Empresas Familiares: como preparar a transição para a próxima geração?
A transição geracional coloca desafios multidisciplinares, tanto ao nível da família como da empresa, cujas soluções carecem de ser estruturadas e implementadas (também) de um ponto de vista jurídico.
As estatísticas impressionam. Grande parte do tecido empresarial português – desde as micro e pequenas empresas até aos maiores grupos nacionais – tem cariz familiar. No entanto, cerca de 2 em cada 3 empresas familiares não sobrevivem à primeira transição geracional, e cerca de 9 em cada 10 empresas familiares não sobrevivem à segunda transição geracional.
É comum assumir-se que passar o negócio dos pais aos filhos (e dos filhos aos netos e assim sucessivamente) é algo de natural e, porventura, uma extensão da herança familiar para as gerações vindouras, não só do património, mas também dos valores da família. No entanto, ao contrário do que possa aparentar, o processo de transição geracional com vista à sucessão na liderança e no capital da empresa não é simples, nem natural, nem automático.
A empresa não é um património estático nem facilmente cindível entre os sucessores sem perda de valor, e a transição geracional não planeada pode conduzir a soluções de partilha ou situações de bloqueio, indefinição ou rutura quanto à gestão do negócio, e no limite, ao fracasso e encerramento da empresa. É, por isso, fundamental preparar a transição geracional.
Por quem e em que momento deve ser preparada a transição geracional com vista à sucessão da nova geração na liderança e propriedade da empresa? Como proteger a empresa familiar de eventuais conflitos resultantes da sucessão por múltiplos indivíduos ou ramos familiares? Como ajudar a família a realizar a transição de poder? Como imunizar o património pessoal ou familiar de eventuais problemas ao nível da empresa?
A transição geracional coloca desafios multidisciplinares, tanto ao nível da família como da empresa, cujas soluções carecem de ser estruturadas e implementadas (também) de um ponto de vista jurídico.
A construção de acordos que reflitam o compromisso dos membros da família quanto à família, à empresa familiar e à relação entre a família e a empresa é uma ferramenta útil para antecipar e gerir as dificuldades de uma transição geracional. A realidade das empresas familiares é muito plural, e estes acordos devem, em primeira linha, ser adequados à realidade da empresa e à realidade da família. Devem ter em conta, por exemplo, a dimensão da empresa e a complexidade da sua estrutura, a dimensão da família e o número de ramos familiares em causa, a fase de transição geracional em que se encontram, se a família está ativamente no negócio e participa no capital da empresa, se apenas alguns elementos da família participam ativamente no negócio ou no capital da empresa, se há terceiros à família a participar no negócio ou no capital da empresa.
Por sua vez, é fundamental garantir que, tanto quanto possível, tais compromissos não se limitem a uma mera carta de intenções, mas pelo contrário que os compromissos alcançados sejam juridicamente vinculativos para todos os envolvidos.
O planeamento sucessório poderá também envolver a restruturação societária da empresa e do restante património familiar, de forma a separar o património empresarial e familiar e alocar tal património com vista à sua transmissão organizada e eficiente aos futuros herdeiros.
Num certo sentido, a transição geracional, tantas vezes apontada como o maior problema das empresas familiares, é ela própria o elemento genético e fundacional das empresas familiares. As melhores práticas aconselham que a preparação da transição geracional seja realizada de forma atempada, configurando a empresa como um legado para a geração seguinte e contribuindo ativamente para o entendimento entre os diversos sucessores.
As estatísticas sobre transição geracional nas empresas familiares impressionam, mas não são uma inevitabilidade. E são muitas as empresas familiares que o confirmam: é possível e vale a pena preparar uma transição geracional de sucesso.
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