“Lisboa tem muita atratividade para data centers por si só, sem precisar do apoio de ninguém”

Tesh Durvasula, CEO da AtlasEdge, explica o que levou a empresa a escolher a região de Lisboa para o seu primeiro data center em Portugal e quais as expectativas para este mercado.

Acabada de inaugurar o primeiro centro de dados em Portugal, a empresa europeia de data centers AtlasEdge já planeia expandir as suas infraestruturas no país, aproveitando as boas condições que Portugal oferece para quem pretenda aqui instalar este tipo de infraestrutura. Em entrevista ao ECO, Tesh Durvasula, CEO da empresa, descreve Oeiras como o “Silicon Valley” de Lisboa, numa alusão ao grande pólo tecnológico de São Francisco onde estão localizadas as maiores empresas tecnológicas norte-americanas.

Para o líder da empresa, é apenas uma questão de tempo até que se comece a olhar para Portugal e Espanha como locais favoráveis à instalação de data centers e a criação de hubs de infraestrutura digital. Tesh Durvasula explica ainda que serviços de IA como ChatGPT, Perplexity ou Anthropic “estão a correr” nos data centers da AtlasEdge e que é necessário investir em infraestrutura energética para responder aos desafios que se aproximam, dando o exemplo prático dos carros autónomos.

Porquê a escolha de Carnaxide para este data center?

Oeiras é o “Silicon Valley” de Lisboa. É uma área bonita e tanto o presidente da câmara como o vice-presidente têm sido apoiantes da inovação, da tecnologia, da educação e do investimento.

Quando se consegue ter uma vila ou uma cidade a apoiar o desenvolvimento e a ser parceira deste crescimento, torna-se muito mais fácil para nós, enquanto empresas do setor privado, virmos para cá e continuar a procurar o investimento que queremos realizar. E isto é muito positivo, acima de tudo, para os nossos clientes e para todas as pessoas que ajudaram a construir este centro de dados.

Qual é o valor total deste investimento?

Ao longo dos próximos anos, planeamos construir três campus, cada um com três edifícios, na zona, com uma capacidade entre 30 e 40 MW, o que poderá representar um investimento total de até 500 milhões de euros ao longo de cinco a sete anos, à medida que continuamos a desenvolver o projeto. Pode ser que aconteça mais rapidamente se os clientes chegarem mais cedo, ou poderá demorar o período que acabei de mencionar.

Além disso, conseguimos também 253 milhões de euros em capacidade de financiamento verde. Os principais bancos do mercado também apoiam o nosso desenvolvimento na zona. Portanto, a construção de centros de dados em Lisboa é apoiada não só pela comunidade financeira, mas também pela comunidade tecnológica e pelas autoridades locais. Estamos, de facto, a receber muito apoio.

Tesh Dursavala, CEO da AtlasEdge, assina o quadro que assinala a inauguração do data center

A decisão dos Estados Unidos em deixar Portugal sem restrições relativamente à compra de chips tornou este mercado mais atrativo?

Acho que já era um mercado atrativo antes dessas oportunidades. Se olharmos para a cidade de Lisboa, tem algumas características muito atrativas. Primeiro, não é muito congestionada. É uma cidade grande, mas tem bastante espaço e não está sobrelotada em termos de população. Além disso, tem várias universidades — acredito que nove dentro de um raio de cem quilómetros da cidade — o que proporciona um pólo de talento incrivelmente vasto.

Existem também várias estações de cabos submarinos, que se ligam a vários hubs de internet exchange, permitindo que mais de 100 operadores possam fornecer serviços na área metropolitana de Lisboa. Isso torna a cidade muito atrativa para grandes multinacionais, como empresas de serviços financeiros. E, por último, mas não menos importante, torna Lisboa muito atrativa também para empresas de cloud hyperscale e de inteligência artificial.

Portanto, acredito que Lisboa tem muita atratividade por si só, sem precisar do apoio de ninguém. E se tiver alguns amigos e aliados dispostos a ajudá-la, penso que continuará a ser um impulso positivo para a região.

O que ainda falta para que Portugal se torne efetivamente num hub de data centers ao nível dos principais centros da Europa?

Não acho que esteja a faltar alguma coisa. É apenas uma questão de adoção. Vai com o tempo e acreditamos firmemente que a Península Ibérica vai ser uma grande área de crescimento em infraestrutura digital. Será que vai ser tão grande como a América do Norte ou os Estados Unidos? Talvez não. Mas terá várias grandes empresas hyperscale a operar na região? Absolutamente.

Portanto, não acho que esteja a faltar alguma coisa. Penso que é apenas uma questão de saber se o resto do mundo vai reconhecer o que a região tem para oferecer e começar a investir nela.

E o que está planeado agora, após a inauguração deste centro de dados? Que tipo de clientes vai servir?

Atualmente, cerca de 50% das instalações já estão pré-arrendadas. Ou seja, as empresas decidiram juntar-se a nós antes mesmo de termos oficialmente aberto portas.

Entre os nossos clientes estão grandes empresas de cloud e hyperscalers, grandes integradores de sistemas e empresas de tecnologia. Temos também algumas empresas regionais mais pequenas, locais, de Portugal, assim como várias empresas de telecomunicações.

Portanto, penso que vamos ver este tipo de mistura de clientes ao longo do desenvolvimento da nossa estrutura. Se olharmos para a sustentabilidade, energia renovável, acesso a talento, proximidade ao aeroporto e forte apoio do setor público — do presidente da câmara e do vice-presidente — acredito que vamos assistir a um grande crescimento aqui nos próximos anos.

Os desafios mais imprevisíveis são outros: às vezes dizem que vais obter a licença em seis meses, mas podem ser necessários dez meses, ou pensas que a eletricidade chegará em seis meses, mas pode demorar 12 meses. Esses são os maiores desafios atualmente.

Tesh Durvasula

CEO Atlas Edge

Quais são os principais desafios que prevê para o crescimento das operações em Portugal nos próximos anos?

Vemos os desafios tradicionais que existem na indústria de data centers. Primeiro, demora algum tempo para concluir o planeamento urbano e as licenças. Segundo, é necessário garantir a eletricidade para a instalação, o que também demora algum tempo e é, atualmente, um desafio global — cidades em todo o mundo estão a enfrentar este problema.

A maior parte do restante conseguimos organizar adequadamente, porque sabemos como planear, mas os tempos de entrega são muito mais longos. Antes, conseguíamos obter equipamentos como geradores, switches e transformadores em quatro a cinco meses. Hoje, alguns destes equipamentos demoram 12 a 18 meses a chegar. Mas essas são coisas que sabemos gerir.

Os desafios mais imprevisíveis são outros: às vezes dizem que vamos obter a licença em seis meses, mas podem ser necessários dez meses, ou pensamos que a eletricidade chegará em seis meses, mas pode demorar 12 meses. Esses são os maiores desafios atualmente.

Além disso, a indústria tem crescido muito rapidamente na última década, e nos últimos quatro anos houve um crescimento massivo, com vários megawatts e gigawatts de expansão na América do Norte e na Europa Ocidental. Isso gerou grande procura por mão de obra, pelo que obter pessoas qualificadas também é difícil.

Portanto, uma boa recomendação é incentivar os jovens a estudarem engenharia elétrica para suprir esta procura futura.

 

Como é que a empresa planeia atrair e reter talento técnico neste mercado tão competitivo?

Sabemos que esta é uma indústria empolgante. Se realmente queres estar próximo de ajudar o mundo a aceder e usar todas estas aplicações — seja no negócio de data centers, telecomunicações ou qualquer um dos setores da infraestrutura digital — esta é uma área onde podes fazê-lo. É absolutamente entusiasmante estar na primeira fila a assistir, seja qual for o serviço de IA: ChatGPT, Perplexity ou Anthropic Cloud, não importa, todos eles estão a correr nos nossos data centers e a chegar às pessoas neste exato momento.

Mas isto ainda não está totalmente disponível para o consumidor. Olhando para a primavera de 2026, a Alphabet e a Waymo vão lançar o seu primeiro carro autónomo em Londres. E de Londres a Lisboa não é assim tão longe, está a acontecer. Portanto, se o carro autónomo vai chegar à Europa, estamos a falar de velocidades de resposta para a aplicação inferiores a 25 milissegundos em todo o país, o que significa que serão precisos mais data centers e mais telecomunicações.

Toda esta indústria é, portanto, muito empolgante. E se os jovens quiserem entrar e trabalhar nesta área, este é um lugar divertido. Estou a tentar, desesperadamente, tornar os data centers apelativos novamente.

Penso que quando se consideram as oportunidades para eletricistas, técnicos de data center ou engenheiros de rede — a construção de data centers tem agora projetos com duração média de cerca de 24 meses. Isso significa centenas de empregos no setor da construção e, depois, no setor da manutenção e segurança, também há muitas oportunidades. Portanto, penso que haverá muitas oportunidades numa indústria em crescimento. E acredito que a maioria das pessoas quer entrar em indústrias estão a crescer.

Foi anunciado um investimento verde de 253 milhões de euros. Quais são os principais indicadores de sustentabilidade e metas associados a este financiamento?

Normalmente está relacionado com a energia e eficiência energética (PUE). Primeiro, olhamos para a fonte de energia: renovável. Isso já é fantástico. Em segundo lugar, consideramos a eficiência do data center, garantindo certos padrões de design. Atualmente, estamos na região de 1,2 de PUE, que é um número líder na indústria.

Além disso, trabalhamos estreitamente com os nossos clientes, que têm metas muito ambiciosas para 2030 e 2050. O nosso objetivo é acompanhar e apoiar essas metas, mantendo-nos alinhados com eles — por exemplo, em termos de carbono, eficiência energética e consumo de água. Estes fatores entram diretamente nos cálculos para o design e a tecnologia dos nossos data centers.

E conseguem assegurar que a energia utilizada é 100% renovável?

Quanto à garantia de que os novos data centers operam com 100% de energia renovável, na prática, só podemos comprar energia renovável. Fazemos parte de um ecossistema que tem evoluído muito. Há 25 anos, a indústria de data centers não estava tão focada nestas questões como hoje. Antes gastávamos muito mais dinheiro na construção, consumíamos mais água e era enviada para os esgotos.

Hoje, temos sistemas fechados reciclamos a água, o calor e a energia. Todo o ecossistema de centros de dados melhorou significativamente nos últimos dez anos, e espera-se que continue a ficar ainda mais eficiente na próxima década.

Quais são as expectativas relativamente Digital Networks Act, o regulamento que está a ser preparado pela Comissão Europeia?

Tudo o que posso dizer é que fazemos parte de uma infraestrutura que tem evoluído ao longo dos anos. A nossa parte é muito importante para as telecomunicações; os nossos data centers não funcionam se não tivermos boas redes.

Precisamos que sejam fiáveis, seguras e, neste momento, rápidas. Precisam de ser rápidas. Como disse anteriormente, precisamos de atingir menos de 25 milissegundos para que se possa conduzir autonomamente em todo o país, e para isso são necessárias redes rápidas, seguras e fiáveis.

A União Europeia tem, tradicionalmente, políticas muito fortes e tem estado à frente da curva em termos de segurança e fiabilidade. Portanto, espero que mantenham essa tradição sólida, mas vamos ver o que acontece. Tento não comentar demasiado sobre políticas.

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