“A Habit está a tornar a venda de seguros gratuita para lucrar no pós-venda”

A Habit, cofundada por Domingos Bruges, já gere 20 milhões de euros em prémios e quer quintuplicar o valor, escalando com tecnologia que multiplica a eficiência das equipas no pós-venda.

Domingos Bruges é um dos cofundadores e o CEO da Habit que, num mundo de vastas oportunidades e riscos de negócio, decidiu arrancar com a empresa de tecnologia. Atualmente, a Habit tem 20 milhões de euros em prémios sob gestão e, nesta entrevista com o ECOseguros, explica como planeia em ano e meio chegar aos 100 milhões. Chegar a mais parceiros está no caminho, mas o verdadeiro motor é usar tecnologia para gerir os serviços pós-venda — permitindo que uma equipa que antes tratava dez sinistros por dia consiga agora gerir centenas.

O CEO explica como a Habit se propõe a tornar mais rápida gestão de sinistros numa conversa em que se fala da concorrência e do impacto da evolução tecnológica no mercado de trabalho do setor segurador.

Como tem sido a evolução da Habit e quais os objetivos de crescimento?

Temos mais vinte milhões de euros de prémios sob gestão e queremos atingir 100 milhões de euros de prémios agora com uma escala de tecnologia. Temos um target de cerca de 18 meses. A Habit foi desenhada para escalar: somos uma equipa de produto; o produto é revendido ou licenciado múltiplas vezes a diferentes clientes, sem precisar de mais pessoas, o que faz com que o nosso crescimento esteja ao ritmo destas parcerias.

Já têm clientes empresariais para atingir a meta?

A Habit é a cola entre as diferentes seguradoras e os diferentes produtos e o momento certo, o cliente certo e o seguro certo que é mostrado em diferentes contextos do cliente – seja na loja, telemóvel, ou noutros locais.

Além disso, estamos a explorar a área da saúde. O Hospital da Luz está no nosso ecossistema, ainda de forma exploratória. Mas temos um pipeline liderado pelo João Madureira Pinto, focado em novas parcerias principalmente na União Europeia e América Latina — as nossas geografias alvo.

Domingos Bruges, cofundador e CEO da Habit em entrevista ao ECOseguros revela que a empresa tem estado atenta às dificuldades dos clientes a lidar com seguros: “Quem comprou um seguro de forma conveniente quer a mesma simplicidade na utilização”.Luís Ribeiro | ECO

O que mudou na Habit recentemente?

Até agora o foco foi tornar o seguro transparente, acessível e contextual no momento da subscrição. Com o tempo começámos a construir tecnologia para fechar a visão: além da subscrição, também a utilização. Por isso estendemos a linha de serviços para TPA (Third Party Administrator): gerir pós-venda, reembolsos e sinistros.

Quem comprou um seguro de forma conveniente quer a mesma simplicidade na utilização. Isto trouxe um impacto grande nas nossas receitas porque passámos a operar portfólios das seguradoras para determinados produtos, não apenas apólices distribuídas pelos parceiros. Isto traz-nos um crescimento enorme que aumento o número de apólices sob gestão.

Atuam como mediadores?

Não como mediadores, mas como TPA, o nosso parceiro é que é a mediadora, é quem está em frente ao cliente. Temos figura de mediação “dentro de casa” por conveniência/regulação, raramente usamos a essa valência.

O core da Habit é a distribuição, mas queremos oferecer praticamente de forma gratuita, para que a nossa monetização aconteça no pós-venda — algo que a seguradora já tem como custo

Domingos Bruges, cofundador e CEO da Habit

A vossa receita é então maior?

O número de clientes sob gestão é muito maior. Antes, a Habit operava apenas as apólices vendidas através dos nossos parceiros de distribuição — seja loja física, online ou telefone. O que mudou foi que passámos a estender da venda para a operação pós-venda.

Agora já não gerimos só as apólices distribuídas pelos parceiros, mas também o portefólio total da seguradora para um determinado produto. Ou seja, a seguradora pode ter muitos seguros, muitos clientes e diferentes canais, e a Habit consegue gerir tudo isso. Independentemente do canal de origem, do cliente ou do produto, a Habit pode assumir a gestão completa: sinistros, reembolsos e assistências, nos segmentos acordados.

Chegam à parte da peritagem?

Sim. Chegamos à parte total: proposta, reabertura se o cliente não concordar, recolha de dados, tudo. Temos estratégia para aumentar a exposição a diferentes produtos, mas sempre garantindo que a tecnologia acelera tarefas repetitivas e processuais. Acreditamos que conseguimos operar milhões de apólices com uma equipa que tradicionalmente operaria 10 mil. A escalabilidade é enorme. A automação e a inteligência artificial estão na ordem do dia.

Onde se diferenciam na peritagem?

Estamos muito focados no trabalho de backoffice: validar identidade do cliente, detetar fraude, verificar elegibilidade e capitais envolvidos. Todos os processos espaçados no tempo são recolhidos e analisados pela nossa ferramenta, que automatiza e faz uma primeira análise. O operador de sinistros apenas revê a sugestão do sistema e valida ou altera. Isto acelera aprovações de reembolsos, cirurgias ou reparações.

Na parte da distribuição temos também vantagem competitiva porque o nosso custo é muito baixo. A forma de compensar é normalmente através de uma comissão sobre a venda que é paga ou pela seguradora ou diminui a receita do parceiro. A nossa visão é remover essa barreira. O core da Habit é a distribuição, mas queremos oferecer praticamente de forma gratuita, para que a nossa monetização aconteça no pós-venda — algo que a seguradora já tem como custo, já que mantém uma equipa a operar sinistros. O que propomos é simples: transferir parte desse custo de operação para a Habit. E conseguimos fazer isto porque a distribuição não é feita por pessoas, mas por tecnologia. São máquinas que estão a correr, não humanos, e por isso conseguimos ser muito mais eficientes.

Domingos Bruges, cofundador e CEO da Habit em entrevista ao ECOseguros: “Vamos ter desafios, claro, e concorrentes a lançar iniciativas semelhantes, mas acreditamos que para as seguradoras a nossa proposta é muito vantajosa”.

E estão aí os 100 milhões?

Mais do que isso. Queremos ter uma presença forte na Europa e América Latina. Vamos ter desafios, claro, e concorrentes a lançar iniciativas semelhantes, mas acreditamos que para as seguradoras a nossa proposta é muito vantajosa. Passam a ter uma ferramenta que suporta 100% da distribuição e, a jusante, a gestão de sinistros.

Que parceiros já têm?

Trabalhamos com todas as seguradoras em Portugal. Temos acordos em que somos a plataforma de distribuição para canais alternativos. Lançámos produtos como os da Wells e do Instituto Óptico, em que fornecemos também a gestão de sinistros.
Temos ainda a Medipet, TPA de seguro animal. Opera reembolsos, pré-autorizações de cirurgias e rede de prestadores. Foi lançada nos canais da Auchan com a Oney. Funciona assim: o cliente envia uma fatura do veterinário, o sistema identifica automaticamente o titular, o animal, a apólice e as coberturas. Valida tudo e propõe reembolso em minutos. Antes demorava dias. Agora basta validação humana final.

Então o humano continua essencial?

Sem dúvida. O nosso objetivo não é substituir, mas aumentar a capacidade. Hoje, em vez de passar o dia a recolher dados e enviar e-mails, o profissional atua em decisões críticas e casos complexos. Continuará a existir a especialização, mas a produtividade aumenta muito. Uma pessoa que geria dez sinistros por dia pode agora gerir centenas.

Como provam às seguradoras e potenciais clientes que a tecnologia realmente gera resultados?

Para as seguradoras é evidente: uma equipa de 100 pessoas, apoiada pela nossa tecnologia, deixa de gerir apenas 200 mil apólices e passa a gerir milhões. Não é só retorno financeiro imediato, é eficiência comprovada. Mostramos que funciona e que os sinistros são validados corretamente.

Como validaram no mercado?

A nossa estratégia foi começar pela distribuição. Levávamos novos canais de negócio (tipo telco) às seguradoras e, a partir daí, propúnhamos também gerir os sinistros associados. Assim, elas puderam observar a nossa operação em contextos controlados. Quando perceberam que funcionava, começaram a pedir que geríssemos carteiras maiores, até chegarmos ao portefólio completo de determinado produto. Não foi algo planeado desde o primeiro dia, mas uma evolução natural a partir do feedback e da confiança conquistada.

Os nossos parceiros não estão a despedir pessoas, antes, uma pessoa que antes geria dez sinistros por dia pode passar a gerir centenas. Ou seja, não se trata de despedimentos, mas de qualificação e ampliação de capacidade

Domingos Bruges, CEO e cofundador da Habit

A vossa entrada nos processos de sinistro implica redução de postos de trabalho nas seguradoras?

Não. O que vemos é um aumento da capacidade das equipas. A tecnologia atua como motor, mas o toque humano continua essencial. O que muda é o foco: em vez de tarefas repetitivas, os profissionais dedicam-se a decisões críticas e análises especializadas. Os nossos parceiros não estão a despedir pessoas, antes, uma pessoa que antes geria dez sinistros por dia pode passar a gerir centenas. Ou seja, não se trata de despedimentos, mas de qualificação e ampliação de capacidade.

Quais foram as principais barreiras para escalar o negócio?

Começamos a empresa a licenciar tecnologias para seguradoras e percebemos que vender a seguradoras percebemos que não funcionava, A mudança veio quando começámos a levar a nossa própria tecnologia a ativar estes canais de distribuição — novos canais de distribuição, novos clientes — e assim batíamos à porta das seguradoras com oportunidade de negócio. Isso abriu as portas.

A segunda barreira foi a perceção de que éramos “mais um intermediário” na cadeia, o que poderia aumentar custos. Queremos ultrapassar esta barreira ao mudar o modelo de monetização: deixarmos de depender de comissões na venda e passarmos a indexar receitas ao pós-venda. Assim, eliminámos barreiras comerciais e tornámo-nos uma solução sustentável e vantajosa para todos os parceiros.

Domingos Bruges, cofundador e CEO da Habit em entrevista ao ECOseguros: “Consideramos o país a base ideal para a Europa: é um mercado regulado segundo normas europeias, suficientemente avançado, mas com escala que permite experimentar e ajustar sem riscos excessivos. É quase um laboratório prático de inovação em seguros”

Qual é a importância de Portugal para a evolução tecnológica nos seguros?

Apesar de termos começado formalmente fora, fizemos um “flip” dos EUA para Portugal e hoje a nossa sede está aqui. Consideramos o país a base ideal para a Europa: é um mercado regulado segundo normas europeias, suficientemente avançado, mas com escala que permite experimentar e ajustar sem riscos excessivos. É quase um laboratório prático de inovação em seguros.

Além disso, muitas seguradoras e bancos que operam em Portugal são players globais. Isso dá-nos um palco privilegiado para depois escalar internacionalmente. Também notamos que existe muita abertura das pessoas em transitar de processos tradicionais para soluções mais tecnológicas, o que facilita a adoção.

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