Fiscalidade do jogo online em Portugal: problemas e perspetivas

  • Inês Teixeira
  • 28 Dezembro 2023

O legislador não pode perder mais esta oportunidade para corrigir a discriminação negativa das apostas desportivas à cota cujas consequências nefastas para o mercado são uma evidência.

De acordo com o último relatório estatístico apresentado pelo SRIJ, o jogo online em Portugal gerou 205.9 milhões de euros em receita bruta. Do total da receita bruta, 40.8% referem-se a apostas desportivas à cota e 59.2% a jogos de fortuna ou azar. O Estado arrecadou, no 2º trimestre de 2023, 59.3 milhões de euros com o imposto especial de Jogo Online (IEJO).

Até 2015, o jogo online era proibido em Portugal. Com a publicação do Regime Jurídico dos Jogos e Apostas Online a actividade passou a ser permitida e altamente regulada.

O maior problema do mercado português do jogo online continua a ser o jogo ilegal. Apesar dos milhares de notificações do SRIJ para encerramento da actividade e bloqueio de websites ilegais, os últimos dados conhecidos apontam para que 56% dos jogadores utilizem sites ilegais.

A solução para esse problema passa seguramente pela implementação de um regime fiscal mais adequado que atraia para o nosso país os maiores operadores mundiais de jogo, de modo a aumentar a oferta lícita (regulamentada e devidamente controlada) de jogo e diminuir a procura por sites ilegais (tornando inatractivo o risco do recurso a operadores ilegais porque as “odds” dos operadores licenciados passam, em resultado da maior concorrência e da tributação adequada, a ser mais próximas, em termos de valor, daquelas que são normalmente oferecidas por sites ilegais).

O IEJO foi criado como imposto exclusivo, que afasta a aplicação do IRC e do Imposto do Selo aos rendimentos derivados da exploração de jogos e apostas online, mas desde a sua génese, sempre revelou uma discriminação não justificada entre diferentes categorias de jogos.

Na verdade, aquando da criação do regime em 2015, a tributação do jogo online, no que concerne a jogos de fortuna ou azar e apostas desportivas, distinguia entre:

  • jogos de fortuna ou azar, tributados progressivamente sobre a “receita bruta” da entidade exploradora (isto é, sobre a diferença entre o montante total das apostas realizadas e os prémios atribuídos);
  • apostas desportivas à cota, tributadas progressivamente sobre as receitas resultantes do montante das apostas efetuadas.

Reconhecendo as fragilidades do regime fiscal aplicável ao jogo online, o legislador eliminou a progressividade do IEJO que passou, na sequência da alteração promovida pela Lei do Orçamento de Estado (LOE) para 2020, a tributar os jogos de fortuna ou azar à taxa fixa de 25% e as apostas desportivas, à taxa de 8% (sendo a taxa de 35% no caso de comissões cobradas pela entidade exploradora de apostas desportivas quando os apostadores jogam uns contra os outros).

Apesar disso, o problema fiscal manteve-se com uma tributação discriminatória das apostas desportivas à cota que, não obstante a liberalização equalitária das várias categorias de jogos promovida em 2015, continuam a ser diferentemente tributadas sobre o valor das apostas, sem consideração dos prémios pagos, ao contrário, por exemplo, dos jogos online de fortuna ou azar ou até de jogos de base territorial. A falta de justificação para essa diferença traduz uma clara violação do princípio da neutralidade, da igualdade fiscal e da proporcionalidade.

A LOE 2020 impôs uma reavaliação do regime fiscal dos jogos e apostas abrangidos pelo RJO, que se encontra em curso e que ainda não foi publicamente apresentada. O legislador não pode perder mais esta oportunidade para corrigir a discriminação negativa das apostas desportivas à cota cujas consequências nefastas para o mercado e para os jogadores são uma evidência dos últimos 8 anos de mercado de jogo online liberalizado.

  • Inês Teixeira
  • Sócia da DLA Piper ABBC

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