Semana de 4 dias. “Empresas não podem justificar impedimento pela legislação”

O vice-presidente da CIP defende que a atual legislação não impede as empresas de implementarem uma redução laboral. Coloca antes a questão no problema de produtividade e crescimento do país.

Com o tema da semana de quatro dias de trabalho a merecer um lugar de destaque em vários países, que já fizeram ou estão a meio dos seus projetos-piloto, em Portugal ainda são poucas as empresas que testaram a redução do horário laboral. O tema foi trazido novamente para discussão com o PS a integrá-lo no seu programa eleitoral, mas a Confederação Empresarial de Portugal (CIP) não vê essa mudança acontecer tão facilmente ou, pelo menos, de forma sustentada. E justifica esse impedimento, não devido à atual legislação, mas devido ao contexto português. “O país tem um problema sério de produtividade, um grave problema de crescimento. Se nós queremos ter todos mais riqueza, precisamos de encontrar modelos que aumentem essa capacidade de produzi-la, e não apenas que sirvam como uma dificuldade”, argumenta Armindo Monteiro, vice-presidente da CIP.

“As empresas não podem justificar um impedimento para fazer essa transformação [para a semana de quatro dias] pela legislação. Desde 2009 que o período de trabalho é de 40 horas de trabalho no máximo. Portanto, a legislação estabelece um máximo, não estabelece um mínimo. Querendo fazer uma redução, naturalmente que é possível, sem nenhuma alteração legislativa. A dificuldade hoje em Portugal não é a questão laboral, é outra”, defende Armindo Monteiro, vice-presidente da CIP.

O problema tem, sobretudo, a ver com a produtividade, cenário que considera que não se pode ignorar, defendeu durante o painel “4-Days Normal” do Building the Future, em que participou juntamente com Marta Dias, rewards leader da Mercer, e Mariana Barbosa, head of PR & comms da Coverflex.

“Para que seja uma mudança com sucesso deve ser baseada em realidades muito objetivas que nos permitam ter um cenário onde seja exequível esta operação. Se não for exequível, todos nós vamos perder. O país tem um problema sério de produtividade, um grave problema de crescimento. Se nós queremos ter todos mais riqueza, precisamos de encontrar modelos que aumentem essa capacidade de produzi-la, e não apenas que sirvam como uma dificuldade”, diz.

Hoje não é fácil pura e simplesmente por decreto ou vontade política mudar a realidade das coisas.

Armindo Monteiro

Vice-presidente da CIP

“Hoje não é fácil pura e simplesmente por decreto ou vontade política mudar a realidade das coisas. E a realidade é esta. Todos nós devemos fazer um esforço para mudá-la, mas não devemos ignorá-la”, afirma.

Flexibilidade no centro das preocupações

Embora considere difícil a implementação de uma semana de quatro dias de trabalho no contexto atual nacional, Armindo Monteiro não descarta a necessidade de as organizações procederem a algumas alterações rumo a maior flexibilidade. Aliás, diz mesmo que essa mudança será crucial para não perderem competitividade e para preservarem o bem-estar das pessoas.

“A pandemia veio revelar que há formas de organizar o trabalho que não têm necessariamente ser como habitualmente fazíamos. Todos nós devemos estar imbuídos deste espírito de evolução civilizacional”, refere.

Se o tempo se tornou, mais do que nunca, um ativo muito valioso para as pessoas, as empresas devem ser capazes de encontrar formas de os seus colaboradores terem mais tempo. E isso passa, diz o gestor, pela premissa de que “os trabalhadores não vendem tempo, vendem serviços”.

A flexibilidade — hoje um requisito exigido pela grande maioria dos colaboradores — tornou-se um tema fundamental para as organizações. Dela pode depender a capacidade das organizações de atrai e reter o melhor talento. “As pessoas vão procurar empresas que ofereçam essa flexibilidade, por isso as empresas vão ter de se adaptar para não perderem competitividade. Não se pode querer continuar num modelo que efetivamente mudou“, diz o vice-presidente da CIP.

A edição de 2021 do estudo “Total Compensation” da Mercer concluiu que as organizações estão atentas a isto mesmo e — mais ainda — estão preparadas para a flexibilidade. Cerca de 75% das mais de 100 empresas em Portugal que o estudo envolveu estão dispostas a adotar o modelo híbrido.

Embora umas estejam mais predispostas do que outras, “aquilo que acaba por ser mais comum são os horários flexíveis”, conta Marta Dias. “A questão de nos desprendermos um bocadinho dos horários de entrada e de saída foi, se não determinada, fortemente alavancado pela pandemia”, acrescenta.

Desencontro entre trabalhadores e empregadores

Se, por um lado, as empresas portuguesas mostram que estão preparadas para o tema da flexibilidade, no que toca ao tema da semana laboral reduzida ainda há bastantes receios.

Em Portugal só entre 10% a 12% das empresas admitem que a implementação da semana de quatro dias faz parte dos seus planos a curto prazo, revela o mesmo estudo da Mercer. “Acaba por ser algo que algumas empresas estão disponíveis a testar e implementar, mas não é para já transversal às empresas do nosso país seguir esse caminho”, explica a rewards leader da consultora.

Contudo, do lado dos colaboradores, a vontade de experimentar uma semana mais reduzida é mais forte, e uma percentagem considerável estaria mesmo disposto a sofrer um corte salarial para conseguir esse benéfico.

“Seis em cada dez inquiridos gostaria de experimentar trabalhar menos dias por semana”, revela Mariana Barbosa, com base no estudo “O estado da compensação 2021/22” realizado em Portugal pela plataforma de compensação flexível, em conjunto com a APG.

Além disso, 30% dos profissionais vão ainda mais longe: dizem que gostariam de ter um horário de trabalho de 32 horas mesmo que isso significasse um corte no seu salário.

Não há dúvidas. “O work-life balance é o fator mais valorizado pelas mais de 800 pessoas que participaram no estudo”, finaliza a head of PR & comms da Coverflex.

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