Reinventar os conselhos de administração em tempos de transformação sistémica
A capacidade de adaptação dos conselhos — na sua composição, nos ciclos de renovação e nas competências que integram — será decisiva para desbloquear o crescimento das empresas.
À medida que as empresas enfrentam um mundo cada vez mais incerto e interligado – marcado por avanços tecnológicos, instabilidade geopolítica, novos padrões de consumo e crescente pressão social —, o papel dos conselhos de administração torna-se mais central do que nunca. A liderança empresarial atravessa um momento de viragem profunda, em que se exige não apenas supervisão, mas também visão ética e capacidade de adaptação.
Num estudo que realizámos com CEOs de várias geografias, percebe-se claramente que estes líderes já reconhecem a necessidade de uma transformação pessoal para poderem mudar as organizações que lideram. Em 2019, apenas 26% diziam sentir essa necessidade, enquanto, em 2021, o número disparou para 78%. No entanto, os conselhos de administração continuam, em grande medida, ‘presos’ a métricas tradicionais, sobretudo financeiras, sem acompanhar a velocidade e a complexidade dos novos desafios.
O estudo revela duas realidades recorrentes nas atuais lideranças. Por um lado, são muitos os conselhos de administração que continuam pouco preparados para enfrentar os desafios do contexto atual e futuro. Por outro, é evidente que o paradigma da criação de valor para o acionista já não é suficiente para orientar a atuação dos conselhos, ainda que não exista um consenso sobre qual será o próximo modelo. Esta indefinição não é apenas teórica, tem claras implicações estratégicas e exige uma reflexão urgente sobre como os conselhos devem evoluir para se manterem relevantes.
Deste estudo com diferentes líderes mundiais dos mais variados setores, chamamos, ainda, a atenção para quatro tendências determinantes para o futuro dos conselhos de administração, a começar pelo papel do próprio conselho de atuar como bússola moral. Será cada vez mais necessário tomar decisões que antecipem dilemas éticos e que considerem o impacto das empresas no mundo, incorporando perspetivas diversas que vão para além do universo financeiro.
De salientar, também, que os conselhos precisam ser capazes de se transformar com agilidade para acompanhar e impulsionar o negócio. As fronteiras comerciais estão a desaparecer e as estratégias mudam a um ritmo acelerado, pelo que não se pode continuar a operar com a mesma rigidez estrutural das últimas décadas. A capacidade de adaptação dos conselhos — na sua composição, nos ciclos de renovação e nas competências que integram — será decisiva para desbloquear o crescimento das empresas. É tempo de abandonar a lógica da permanência prolongada e apostar em equipas mais diversas, com vozes que reflitam o futuro, e não apenas o passado.
A terceira tendência prende-se com a necessidade de os conselhos de administração reforçarem substancialmente o seu compromisso com a aprendizagem e o desenvolvimento, numa lógica de melhoria contínua. Isto implica garantir que todos os membros estão preparados para lidar com matérias estratégicas complexas, promover dinâmicas de trabalho mais eficazes e colaborativas, e assumir um papel ativo no desenvolvimento da equipa de liderança executiva, incluindo a preparação de uma sucessão sólida para o CEO.
Por fim, destacamos a importância de o conselho atuar como um guardião da cultura organizacional. O bem-estar, o equilíbrio e a estabilidade tornaram-se fatores centrais na motivação e retenção de talento, com impacto direto no desempenho. Os conselhos terão de assumir a responsabilidade de moldar e monitorizar a cultura organizacional, alinhando valores, práticas e comportamentos com a estratégia e objetivos de longo prazo.
A verdade é que os conselhos que não evoluírem deixarão de ser relevantes. Liderar em tempos de disrupção exige abandonar modelos estáticos e adotar uma visão dinâmica, integradora e orientada por valores. Implica antecipar, mais do que reagir; aprender continuamente, mais do que apenas supervisionar; E cultivar culturas organizacionais resilientes, mais do que simplesmente gerir resultados. Só assim será possível garantir o sucesso sustentável das organizações, e contribuir para um futuro corporativo mais responsável, equilibrado e humano.
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