Uma melhor conjuntura externa pode ser pior para Portugal?
Se a conjuntura da zona euro melhorar, o BCE pode abrandar as compras de dívida pública. E isso pode trazer juros mais altos para Portugal.
Por muito estranho que pareça o principal risco externo a médio prazo para Portugal não é um abrandamento da economia da zona euro, mas sim uma aceleração. O mercado de dívida continua bastante dependente dos programas do BCE e será a evolução da actividade económica da zona euro a ditar os próximos passos. Mais crescimento significa menos compras por parte do BCE e consequentemente taxas mais altas.
O principal risco externo de curto prazo apontado para Portugal é o eventual dowgrade do rating do ou do outlook por parte da DBRS no próximo dia 21. E o impacto que terão na elegibilidade da divida publica portuguesa nas operações do BCE.
Para esta agência de rating vai depender não só a sua avaliação sobre a evolução da economia, mas principalmente do défice e dívida pública, pelo que o Orçamento do Estado para 2017, apresentado na próxima sexta-feira, será uma componente importante dessa avaliação.
No entanto, mesmo que não haja nenhuma alteração por parte da DBRS, como parece ser o mais provável, tal não significa que os riscos desapareçam completamente. Não só os riscos internos (falta de crescimento e o elevado nível de dívida), mas também os riscos externos.
Tipicamente o principal risco advém do impacto em Portugal de uma desaceleração da zona euro por via de um menor crescimento das exportações para o principal mercado externo (representando mais de 60% do total). No entanto, por estranho que pareça, o maior risco pode advir precisamente do oposto – se o crescimento na zona euro acelerar.
Recentemente tem aumentado a especulação quanto aos próximos passos por parte do BCE. Ira manter o actual programa de compra de divida publica para lá de março do próximo ano? Irá reduzir o montante de compras mensais (80 mil milhões de euros) já, ou depois de março?
A economia da zona euro tem verificado uma expansão de perto de 0.5% por trimestre, um ritmo relativamente saudável tendo em conta o seu potencial – algo que tem ajudado a suportar as exportações portuguesas e de certa forma compensou parcialmente a queda abrupta do mercado angolano.
Tendo em conta este ritmo e o facto de não se antever uma desaceleração significativa nos próximos anos, não é de estranhar que, apesar de a inflação se manter baixa e sem grandes perspetivas de aceleração, alguns governadores do BCE comecem já a preparar o mercado para uma futura redução das compras de dívida pública.
Tendo em conta a importância dos programas do BCE para o mercado de dívida pública portuguesa, não é difícil de antever o impacto que os próximos passos terão na futura evolução as yields do mercado secundário.
Segundo um estudo publicado no Boletim de Inverno do Banco de Portugal em Dezembro de 2015, o programa de Quantitative Easing terá reduzido as yields da dívida portuguesa em cerca de 2.5 pontos percentuais. Ou seja, sem as compras do BCE, as taxas de juro a 10 anos andariam a volta de 5.5-6% no mercado secundário. Ainda relativamente longe da barreira dos 7% referida em 2010 por Teixeira dos Santos, então ministro das Finanças, mas não muito longe.
O número “mágico” será até provavelmente mais baixo atualmente, já que apesar de Portugal registar agora um menor défice publico, tem um maior nível de dívida e também um menor crescimento nominal.
O mais provável continua a ser uma expansão do programa depois de março, no entanto, dificilmente essa expansão será pelo mesmo montante durante outro ano. E, principalmente, se o crescimento europeu surpreender pela positiva e acelerar, ate será possível que haja uma redução o montante de compras depois do final do programa. E nesse cenário, o mercado português deverá ser o mais prejudicado dada a sua frágil situação económica – a titulo de exemplo, Portugal tem visto o seu prémio de risco subir ao contrário de Espanha que esta há quase um ano sem governo…
Caso o crescimento desacelere, será mais provável uma manutenção do programa atual por mais tempo, mantendo-se assim o suporte do BCE. Claro que isto implica alguma desaceleração das exportações mas o impacto no PIB será sempre mais reduzido do que no caso de um regresso das tensões ao mercado da dívida. Por isso, dada a situação atual, paradoxalmente o contexto externo pode não ser como foi no passado, o bode expiatório.
Menos crescimento na zona euro significa mais estímulos do BCE, ou até no limite mais flexibilidade orçamental para todos os países, o que pode ajudar Portugal. Mais crescimento, e alguma recuperação da inflação isso sim podem ser maiores dores de cabeça – taxas de juro acima dos 5% poderão levar muitos investidores de volta as suas folhas de Excel. E se as perspetivas de crescimento não melhorarem e o défice e a dívida não descerem rapidamente, alguns podem concluir que a dívida pública portuguesa ficará longe de ser sustentável.
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