O mercado europeu continua a ser o principal destino das vendas no exterior das empresas portuguesas. Mas cada vez mais setores querem reforçar a presença para lá do Velho Continente.
A Europa é o principal destino das exportações portuguesas, com a vizinha Espanha a liderar, captando perto de um quarto das vendas de bens e serviços de empresas portuguesas no exterior. Com as eleições europeias à porta, a maioria dos empresários portugueses ainda assume a Europa como o mercado “natural”, mas não restringem a exportação a nenhuma região. A ambição é global.
Os eleitores de todos os países da União Europeia vão escolher, entre os próximos dias 6 e 9 de junho, os 751 novos eurodeputados do Parlamento Europeu. Uma escolha que poderá afetar a atividade das exportadoras portuguesas, na medida em que as decisões que são debatidas na esfera europeia têm impacto naquela que é a sua principal área de exportação: a Europa.
Espanha, França e Alemanha são os principais compradores de Portugal, com quotas de 23%, 14% e 11%, respetivamente. Os EUA, na lista dos 10 maiores mercados exportadores de Portugal, representa apenas 6% do valor global. Apesar da hegemonia europeia nas vendas no exterior, para algumas empresas, o Velho Continente é apenas só mais um mercado.
“A Casais tem uma forte presença internacional, com 50% das suas vendas oriundas de mercados fora de Portugal, num total de 700 milhões de euros”, adiantou ao ECO, António Carlos Rodrigues, CEO do Grupo Casais. No que diz respeito às vendas, o empresário adianta que “depois de Portugal, está Angola”.
Já a Alemanha, que foi o primeiro mercado internacional do grupo de construção de Braga há 30 anos, hoje pesa apenas 1%. Apesar do menor peso da Europa nas vendas lá fora, António Carlos Rodrigues reconhece que quer “tornar a Europa na nossa principal presença. Desta vez, com exportação de valor acrescentado a partir de Portugal.”
A União Europeia precisa de assegurar a competitividade da sua economia face às economias americana e asiática.
O líder do Grupo Casais refere ainda que “a Europa é o nosso mercado interno natural e temos a perspetiva de aumentar a nossa presença neste local“, apontando em vantagens como “a proximidade cultural e geográfica, bem como a integração em mercados estáveis e desenvolvidos”.
“A internacionalização fora do continente europeu também é estratégica para nós. Estes mercados não são mutuamente exclusivos”, acrescenta. Para o António Carlos Rodrigues, a “Europa está a voltar-se mais para dentro em comparação com o passado e isso fortalece a necessidade de maiores trocas comerciais dentro do espaço europeu. A União Europeia precisa de assegurar a competitividade da sua economia face às economias americana e asiática“, defende.
Com 85% das suas receitas geradas no exterior, a ICC-Indústria e Comércio de Calçado tem na Europa o seu mercado preferencial, mas a dona da marca de calçado Lavoro já espreita outras oportunidades fora do Velho Continente. “O calçado profissional é um produto cuja procura é proporcional ao grau de maturidade e responsabilidade económica, social e ambiental dos mercados e das empresas. Nessa perspetiva, a Europa, em especial a União Europeia, não pode deixar de ser o nosso mercado preferencial“, explica Teófilo Leite, presidente do conselho de administração da empresa de Guimarães.
Há sinais muito positivos em outros mercados, como a Mongólia, para onde exportamos botas de mineiro, que nos encorajam e incentivam a referenciar novas oportunidades nas mais diversas latitudes.
Teófilo Leite reconhece, porém, que “há sinais muito positivos em outros mercados, como a Mongólia, para onde exportamos botas de mineiro, que nos encorajam e incentivam a referenciar novas oportunidades nas mais diversas latitudes“.
Constituída por 1.500 empresas, a indústria do calçado é uma das mais exportadoras do país: vende mais de 90% da produção para 173 países nos cinco continentes. No ano passado, o setor vendeu menos dez milhões de pares de calçado no estrangeiro, sendo afetado pela diminuição das encomendas por parte dos clientes na Alemanha (-5,6%), nos Países Baixos (-13,7%), no Reino Unido (-9%), nos EUA (-11,3%) e na Dinamarca (-28,5%), tal como aconteceu noutros setores tradicionais, como o têxtil e o vestuário.
No caso da ICC, que detém as marcas Lavoro, No Risk, Portcal e Go Safe, a empresa exporta para 50 mercados e os seus três principais mercados de exportação são: Irlanda, Bélgica e Suíça.
Com uma longa tradição de comércio na Europa, a Ramirez, que “começou a exportar no século XIX, muito antes do ideal da União Europeia se configurar e concretizar”, tem no Velho Continente o seu mercado de preferência. “Estamos em quase todos os países da União Europeia, bem como em muitos outros que não estão no mercado único europeu“, explica Manuel Ramirez, presidente do conselho de administração da Ramirez & (Cª), Filhos.
Com mais de 200 produtos exportados para 60 países nos cinco continentes, a empresa que conta com 150 anos de história ambiciona ir mais longe. “A nossa vasta gama de produtos, única no mercado mundial, bem como a nossa capacidade de produção instalada permitem-nos ambicionar ter presença em outros países“, aponta Manuel Ramirez. “Estamos a desenvolver vários projetos nesse sentido, que passam por dar nova vida a marcas centenárias do nosso portefólio e ainda com enorme notoriedade em diversas latitudes”, detalha.
Com 60% do volume de negócios de 32 milhões de euros gerado no ano passado proveniente das exportações, o grupo tem na Bélgica, Brasil e Angola os seus principais mercados.
As uvas Vale da Rosa, conhecidas por não terem grainha, estão atualmente a voar para novos mercados. Depois de terem passado a exportar para Hong Kong, o seu mais recente mercado, as uvas Vale da Rosa chegam a um total de sete mercados: Reino Unido, Polónia, França, Hungria, Países Baixos, Hong Kong e Malásia. O Reino Unido é a principal âncora, com o maior peso entre todos os mercados de exportação, seguindo-se os Países Baixos e a Polónia.
“Hong Kong foi o mais recente destino, numa operação que arrancou em 2023 e onde destacamos a solução pioneira adotada ao nível do transporte. As uvas são enviadas por avião, garantindo que chegam aos consumidores na sua condição ótima, mesmo nos mercados mais distantes, o que nos abre, naturalmente, novas oportunidades na expansão internacional”, explica Susana Ferreira, diretora comercial e de marketing do Vale da Rosa, ao ECO.
O nosso foco é levar a qualidade das nossas uvas ao maior número possível de consumidores, nos mais diversos mercados, seja na Europa seja em geografias mais distantes como a Ásia ou o Médio Oriente.
A responsável nota que, “com esta solução, passa a ser possível alcançar outras geografias, cumprindo todas as exigências de qualidade e levando o sabor característico e inconfundível das uvas sem grainha Vale da Rosa aos quatro cantos do mundo”. “O nosso foco é levar a qualidade das nossas uvas ao maior número possível de consumidores, nos mais diversos mercados, seja na Europa seja em geografias mais distantes como a Ásia ou o Médio Oriente“, assume.
Segundo a porta-voz do Vale da Rosa, o facto de a empresa ter iniciado a exportação por via aérea em 2023 despertou também um interesse significativo por parte do mercado asiático, “onde já fomos procurados por um grande distribuidor japonês, entre outros contactos, o que é extremamente promissor para o crescimento e expansão da Vale da Rosa nessa região”.
Com praticamente toda a produção exportada, a Herdade Maria da Guarda tem nos principais embaladores mundiais os seus grandes compradores. “O destino mais natural é Itália que é o maior exportador do mundo de azeite embalado e por isso necessita de nos comprar grande parte da nossa produção para embalar e exportar”, aponta João Cortez de Lobão.
Segundo o CEO da Herdade Maria da Guarda, “Itália tem vindo a decrescer a sua produção nacional, enquanto nós, Portugal multiplicamos por cinco a produção que tínhamos antes do Alqueva. Isto deve-se muito graças aos novos investimentos e a uma nova geração de agricultores inovadores que souberam aproveitar a água do Alqueva.”
Além de Itália, a Herdade Maria da Guarda exporta também para Espanha – “o nosso país vizinho teve nos dois últimos anos uma forte quebra de produção” – e para os Estados Unidos, um mercado “em grande crescimento”. “Os EUA produzem apenas 15 mil toneladas de azeite e já consome mais de 450 mil por ano, passando a ser o segundo país maior consumidor de azeite do mundo.”
João Cortez de Lobão realça que são estes os principais mercados da produção da Herdade de Maria da Guarda. “E não acredito que num futuro próximo os mercados destinos da nossa produção venham a ser alterados, não só pela fidelidade dos atuais clientes como também pela necessidade que esses clientes têm para procurar, comprar e garantir azeite de qualidade superior”, conclui.
Com um volume de negócios na casa dos 10 milhões de euros e três dezenas de trabalhadores, a Herdade Maria Da Guarda em Serpa produz – só com as suas azeitonas – entre 900 mil e 1,5 milhões de kg de azeite por ano. No último ano, a Herdade Maria da Guarda produziu 1,2 milhões de kg de azeite. Para este ano, a empresa está a antecipar uma produção no limite superior “já que as oliveiras se apresentam muito bem vestidas”.
Outro dos setores que praticamente exporta tudo o que produz é o do têxtil e vestuário. Depois de nove anos consecutivos a crescer até 2018, as exportações da indústria encolheram em 5,6% as compras às fábricas portuguesas, para um total de 5.753 milhões de euros, o que equivale a uma quebra de 339 milhões face ao período homólogo.
Apesar de Espanha ser o principal mercado da indústria têxtil, o setor exporta para todo o mundo e tem nos EUA e no Canadá grandes clientes.
“Não temos maior poder na Europa, temos um mercado dos Estados Unidos muito forte e uma América do sul a ganhar uma quota de mercado importante”, adiantou ao ECO Tiago Pereira da Cunha, líder da empresa com o mesmo nome: Pereira da Cunha. A têxtil familiar com 87 anos de história exporta para todo o mundo: “desde Europa quase toda, América Central e América do Sul (Brasil, Chile, Peru, Mexico, Costa Rica), Ásia- Coreia do Sul e Japão, Austrália, Dubai“. Em Portugal fica menos de 10% da produção.
Para Tiago Pereira da Cunha, a empresa que lidera tem interesse “em tudo o que seja mercado que possa pagar o nosso produto, segmento médio alto”, não havendo “preferência por continente nem por país.” “Em qualquer canto do mundo há sempre lugar para o produto de Pereira da Cunha” e se as vendas forem realizadas fora do continente, isso “muitas vezes leva a uma maior pesquisa da nossa parte, mais investimento para visitar clientes, mas também dá outro gozo”.
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Europa (ainda) é o mercado preferido, mas ambição das exportadoras é global
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