I.A. e o futuro do trabalho: trabalho(s) a tempo inteiro
A normalização dos empregos cruzados virá desafiar as noções tradicionais de emprego e estabilidade laboral. Afinal, a ideia de uma única carreira ao longo da vida está já a tornar-se obsoleta.
Na dinâmica atual do mercado de trabalho, onde tecnologia e humanidade se confundem, a Inteligência Artificial (IA) está a ser transformadora para empresas e indivíduos. De assistentes virtuais personalizados à criação efetiva de trabalho, a IA não só está a aumentar a produtividade, como a possibilitar novas formas de trabalhar. Entre as inúmeras disrupções, uma das constatações mais rápidas, é a de que está a libertar horas valiosas aos profissionais. E aqui reside o sinal para mais uma mudança de direção no futuro do trabalho.
Atualmente, a IA já permite que dediquemos mais tempo a atividades criativas e estratégicas. Porém, e mais interessante, é o aumento de profissionais que equilibram vários trabalhos a tempo inteiro no que podemos chamar de “emprego cruzado”. Nesta tendência, e assente na experiência da gig economy, recorre-se à IA e ao tempo por si libertado, para explorar múltiplos projetos e empregos, enquanto se mantêm possível o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal. Não só.
A IA está a tornar os empregos de nível de entrada mais acessíveis, facilitando a aquisição de novas competências, e a exploração de diferentes áreas na ausência de uma educação técnica extensa. Este cenário encorajará o empreendedorismo e permitirá que as pessoas maximizem o seu tempo e produção para aumentar rendimentos, que além da acumulação financeira, serão uma resposta a eventuais condições de trabalho precárias e inflação.
A normalização dos empregos cruzados virá desafiar as noções tradicionais de emprego e estabilidade laboral. Afinal, a ideia de uma única carreira ao longo da vida está já a tornar-se obsoleta à medida que as pessoas priorizam a flexibilidade e a adaptabilidade. Por sua vez, este novo paradigma oferecerá às empresas a oportunidade de explorarem talentos mais dinâmicos e diversificados, alargar o leque de profissionais elegíveis, e potenciar melhores inovações e resultados, a custos mais baixos. Mas aqui, um desafio que não será menor.
A manter-se, a atual prática de procurar a redução de custos por via de contratos a tempo parcial e mais económicos, trará o risco de escassez de empregos a tempo inteiro e precarização laboral, que ciclicamente empurrará mais trabalhadores para empregos cruzados. Em consequência, é previsível que aumentem as questões de segurança no emprego e estabilidade financeira, uma vez que a falta de uma relação laboral tradicional pode significar perder benefícios e proteções sociais. Ainda veremos empregadores incentivar ao empreendedorismo, em substituição das suas responsabilidades.
Os diversos Governos e entidades reguladoras terão assim que adaptar-se a esta nova realidade, e pensar sistemas de apoio, também eles flexíveis. Isto incluirá decisões sobre disposições de segurança social, saúde e reforma, assim como regulação dos empregadores, assegurando que os trabalhadores sejam protegidos independentemente da sua trajetória profissional, a bem do tecido económico e social.
Hoje, não amanhã, a IA é mais que uma ferramenta tecnológica, e pode redefinir o que significa trabalhar e prosperar num mundo em constante mudança. Aqueles que procurem otimizar a relação entre produtividade e remuneração vão encontrar na IA um aliado para diversificar e aumentar fontes de rendimento. No entanto, os desafios estão à vista, na mais que provável massificação de uma tendência que promete fazer-nos repensar a nossa relação com o trabalho, sob o risco de perdermos a oportunidade de pensar de todo.
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