Alberto Galhardo Simões: “Angola está a fazer um esforço para criar condições mais atrativas para investidores”

Alberto Galhardo Simões é o advogado do mês da edição de fevereiro da Advocatus. O sócio da CMS perspetivou o ano de 2021 para o mercado da África Lusófona.

Em entrevista à Advocatus, Alberto Galhardo Simões, sócio da CMS Rui Pena & Arnaut faz um apanhado das condições de mercado da África Lusófona e o que se pode esperar, nesse espaço, para este ano.

Considera que a questão das reservas cambiais é ainda um entrave complicado para os investidores estrangeiros em Angola, e admite que a conjuntura, criada pela pandemia e baixa do preço do petróleo, são fatores que ainda pesam. E fala da equipa África CMS que conta com quase cinco mil advogados espalhados por 70 países.

Quantas pessoas tem a equipa África CMS? No total e em Portugal?

A equipa África CMS conta com 4.800 advogados espalhados pelos 70 escritórios que temos a nível mundial e que estão inteiramente comprometidos com o projeto africano. Em qualquer assunto que surja podemos sempre contar com o know-how e apoio de qualquer um destes advogados. A mesma filosofia se aplica a Portugal. Na CMS Rui Pena & Arnaut contamos com todos os mais de 100 advogados para este projeto internacional na África Lusófona, sendo que cerca de 10% deste número se dedica em exclusivo.

Alberto Galhardo Simões, sócio da CMS Rui Pena & ArnautHugo Amaral/ECO

 

Que tipo de clientela assessoram?

A nossa clientela é atualmente muito diversificada, mas predominantemente internacional, sendo algumas das empresas que assessoramos clientes globais da CMS. Contamos na nossa carteira de clientes com instituições financeiras (comerciais e multilaterais), ONGs internacionais, empresas do setor hoteleiro e turístico, promotores no setor das energias renováveis, empresas petrolíferas e para-petrolíferas, clientes na área da saúde, empresas de construção e muitas outras. A assessoria jurídica em transações nos setores das infraestruturas, fusões e aquisições, financeiro e investimento estrangeiro é o que predomina, mas em conjugação com os nossos colegas locais asseguramos sempre uma assessoria jurídica numa lógica de “full service“, nomeadamente quando os seus negócios já estão em fase de operação. Os nossos clientes sabem que independentemente do assunto e da complexidade da questão terão sempre uma resposta rápida e de qualidade.

O que mudou, no tipo de trabalho, desde que está na CMS, face à Miranda?

Fui sócio da Miranda durante 16 anos e não trocaria por nada o tempo que lá passei e o muito que aprendi, nomeadamente com o meu amigo Agostinho Pereira de Miranda. Mas a CMS tem uma dimensão e vertente internacional, que entendo essencial e única para nos posicionarmos no continente africano. Integro o Executive Team da CMS África, onde tenho a oportunidade de participar e influenciar uma abordagem estratégica da CMS em todo o continente Africano, tendo funções muito concretas no que respeita à África Lusófona. Para além disso, tenho acesso a muitas transações, assim como a um apoio e experiência muito relevante para todas elas.

Alberto Galhardo Simões, sócio da CMS Rui Pena & ArnautHugo Amaral/ECO

Quantos reforços ainda podem ser esperados para a vossa equipa, depois deste mais recente?

Apesar das conjunturas menos favoráveis nas jurisdições da África Lusófona, conseguimos crescer bastante e de forma sustentada em 2020 e daí a contratação da Maria Figueiredo, que é uma advogada excecional e com um capital grande de experiência acumulado ao longo de 20 anos, nomeadamente na África Lusófona, tendo, aliás, estado envolvida no primeiro projeto solar em Angola. Foi também com uma enorme satisfação que vi o Luís Borba Rodrigues integrar a sociedade de advogados que é nossa parceira em Angola. Conheço o Luís há muitos anos e é um advogado que tenho a certeza que irá trazer uma grande capacidade e know-how à nossa parceira. Dito isto, estamos sempre atentos à possibilidade de contratação de advogados e equipas que reforcem a excelência da nossa equipa, e nos mantenham na estratégia de crescimento que traçámos, sendo que espero anunciar outras contratações muito brevemente.

O que se espera em termos de investimentos para 2021 na África Lusófona?

Acredito que o ano 2021 será ainda um ano difícil para as jurisdições da África Lusófona. No entanto, os investimentos não vão parar e o foco principal estará nas privatizações (Angola) e infraestruturas, principalmente no setor das energias renováveis e isto de forma transversal a toda a África Lusófona. Note-se ainda que em Angola o Governo está a fazer um esforço grande para criar condições mais atrativas para os investidores, pelo que se espera também um regresso gradual do investimento estrangeiro ao país. Já em Moçambique espera-se uma grande atividade direta ou indiretamente relacionada com o projeto de LNG e inúmeros outros investimentos centrados nas energias renováveis, agricultura, linhas ferroviárias associadas a exploração de carvão, etc.. São dois países que, ainda que venham a ter um ano difícil, não deixarão de ser atrativos apetecíveis para o investimento estrangeiro.

Alberto Galhardo Simões, sócio da CMS Rui Pena & ArnautHugo Amaral/ECO

A nível de infraestruturas. Como prevê que venha a ser este ano, nesse mesmo mercado africano lusófono?

Desde há muito tempo que existe um grande interesse nesta área e nas PPPs em particular. Como sabemos, as PPPs são uma alternativa ao investimento público, que tem sido muito incentivada pelas organizações internacionais por forma a envolver o setor privado, e assim ajudar os países africanos a ultrapassar o seu enorme deficit infraestrutural. Mas as PPPs têm que ser preparadas e estruturadas com muito cuidado. Com o apoio internacional, os países da África Lusófona têm-se preparado para esta realidade. Não foi por acaso que há uns anos atrás coordenei uma formação sobre PPPs ao Governo Angolano (apoiada pelo Banco Africano de Desenvolvimento), e que, em junho de 2019, fiz uma apresentação sobre PPPs em Angola a convite do Ministério dos Transportes. Angola tem, também, um quadro regulamentar e projetos de energia solar já em implementação, mas existem desafios que ainda têm que ser ultrapassados. Moçambique já tem executado PPPs e tem concursos estruturados, principalmente no que respeita à energia solar. São Tomé e Cabo Verde têm também um quadro regulamentar e projetos em estruturação. A Guiné-Bissau aprovou recentemente a sua lei de PPPs. Em todos os países da África Lusófona temos a grande satisfação de estar a assessorar clientes no setor das infraestruturas, e penso que 2021 será um ano em que essa atividade crescerá significativamente.

No caso das privatizações: vamos assistir a mudanças na legislação, bem como a várias privatizações, nomeadamente em Angola. Também vamos a assistir ao assinar de muitas PPP. Como encara todas estas mudanças?

De uma forma muito otimista. As privatizações já estão a ser uma realidade e já tivemos mesmo a oportunidade de assessorar clientes nesta área. Existem, no entanto, ainda alguns obstáculos a ultrapassar. Por exemplo, até agora as privatizações têm seguido o modelo de concurso público ou limitado por prévia qualificação e não estou a ver como se conseguiria neste momento fazer através de oferta em bolsa, nomeadamente no caso da Sonangol. Quanto às PPPs, são desde há muito tempo um objetivo estratégico do Governo Angolano e existe já um programa bastante ambicioso. Mas terão que ser enfrentados e resolvidos alguns problemas, tais como o acesso aos mercados financeiros internacionais, sendo que as instituições multilaterais (IFC – do Grupo Banco Mundial e Banco Africano de Desenvolvimento por exemplo) podem desempenhar um papel catalisador muito importante. Nada como ter uma primeira PPP piloto, que poderá projetar capacidade e gerar confiança nos promotores e financiadores internacionais.

Alberto Galhardo Simões, sócio da CMS Rui Pena & ArnautHugo Amaral/ECO

E no que toca às energias renováveis. O que se prevê em casos de países como Angola e Moçambique?

Como já referi, o setor das infraestruturas será muito importante em Angola e Moçambique, mas não só. Embora em menor escala, também em São Tomé, Cabo Verde e Guiné-Bissau se está a constatar um aumento significativo do interesse e aposta nas energias renováveis. Angola já tem em implementação um grande projeto solar com uma capacidade de 370 MW divididos por 7 parques solares. E tendo em conta as condições climatéricas e necessidades estruturais, antecipo que esta tendência de investimento nas energias renováveis seja para manter. Moçambique tem vários projetos de energias renováveis já implementados e atualmente 3 projetos solares e um eólico em lançamento. O projeto solar do Dondo já foi a concurso em 2020 e os outros 3 estão calendarizados para 2021. Não tenho a mínima dúvida que as energias renováveis serão uma prioridade na África Lusófona em 2021 e muito para além deste ano. E nesta área, sem falsas modéstias, a CMS tem uma equipa com experiência e capacidade sem paralelo.

O ambiente de negócios em Angola já está mais convidativo com a atual presidência ou há ainda muitos entraves?

Penso que as autoridades Angolanas têm feito um enorme esforço para melhorar o ambiente de negócios e criar as melhores condições para atrair investimento estrangeiro. São exemplos claros a tendência para a desburocratização, a aprovação da lei de repatriação de capitais, a nova lei do investimento privado (estando em aprovação uma alteração que possibilita a atribuição de incentivos fiscais por negociação), a lei da concorrência, o pedido de apoio ao FMI e todas as iniciativas destinadas a reduzir a dependência do petróleo. Mas a questão das reservas cambiais é ainda um entrave complicado para os investidores estrangeiros, que têm legítimas expectativas de repatriar os dividendos gerados em Angola. A conjuntura adversa, criada pela pandemia e baixa do preço do petróleo, são também fatores que ainda pesam bastante, mas o que é preciso reter são os passos muito positivos que têm sido dados e sem os quais a situação e perspetivas seriam certamente muito piores.

Alberto Galhardo Simões, sócio da CMS Rui Pena & ArnautHugo Amaral/ECO

O mercado da advocacia em Angola e Moçambique está muito aquém do nosso?

De maneira nenhuma. Se alguma coisa aprendi ao longo destes mais de 15 anos em que tenho estado ligado a essas jurisdições é que tenho colegas na África Lusófona com as mesmas, ou melhores, capacidades do que os advogados portugueses. Aliás, se assim não fosse, seria impossível que a CMS estivesse envolvida nesta prática africana, já que dependemos sempre da formação e conhecimentos jurídicos locais dos colegas com quem trabalhamos nas várias jurisdições. Da nossa parte procuramos aportar a experiência e conhecimentos dos advogados da CMS espalhados por todo o mundo. E tudo conjugado resulta que os clientes beneficiam de uma assessoria de excelência em todo o continente e em particular na África Lusófona.

O que pode trazer a CMS de mais-valia face aos seus concorrentes (portugueses) neste campo?

É sem dúvida a sua dimensão e presença global, que não tem paralelo em nenhuma outra sociedade portuguesa. É para mim uma grande vantagem estar inserido na estrutura da CMS África, que pensa e aborda o continente como um todo, e ter uma estrutura que me permite em qualquer transação apresentar uma equipa composta pelos melhores e mais capazes advogados, estejam eles em Lisboa, Luanda, Londres, Nairobi, Paris, Joanesburgo ou Singapura.

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