Inaugurado no início deste ano, no escritório da tecnológica alemã trabalham mais de 100 pessoas. A tecnologia desenvolvida em Portugal é usada por 15 milhões de utilizadores.
Welcome to a no normal company. Bem-vindos a uma empresa fora do normal. As cartas são colocadas em cima da mesa assim que se entra no escritório da Xing em Matosinhos, o primeiro da empresa alemã em Portugal. O open space é cortado por enormes blocos em forma de cubo que fazem dos corredores estreitas faixas de passagem. É nos extremos laterais que tudo acontece. É que, nas ilhas de mesas e cadeiras, trabalham cerca de uma centena de pessoas de sete nacionalidades, na maior parte dos casos, programadores.
Inaugurado no início de 2019, o escritório da Xing em Portugal é um dos quartéis da tecnológica fora da Alemanha, o mercado estrela da empresa. Com 15 milhões de utilizadores no mercado alemão, a empresa anunciou no dia da apresentação em Portugal a vontade de ter pelo menos mais um em solo nacional até ao final do ano, assim como a necessidade de duplicar a equipa.
Fundada em 2003 como openBC (Open Business Contact) e contemporânea do LinkedIn, a Xing nasceu como uma espécie de lista telefónica onde os utilizadores tivessem os contactos profissionais acessíveis. Três anos depois mudava de nome e começava a política de expansão com dois vetores essenciais: por um lado e, internamente, de desenvolvimento da plataforma internamente e, por outro, criando ofertas complementares que ajudassem a fazer crescer a plataforma core.
A Xing começou na Alemanha porque, na altura, não havia nenhum sítio onde fosse possível encontrar contactos empresariais de uma “forma organizada e que fosse sustentável”. A plataforma evoluiu depois para preencher lacunas que entretanto foram identificadas no mercado alemão. “Falamos muito da inversão da pirâmide demográfica mas, na Alemanha, este é um problema gigante. Há 20 milhões de pessoas que, dentro de 10 anos, vão estar fora do mercado de trabalho na Alemanha porque já estão em idade de reforma. É brutal. O que fazemos é ter um conjunto de ferramentas que permitem às empresas encontrarem talento e, às pessoas, encontrarem oportunidades”, explica Miguel Garcia, 35 anos, diretor-geral da empresa em Portugal.
Possibilitamos espaço onde as pessoas possam estar juntas, reunir-se, fazer barulho, gritar (…) e depois que tenham os seus lugares de isolamento.
O modelo baseia-se em dois eixos fundamentais: por um lado, business to consumer, no qual os profissionais desenvolvem o perfil na Xing e podem promovê-lo, pagando por isso. Por outro, numa ótica business to business, com job posts e que funciona sobretudo para quem trabalha nos recursos humanos de uma empresa e quer difundir conteúdo sobre recrutamento. Neste sentido, é também possível às empresas gerir o perfil e ter features especiais, que passam por customizar a pesquisa, inteligência artificial para encontrar os melhores candidatos até ao acesso a eventos e iniciativas que decorrem offline, e para as quais a Xing apresenta leads altamente qualificadas feitas a partir de ferramentas de inteligência artificial e data science. “Ajudamos até na gestão da reputação online. Somos o segundo maior produtor de notícias digital da Alemanha. Conseguimos ajudar a criar uma maior brand awareness tanto para o trabalhador como para o empregador. E essas são as linhas de negócio principais na Xing”, explica Miguel.
Observando que cada vez mais existe uma fragmentação na carreira, com “cada vez mais as pessoas fazer coisas diferentes ao longo do tempo”, a ideia da Xing é ajudar as empresas e os próprios empregados a gerir essas características e mostrar isso a um empregador. “O que vamos fazer é responder a essas necessidades, observar e trabalhar com tudo o que é new work. Fragmentação, inversão da pirâmide demográfica, digitalização. Tu cada vez mais podes trabalhar para uma startup em Hiroshima, onde quiseres. Não faz sentido nenhum estares limitado. E é isso que tentamos fazer”, diz Miguel.
Dez anos depois do arranque, a empresa comprava a Kununu. “É, mal comparado, a iStore em que, basicamente, trabalhamos em employer branding”, explica Miguel. Mas, o que é que isso significa? A ideia é trabalhar com os clientes a maneira como os empregadores são vistos pelos empregados e até pelo mercado. “Fazemos isso de duas formas: uma, com reviews dos trabalhadores ou de pessoas que estiveram de alguma forma envolvidas ou trabalharam com essas empresas porque é importante ter hipótese de chegar lá e saber como é aquela empresa dentro de um conjunto de categorias. Mas, também, através do próprio empregador que tem hipótese de gerir o seu employer branding, quer seja colocando empregados a falar, promovendo iniciativas, partilhando como é trabalhar naquele sítio”, detalha o responsável.
"Existem muitas empresas a gastar muito dinheiro em supostos benefícios e as pessoas não querem saber.”
Mas na Xing, nem só se trabalha nas coisas boas que as empresas fazem. Muitas vezes, é a detetar as coisas menos boas que se conseguem melhorar os processos e, sobretudo, reter o talento. “Muitas vezes, a maior parte das vezes, tu sabes porque não estás a gostar de trabalhar em determinado lugar, mas ninguém te pergunta. O que fazemos é, com inquéritos cientificamente validados, todas as semanas ou a cada 15 dias, ir perguntando às equipas — e isto é tão granular como as empresas quiserem – como se sentem num conjunto de vetores que temos calibrados e mais do que isso, como está o seu engagement com a companhia”. Isto significa que a Xing avalia, por exemplo, qual a probabilidade, de zero a cinco, de determinada pessoa sair da empresa. E também, o que a faria ficar. “Existem muitas empresas a gastar muito dinheiro em supostos benefícios e as pessoas não querem saber”, explica Miguel.
Abrir a casa ao mundo
A aposta em Portugal não foi por acaso. “Começámos porque havia talento e identificação cultural: temos cá uma coisa que não existe em muitos sítios e que é ownership. Tenho uma sorte inacreditável com as pessoas que tenho. Na Alemanha, a malta vai embora às 6 em ponto, esteja tudo bem ou haja problemas. Aqui tens uma política de responsabilidade muito grande, por isso não queremos saber a que horas as pessoas vêm trabalhar, a que horas saem. As pessoas fazem os seus horários sabendo que as equipas têm de funcionar. Por isso temos equipas que começam a trabalhar às 7 da manhã e às 16 horas vão embora. No passado, dizia-se que para trabalhar assim tínhamos de estar na Dinamarca mas não. Só tens de encontrar uma equipa que se identifique com esses valores e te permita trabalhar assim”, explica Miguel.
Claro que na Xing nem tudo é trabalho numa mezzanine com vista para o escritório inteiro. Há momentos em que a maioria das pessoas está sentada à secretária e, outros há em que as equipas se reúnem nas salas envidraçadas que, entre as 9 e as 10 da manhã de todos os dias, estão ocupadas.
“Um dos problemas do open space é que estás sempre a ver gente, há sempre pessoas a passar à tua frente, desconcentras-te e é muito cansativo. As boxes são completamente revestidas e, se por outro lado temos muita gente, muitas vezes tens chamadas, cantos mais pequenos, onde as pessoas ficam mais isoladas. É possível ter esse equilíbrio mantendo o teu espaço”, descreve.
O escritório, muito aberto à comunidade, recebe muitas vezes visitas exteriores. Por isso também foi essencial ter um “auditório” com vista para a rua principal. E como porta direta para quem quisesse entrar. “Nós não trabalhamos para uma agência de apostas nem loja online, a nossa missão é for better working life, por isso trabalhas para uma companhia que faz com que trabalhar seja melhor em todo o mundo. É a parte boa, voltamos ao propósito. E isso é poderoso”, assinala Miguel.
O que é que as pessoas querem?
A trabalhar na área de recursos humanos, Miguel acredita que os trabalhadores valorizam cada vez menos o salário em detrimento de outros fatores na hora de procurarem ou considerarem novas oportunidades de trabalho. “Cada vez mais tem a ver com missão, com propósito e com identificares-te com o sítio onde estás. Cada vez mais”, explica o gestor, responsável pela Xing em Portugal.
O escritório de Matosinhos, onde trabalham 100 pessoas, é reflexo dessa constatação. “A cultura não é apenas o que escreves inicialmente e os valores que defines. Tem a ver com as pessoas que tens cá dentro, com quem recrutas e com o dia-a-dia. E essa é a ideia do escritório: tem coisas um bocado estranhas que só fazem sentido por causa das pessoas que temos cá dentro”, diz. Por isso, talvez não seja de estranhar que os dois corredores do escritório do norte sejam delimitados por grandes blocos em forma de cubo: por um lado, dentro deles têm pequenas salas onde até três pessoas pode estar a reunir-se ou em chamadas e, por outro, no topo, com salas quadradas e vista 360º sobre todo o escritório. “Trabalhamos em equipas e o primeiro objetivo era garantir que as pessoas podiam trabalhar em equipa”, explica Miguel. “Tens este layout que pode parecer alternativo mas que permite que as pessoas falem e facilmente se vejam umas às outras”, diz. Outra das apostas foi garantir que, conseguindo comunicar, as pessoas teriam também silêncio. “Era importantíssimo que ainda assim as pessoas ainda tivessem alguma paz de espírito e tranquilidade, por isso fizemos um grande investimento em absorção de barulhos”. A medida faz com que, com 100 pessoas no escritório, o espaço pareça tranquilo.
“Possibilitamos espaço onde as pessoas possam estar juntas, reunir-se, fazer barulho, gritar mas, mais uma vez, de uma forma que se sintam privadas e não expostas na praça pública, e depois que tenham os seus lugares de isolamento”, descreve. “Se acreditamos na digitalização e em trabalhar diferente, temos de viver isso. Como é que consegues manter a malta produtiva, consegues entregar o produto na expectativa do que é gerado lá, mas manténs a malta feliz e satisfeita aqui a trabalhar? O jardim é consequência disso”, diz.
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Xing. De Matosinhos para a concorrente do LinkedIn na Alemanha
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