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A importância de um “manual do utilizador” para estatísticas

O jornalista Ricardo Garcia trabalha com números diariamente, e acha que não é preciso um conhecimento aprofundado de matemática para o fazer. Basta saber fazer as perguntas certas.

O jornalista é só um dos públicos do livro Que número é este?, mas é um dos mais importantes. Ricardo Garcia, jornalista, foi um dos autores da obra publicada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, em conjunto com as sociólogas Maria João Valente Rosa e Luísa Barbosa, e acredita que é para essa profissão que o livro pode ser mais útil, porque “trabalham com números todos os dias”. Disponível para download gratuitamente no site da Fundação, o livro em 22 capítulos é um “manual do utilizador” para as estatísticas.

Como descreveria este livro a quem ainda não o conhece?

É uma introdução a como compreender as estatísticas. Quando falamos de estatísticas pensamos logo em coisas complicadas, mas não é nada disso, o livro é uma introdução, é um manual do utilizador.

O que motivou o lançamento do projeto?

A ideia do projeto nasceu na Pordata. A Pordata trabalha muito com jornalistas e faz muitas vezes cursos de literacia estatística para jornalistas, e queria transformar esse curso num livro. Convidaram-me para me ajudar a escrever este livro já que eu, como jornalista, trabalho muito com números e com jornalismo de dados. Até já tinha escrito um livro sobre o tema, o Sobre a Terra.

Qual a importância deste tipo de divulgação para os jornalistas?

Acho que é fundamental. Todos nós jornalistas trabalhamos com números todos os dias, e nem sempre estamos bem preparados para compreender bem os números que chegam às redações. Todos os dias temos dezenas de comunicados de imprensa com números, de fontes que vão do Instituto Nacional de Estatística até informação de empresas, e é muito importante para o jornalista, como em qualquer outra área, compreender o que tem à sua frente. As estatísticas têm características próprias, e há atalhos que o jornalista pode utilizar para interpretar aquilo com que está confrontado.

Há insuficiências particulares da comunicação social portuguesa neste campo?

Acho que para responder a essa pergunta há dois aspetos importantes. Primeiro, sinceramente não sei se os jornalistas são piores em trabalhar com os números do que o resto da população. Existe o mito, e confesso até que eu acreditava nesse mito, mas pensando melhor e fazendo este livro cheguei à conclusão que não é possível dizer. Não há nenhum estudo que o mostre. No entanto, é verdade que os jornalistas são obrigados a trabalhar com números, e há uma regra: se não entende o que tem à frente não deve escrever sobre ela. Há algumas coisas básicas que é fundamental saber: tem de se saber fazer uma regra de três simples, tem de se saber calcular uma percentagem, e tem de se saber fazer arredondamentos. Podem achar que é banal de mais, que se aprende na primária, mas muita gente falha nisso.

A segunda coisa que acho que é importante é o que o jornalista, diante de um número, não precisa de ter medo da matemática. Precisa de fazer o que o jornalista faz sempre: perguntas. “500% de quê? Porquê 500%? 500% não é muito?” O número tem de ser interrogado.

Estes números podem ser usados para contar histórias?

Acho que uma coisa que eu aconselharia, e de que também falamos um pouco no livro, é que às vezes o número em si não é o mais importante. Pode ser mais importante, na primeira frase, explicar o que o número significa do que dar o número em si, e usar os números com alguma parcimónia e privilegiar a sua contextualização. Para contextualizar o número temos de ir além do que está à nossa frente, procurar outras explicações, falar com pessoas. Hoje em dia há muita coisa boa a ser feita no jornalismo de dados ao juntar números e transformar numa coisa que não é enfadonha.

Foi difícil coadunar a escrita de jornalista com o texto científico aqui necessário, ou os dois tocam-se?

Eu acho que sim, mas isso é uma convicção que eu tenho de que uma pessoa que tem facilidade em escrever pode escrever qualquer coisa. Mas há uma coisa aqui em que as habilidades jornalísticas são importantes. Um dos nossos papéis, especialmente enquanto jornalistas que escrevem sobre temas complexos, como é o meu caso, que sou jornalista da área do ambiente há mais de 30 anos, é justamente traduzir essa realidade complexa numa coisa simples que as pessoas entendam.

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