2023 e a urgência de legislação no setor energético

  • Bruno Azevedo Rodrigues
  • 1 Fevereiro 2023

2023 será um ano fundamental para o setor energético, quer pela urgência ditada pela atual conjuntura internacional, como pelas decisões políticas que urge continuar a tomar.

“(…) Pela primeira vez após a crise energética originada pelo embargo petrolífero de 1973, Portugal vivia uma conjuntura política estabilizada que permitia abordar a questão energética à luz daquilo que veio a ser a política constante da atual União Europeia: criação do mercado interno de eletricidade, liberalização do setor energético, afirmação do princípio de liberdade de acesso às atividades de produção e distribuição de energia elétrica (…) a questão energética passou a ser abordada à luz do conceito de “risco moral”, tendo em vista a adoção de políticas de médio e longo prazo que visavam garantir a segurança do abastecimento, a redução de externalidades negativas e a diminuição da dependência energética, com reflexos diretos na balança de pagamentos, na criação de emprego e no desenvolvimento de clusters nacionais voltados para a exportação…”.

Em 2023 passarão 10 anos desde que escrevi um texto – ao qual fui recuperar este excerto – para uma publicação que assinalava os 25 anos de eletricidade renovável em Portugal. O texto não possuía maior virtude que a constatação do óbvio: a essencialidade da abertura legislativa à produção renovável e a necessidade e importância do alinhamento do desenho do setor elétrico nacional com as políticas da União, ao abrigo do conceito de “risco moral” da decisão política e legislativa de médio e longo prazo (uma das bases do que viemos a conhecer como ESG), com vista à redução da dependência de fontes externas e de conjunturas geopolíticas que nos afetavam como nação e sobre as quais não tínhamos capacidade de intervenção. Tendo 2022 testemunhado a concretização dos receios com a questão energética e dos alertas sucessivos de quem sobrepunha a segurança e sustentabilidade ao acesso barato e a risco a combustíveis fósseis, importa atualizar a opinião a 2023.

Enaltecendo quanto foi (bem) feito, muito há ainda por fazer. 2023 será um ano fundamental para o setor energético, quer pela urgência ditada pela atual conjuntura internacional, como pelas decisões políticas que urge continuar a tomar, de modo a que se alcancem as metas estabelecidas no PNEC 2030 e no REPowerEU. A título de exemplo, a propósito do lançamento da plataforma “Clean Tech Europe”, a Comissão voltou a salientar a necessidade de aumento da capacidade eólica instalada de 200GW para 510GW, assim como a produção de 20 milhões de toneladas/ano de gases verdes, em ambos os casos para 2030.

Para Portugal conseguir alcançar as metas a que se propôs, terá de resolver com urgência temas como: (i) o reforço da RESP, planeamento e dimensionamento para a receção da capacidade de injeção dos 10GW de eólica offshore – e para o qual as conclusões que o Grupo de Trabalho criado por iniciativa do Governo se revelarão fundamentais; (ii) a solução célere e definitiva do problema criado pelo gigantesco número de pedidos de acordos diretos com os Operadores – dos quais a vastíssima maioria nunca verá a luz do dia, mas cujo protelar da indefinição começa a comportar um sério problema reputacional e de confiança jurisdicional; (iii) o retomar de leilões periódicos, com prazos definidos e regras que incorporem as lições aprendidas e que à luz das recomendações da própria Comissão se afastem de um modelo de price-only e procurem evitar cenários de bidding negativo, incorporando critérios como sustentabilidade e prevendo mecanismos que assegurem a viabilidade dos projetos em caso de alteração das circunstâncias (MAC, index-linked ou base case), incluindo serviços de sistema e benefícios locais (temos a experiência e exemplo do concurso eólico de 2006/8, ao qual podemos ir buscar importantes contributos); (iv) desbloquear a questão do licenciamento e injeção de gases renováveis nas Redes, que constituiu o principal entrave ao desenvolvimento destes projetos, devendo o Estado assumir o papel de market maker; (v) a necessidade de um quadro legislativo que promova que diferentes agentes de mercado, quer do lado da produção quer do lado do consumo, prestem serviços de serviços de flexibilidade e serviços de sistema ao ORT e ao ORD; e (vi) dar cumprimento ao simplex ambiental e ultrapassar os conhecidos constrangimentos de ordenamento do território.

Tendo a energia passado a assumir lugar cimeiro nas prioridades políticas e económicas da União, com o REPowerEU a poder ir buscar parte significativa dos financiamentos e incentivos compreendidos no pacote de €723.8 “biliões” do Recovery and Resilience Facility, seria trágico que Portugal, por inércia ou morosidade administrativa e/ou inação legislativa e regulatória se perdesse no tempo, com grave prejuízo para consumidores e indústria. Veremos o que 2023 trará…

  • Bruno Azevedo Rodrigues
  • Sócio da Abreu Advogados

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