temos que ser muito incisivos, muito focados, temos que apostar muito dos nossos recursos e das nossas forças para conseguirmos lá chegar, mas é um processo. E se o soubermos entender como um processo e alinhar todos os nossos recursos convergentes com esse objetivo as coisas acontecem. Repito: queremos crescer de forma sustentada se se demonstrar que 700 milhões não são sustentáveis em 2020 teremos a capacidade de corrigir o objetivo certamente. Pode acontecer o contrário, pode acontecer também ultrapassar. Os objetivos são importantes na medida em que incorporem crescimento em valor, se não incrementarem crescimento em valor, o número pelo número não vale nada.

O peso dos mercados externos será para aumentar?

Incontornável. A tendência é para crescer, é incontornável, hoje são 80%, amanhã são mais, e continuaremos a ter mercado português, e o mercado português para nós é absolutamente importante, só que naturalmente não vai crescer muito mais do que aquilo que é hoje e portanto é fácil perceber que este crescimento que anunciei vai resultar de uma menor participação e de uma menor percentagem no mercado português no volume de negócios anual da Efacec. A tendência será progressiva hoje 80%, amanhã 85%, depois 90% o cap será os 100%, mas 100% nunca será porque teremos sempre o mercado nacional.

Atendendo à nova estrutura acionista da Efacec, é de prever que Angola aumente o peso nas contas do grupo?

Angola é um mercado como muitos outros mercados, cada um deles com as suas características próprias, é publico que Angola não está a atravessar um bom momento e portanto neste contexto não será o mercado que outrora se afigurou para muitas empresas portuguesas que aí apostaram. Encararemos sempre o mercado de Angola com o melhor profissionalismo e reconhecendo o potencial que aquele mercado tem, não tenhamos qualquer dúvida a esse propósito. Dito isto atenderemos em cada momento às circunstâncias que tenhamos para atuar, analisaremos de forma competente para verificar da nossa competitividade para podermos nele competir e sermos ganhadores quando for caso disso.

Mas não há nenhum investimento especial?

Não, não lhe quero destacar nenhum investimento especial, como acabei de dizer é uma empresa que está presente em mais de 60 países, não quero fazer destaque a nenhum país em particular porque não é justificado.

A entrada em bolsa é referida no plano estratégico da Efacec?

Uma pergunta curiosa, mas o caminho, como alguém dizia, faz-se caminhando, não é uma questão do presente, a questão do presente é fazer…

Mas o plano estratégico é até 2020…

Claro, mas o nosso objetivo para 2020 é fazer crescer a empresa de forma sustentada e conseguido isto certamente que novos passos se seguirão, quem sabe também esse, mas não me compete a mim nesta altura pronunciar-me sobre isso.

Portanto não está previsto até 2020 entrar em bolsa?

Com os dados que temos hoje, não é esse o propósito.

A Efacec é uma empresa com um balanço sólido e com um nível de dívida excecionalmente baixo.

Ângelo Ramalho

Presidente da Efacec

A Efacec hoje tem o seu perfil financeiro mais adequado à sua realidade?

Hoje a Efacec é uma empresa com um balanço sólido e com um nível de dívida excecionalmente baixo.

Qual é que é a dívida? Em 2015 era de 49 milhões de euros.

Digo antes desta forma, o nosso rácio de dívida liquida sobre EBITDA é inferior a dois. Este valor é que demonstra verdadeiramente o ponto em que estamos hoje. A dívida é um bocadinho menor do que era em 2015, e este rácio mantém-se até um pouco melhor. É este o caminho que queremos seguir e manter, fazer a empresa crescer com níveis de dívida que resultem sempre neste rácio limitado a dois.

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