Segurança Social perdeu quase quatro milhões com imóveis entregues para saldar dívidas

  • Lusa
  • 7 Dezembro 2016

Os auditores do TdC identificaram "diversas fragilidades" no inventário dos imóveis da Segurança Social, nomeadamente nos entregues para pagamento de dívidas. Só foram recuperados 2,35 milhões.

Os auditores do Tribunal de Contas (TdC) identificaram “diversas fragilidades” no inventário dos imóveis da Segurança Social, nomeadamente nos entregues para pagamento de dívidas, referindo que só foram recuperados 2,35 milhões de euros dos 6,34 milhões estimados.

De acordo com o anteprojeto de parecer do Tribunal de Contas (TdC) sobre a Conta da Segurança Social de 2015, a que a Lusa teve acesso, o valor arrecadado com os imóveis alienados e provenientes de “dação em cumprimento” (para regularização de dívidas) representou 37,1% do valor das dações.

Ou seja, estes imóveis foram entregues à Segurança Social com um valor estimado em 6,34 milhões de euros, mas o valor recuperado com a sua alienação foi de 2,35 milhões de euros, uma diferença de 3,99 milhões de euros.

O artigo 196º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social permite que a Segurança Social aceite em pagamento a dação de móveis ou imóveis, por parte do contribuinte, para extinção total ou parcial de dívida vencida.

Trata-se, segundo o TdC, de “um ato discricionário da administração, não se encontrando expresso nos despachos autorizadores das dações que tenha sido ponderado quer a utilidade dos bens para o exercício da atividade da Segurança Social, quer a possibilidade de alienação dos bens num prazo razoável e por um valor muito próximo do contratualizado para a dação, aspetos que se revelam essenciais para a aferição do interesse público dos negócios em causa, o qual passa, necessariamente, pela cobrabilidade dos valores em dívida à Segurança Social”.

Dos imóveis alienados pela Segurança Social no período em análise, 16 eram provenientes de “dações em cumprimento” efetuadas entre 1990 e 2011.

Com exceção de dois, todos os outros foram alienados por valores inferiores aos atribuídos para efeitos de dação. Salienta-se que a maior perda se verificou em três dos imóveis que integraram o património da Segurança Social em 2007, com intervenção do administrador de insolvência, aos quais foi atribuído o valor de 3,49 milhões e o valor da alienação foi de 464 mil euros, o que representa uma recuperação de apenas 13,3%”, referiu o TdC.

No entanto, o TdC encontrou também casos de imóveis cujo valor da alienação “ultrapassou largamente o valor de registo do imóvel em termos brutos, e, consequentemente, originou mais-valias, situação que decorre do facto de se tratar de imóveis já muito antigos e com valores de registo muito diminutos”.

Dos imóveis analisados pelos auditortes do TdC, dez foram alienados por concurso público e 18 por procedimento de ajuste direto.

Todos os que foram alienados por concurso público conseguiram um valor superior ao preço base de licitação, enquanto nos ajustes diretos apenas três ultrapassaram o valor do preço base.

O TdC verificou ainda que, em 2015, o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS) transferiu imóveis para o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), Câmaras Municipais e Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) e encontrou divergências entre os imóveis alvo de registo de abate contabilístico e as listas que integraram os “acordos de transferência” e “autos de cessão de bens”.

“Dos 30 imóveis que integraram a amostra verificou-se que nove não foram objeto de registo de abate contabilístico, o que corresponde a uma margem de erro de 30%“, lê-se no documento.

O TdC queixou-se ainda de que não foi possível confirmar integralmente os valores dos imóveis relevados nas demonstrações financeiras em 31 de dezembro de 2015, porque não lhe foram remetidos documentos de suporte àquele registo.

Referiu, nomeadamente, que relativamente aos imóveis integrados no património do IGFSS por via de extinção de organismos ou por transferências do Instituto de Segurança Social (ISS), não foram remetidos documentos que comprovassem a integralidade do volume financeiro registado, pois num total de valores relevados no ativo bruto de 3,44 milhões de euros, apenas foi possível confirmar 802 mil euros (23,3%).

Segundo o TdC, continuam a existir imóveis relevados nas demonstrações financeiras da Segurança Social que ainda não têm a titularidade registada a favor do IGFSS.

Fonte oficial do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS) disse à Lusa que as situações identificadas pelo TdC resultam, em grande medida, do processo de transferência de património do ISS para o IGFSS.

“O IGFSS, I.P. está a proceder à regularização das situações identificadas, tendo sido recentemente dado início a um trabalho conjunto com o ISS, I.P. relativo aos imóveis cujo inventário carece de atualização”, referiu a fonte.

No que respeita à dação em pagamento, esclareceu, “não têm sido autorizadas dações de património para pagamento de dívidas, sendo que as vendas se referem a dações de períodos anteriores”.

A redação final do parecer do Tribunal de Contas terá de ter, sempre, em conta as alegações das partes interessadas e, por isso, as conclusões podem vir a ser diversas das agora anunciadas. Fonte oficial do Tribunal de Contas acrescentou ainda que “o parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta Geral do Estado e da Segurança Social é aprovado pelo Plenário Geral e que não existe nenhum parecer aprovado pelo Tribunal de Contas sobre essa matéria relativamente à gerência de 2015”.

Passivo de 160 mil euros por incumprimento de duas IPSS

Os auditores do Tribunal de Contas (TdC) detetou ainda na Conta da Segurança Social um passivo de 160 mil euros relativo a uma garantia bancária acionada por incumprimento de duas instituições de solidariedade, decorrendo um processo no Ministério Público para recuperação do crédito.

Na despesa com passivos financeiros foi encontrado o valor executado de 160.277,78 euros relativo a garantias bancárias que foram acionadas pelo Montepio Geral na sequência do incumprimento de duas Instituições Privadas de Solidariedade Social (IPSS) que beneficiaram de empréstimos, no âmbito duas linhas de crédito de apoio à economia social.

Segundo informação prestada ao TdC pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS), os valores executados representam a liquidação integral do empréstimo pela Caixa Económica Montepio Geral (CEMG).

Pelo incumprimento do Lar de Santa Ana a garantia foi executada em 58.921,41 euros e o respetivo processo encontra-se no Ministério Público com vista à recuperação do crédito.

Pelo incumprimento da Associação Desenvolvimento Integrado de Poiares a garantia foi executada em 101.356,37 euros, tendo já sido liquidadas 17 prestações pela instituição, a quem foi aprovado um Plano Especial de Revitalização (PER).

Em 2012, foram assinados dois protocolos entre o Ministério do Trabalho da Solidariedade e Segurança Social (MTSSS), a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS), a União das Misericórdias (UM), a União das Mutualidades Portuguesas (UMP) e a Caixa Económica Montepio Geral, com o objetivo de apoiar a atividade das entidades do setor social através da criação de duas linhas de crédito, uma no valor de 50 milhões de euros e outra no valor de 12,5 milhões de euros.

As linhas de crédito destinavam-se a IPSS, Misericórdias, Fundações, Mutualidades e Centros Sociais das Igrejas que efetuassem investimentos para reforço da sua atividade dentro das suas áreas de intervenção ou em novas áreas, modernização de serviços prestados à comunidade ou modernização da sua gestão.

Estas linhas de crédito, no valor total de 62,5 milhões de euros, encontram-se garantidas pelo MTSSS, que, através do IGFSS, efetuou dois depósitos bancários na CEMG, em condições de mercado, no mesmo valor.

Os depósitos mantêm-se enquanto vigorar algum dos empréstimos concedidos, no prazo máximo de 7 anos, estando a CEMG autorizada a debitar total ou parcialmente as contas de depósito, em caso de mora ou incumprimento de qualquer um dos contratos de empréstimo.

Com o passar do tempo e as amortizações dos empréstimos, os depósitos de garantia vão sendo reduzidos mensalmente e proporcionalmente.

Nas situações identificadas pelo TdC, o IGFSS “acionou diligências no sentido de recuperar esses créditos para o valor de cerca de 160 mil euros, por incumprimento de duas instituições sociais”, disse fonte oficial do ministério tutelado por Vieira da Silva.

Para o valor de 101 mil euros, por sua vez, foi aprovado um plano de prestacional que já se encontra regularizado. O remanescente, no valor de 59 mil euros, foi elaborado processo e remetido ao Ministério Público no sentido da sua recuperação, explicou à Lusa.

A Segurança Social encontra-se a acompanhar as entidades envolvidas.

Notícia atualizada com reação do Tribunal de Contas

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