Montenegro ganhou, Ventura lidera oposição e Pedro Nuno Santos caiu
A eleição que parecia ir deixar tudo na mesma provocou afinal um terramoto no sistema político, com um 'apagão' da esquerda e o fim do bipartidarismo.
Mais do que a esperada vitória da coligação PSD/CDS, as legislativas de 18 de maio de 2025 marcam uma reconfiguração do sistema partidário que as sondagens não antecipavam. Se repetir o resultado nos círculos eleitorais da emigração, o Chega terá mais deputados do que o PS, reclamando a liderança da oposição. Com o colapso dos socialistas, caiu também Pedro Nuno Santos, que anunciou eleições internas a que não será candidato. O país virou ainda mais à direita, que conseguiu mais de dois terços dos deputados, e a esquerda teve o pior resultado de sempre.
A Aliança Democrática conseguiu 32,1% dos votos, mais 3,25 pontos percentuais do que em março de 2024, liderando em 13 distritos. Em termos absolutos são mais 140,7 mil votos, quando faltam contabilizar os círculos da Europa e de Fora da Europa. A coligação somou mais nove deputados, totalizando 89. Sem ter um resultado substancial, Luís Montenegro beneficia do trambolhão da esquerda, que permite à AD ter, sozinha, mais 21 deputados do que PS, Livre, CDU e Bloco.
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"Às oposições caberá respeitar e cumprir a vontade popular, honrando os seus compromissos e as suas propostas, mas adequando-os às circunstâncias nacionais e coletivas.”
A estabilidade política continua, no entanto, a ser tema. A coligação precisa dos outros partidos, seja para evitar um chumbo do programa do Governo, caso avance uma moção de rejeição, seja para aprovar Orçamentos do Estado ou aprovar legislação. O discurso de Luís Montenegro foi, por isso, pontuado por vários sublinhados à “moção de confiança” dada pelos eleitores ao primeiro-ministro e ao Governo, e à responsabilidade da oposição.
“O povo quer este Governo e não quer outro. O povo quer este primeiro-ministro e não quer outro”, disse o líder do PSD, e “todos devem ser capazes de dialogar e colocar o interesse nacional acima de qualquer interesse”. “Os portugueses não querem mais eleições antecipadas, querem uma legislatura de quatro anos”, vincou.
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O fim da linha para Pedro Nuno Santos
Para o PS, estas eleições foram uma hecatombe. As projeções avançadas às 20h00 já apontavam para um mau resultado, com as diferentes sondagens a atribuírem um máximo entre 25% e 26% e um mínimo entre 19% e 21%. A possibilidade de o partido ter um resultado pior do que o Chega tornava-se a história da noite, que o passar das horas haveria praticamente de confirmar. A vantagem socialista é de apenas 48.916 votos, havendo um empate no número de deputados que deverá ser desfeito a favor do partido de André Ventura quando for contabilizado o voto da emigração, que em 2024 deu dois dos quatro deputados ao Chega.
O PS não só não capitalizou o caso Spinunviva, como registou o terceiro pior resultado da sua história e o pior desde 1987, conseguindo apenas 23,38% dos votos, perdendo 365.507 eleitores e 20 deputados face a 2024, ficando com um grupo parlamentar, para já, de apenas 58 deputados.
O “mapa cor de rosa” de 2022 ficou reduzido a um só distrito: Évora. O PS perdeu a liderança em 107 concelhos e o Chega ficou à frente dos socialistas em 121. “Assumo as minhas responsabilidades”, disse Pedro Nuno Santos, que do púlpito anunciou a realização de eleições internas às quais não se candidatará. Horas antes, Duarte Cordeiro, antigo ministro próximo do líder do PS, já antecipava o desfecho: “A ideia de ficarmos atrás do Chega é uma circunstância que deveria levar a uma reflexão profunda do líder do PS”.
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"Não me cabe ser o suporte deste Governo e penso que também não cabe ao Partido Socialista sê-lo.”
“São tempos duros e difíceis para a esquerda, são tempos duros e difíceis para o PS”, reconheceu Pedro Nuno Santos sem, no entanto, mudar de discurso. “Luís Montenegro não tem idoneidade e as eleições não mudaram isso”, disse, acrescentando: “Não me cabe ser o suporte deste Governo e penso que também não cabe ao Partido Socialista sê-lo”. Apesar de não se recandidatar à liderança, terminou o discurso com um “até breve”.
Ventura celebra fim do bipartidarismo
A outra celebração ruidosa da noite ouviu-se no Hotel Marriot, em Lisboa, onde o Chega fez a festa. “Podemos assegurar ao país algo que não acontecia desde o 25 de abril. O Chega tornou-se nestas eleições o segundo maior partido da nossa democracia“, disse exultante André Ventura, que discursou depois de Pedro Nuno Santos e antes de Luís Montenegro. “Já passámos, já passámos, já passámos”, gritou-se na sala.

O Chega teve 1.345.575 votos, mais 236.778 que em março do ano passado, o equivalente a 22,6% do total, e conseguiu ser o partido mais votado em 60 conselhos e quatro distritos: Setúbal, Beja, Faro e Portalegre.
“Podemos afirmar com segurança que acabou o bipartidarismo em Portugal”, atirou André Ventura. “O Chega ultrapassou o partido de Mário Soares, ultrapassou o partido de António Guterres. O Chega matou o partido de Álvaro Cunhal e varreu o Bloco de Esquerda com uma pinta como nunca se viu em Portugal”, atirou.
Só uma análise mais fina permitirá tirar conclusões, mas o Chega terá conseguido ir buscar votos à esquerda e à abstenção — que se cifrou em 35,62% e deve baixar mesmo depois de contados os votos da emigração –, e travado a subida da AD.
O ‘apagão’ da esquerda
O PS não ficou sozinho nos desaires da noite. O Bloco de Esquerda só elegeu Mariana Mortágua, em Lisboa, reduzindo a uma deputada um grupo parlamentar de cinco. Com pouco mais de 119 mil eleitores, o partido conseguiu apenas 2% dos votos.
“O Bloco de Esquerda tem uma grande derrota esta noite. Assumir essa derrota é o primeiro passo para fazermos a reflexão que temos de fazer”, afirmou Mariana Mortágua.
À esquerda, só o Livre destoou, aumentando para 4,2% a percentagem de votos, que permitiram eleger seis deputados. O porta-voz, Rui Tavares, atirou ao crescimento da direita: “Não nos conformamos, não baixámos os braços e não achamos que seja normal ter um país em que a direita se radicalizou e está num crescendo muito grande, com a extrema-direita com tantos deputados”.
É o outro grande balanço que se pode fazer destas eleições. Todos somados, os partidos da esquerda somam 32,6% dos votos e apenas 68 deputados, o pior resultado de sempre.
Maioria de dois terços à direita
À direita, todas as forças políticas subiram, incluindo a Iniciativa Liberal, que ficou, no entanto, aquém do que ‘prometiam’ as sondagens. O partido de Rui Rocha conseguiu 5,53% dos votos e contará com mais um deputado no Parlamento. “Não foi possível crescer mais, assumo esse ponto. Mas olhando para trás, para esta legislatura, para a campanha que fizemos, eu não teria feito nada diferente”, disse.
Com a AD a ter mais votos que a esquerda, a IL perde influência, mas os seus nove mandatos são decisivos para que a direita some 156 deputados, mais de dois terços do total. O que significa que, no limite, poderia aprovar alterações à Constituição sem o PS.
A noite eleitoral teve ainda outro feito inédito: a estreia no Parlamento do Juntos pelo Povo, que conseguiu eleger um deputado na Madeira. Inês Sousa Real será a terceira deputada única na nova legislatura.
A ‘bola’ passa agora para Belém, onde Marcelo Rebelo de Sousa irá receber os partidos e procurar a solução “melhor ou menos má” para governar o país.
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