Merkel ou Schulz? O que vai mudar para a União Europeia

  • Juliana Nogueira Santos
  • 23 Setembro 2017

Sendo a Alemanha um dos países com mais peso nas decisões europeias, até que ponto um novo chanceler pode ditar um novo rumo para a União Europeia?

Neste domingo, não é só o destino da Alemanha que vai a votos, mas também o da União Europeia.Krisztian Bocsi/Bloomberg

Ainda que as sondagens não deixem quaisquer dúvidas sobre quem vai ocupar (ou reocupar) o lugar de chanceler da Alemanha, são as cores que vão compor a coligação que vão trazer mais novidades. Para entrar na chancelaria, é necessária uma maioria absoluta, algo que não acontece a nenhum partido desde 1957. Assim, para além ser esta união de partidos que vai ditar as políticas seguidas no país nos próximos quatro anos, é também a visão europeísta — ou a falta dela — que poderá ditar o destino da União Europeia.

Com um PIB de 3,1 biliões de euros em 2016, uma das taxas de desemprego mais baixas da União Europeia e níveis de produtividade no pólo contrário, a Alemanha é uma das maiores economias da zona euro, o que faz com que esta tenha um papel preponderante no destino da União Europeia. Assim aconteceu em vários momentos decisivos dos últimos anos: nos resgates financeiros de alguns dos estados-membros, no divórcio com o Reino Unido, na crise dos refugiados, entre outras.

Angela Merkel e a sua equipa marcaram, com pulso firme, a posição da Alemanha em relação a estes assuntos, não querendo abdicar da estabilidade económica do seu país em detrimento da saúde da união. Pelo contrário, e sendo ele um homem da Europa, o seu principal concorrente, Martin Schulz, quer uma Alemanha europeia e uma União ainda mais forte.

Por entre novas entradas, cooperação entre países e o ponto de rutura entre europeísmo e nacionalismo, qual vai ser o impacto da eleição do novo chanceler para o rumo da União Europeia?

Turquia, o tema surpresa da campanha

A integração da Turquia na União Europeia foi o tema inesperado do único debate televisivo que pôs frente a frente Angela Merkel e Martin Schulz, mas foi também um dos assuntos fraturantes da campanha. Desde 1987 que o país se tem tentado juntar aos seus vizinhos e integrar a União Europeia, mas este este processo não tem sido aceite pela maioria dos estados-membros.

É o caso da Alemanha, que sempre defendeu que o país deve primeiro cumprir os mínimos no que diz respeito à democracia e aos direitos humanos para aí se pensar em alargar os 28 a 29. Ainda assim, no seio político alemão existem várias correntes de pensamento, que podem ser representadas pelos dois candidatos principais. Enquanto a candidata da aliança CDU/CSU defende uma abordagem mais transitória, favorável à suspensão das discussões em relação à adesão, mas sem quebrar as ligações comerciais abruptamente, Schulz garante pulso firme e diz que, se necessário, esta quebra é instantânea.

O candidato social-democrata à chancelaria utiliza a sua conta oficial do Twitter para expor as suas opiniões. Neste tweet, Schulz deixa um aviso à Turquia e à União Europeia: “Se Erdogan não liberta os prisioneiros alemães, a UE deve terminar as negociações com a Turquia sobre o alargamento da união aduaneira”, ou seja, as negociações para a entrada na zona de livre comércio.

Uma união mais forte

Embora tenham surgido na campanha alguns ideais antieuropeístas, defendidos principalmente pelo partido de extrema-direita AfD, nenhum dos outros protagonistas põe sequer em questão a saída da zona euro ou da União Europeia. Contudo, a aliança CDU/CSU tem um conceito muito próprio para união. Para o partido de Merkel, está estabelecido que as regras que foram definidas em conjunto têm de ser respeitadas, não havendo espaço para flexibilidade.

Assim aconteceu quando vários países europeus entraram em recessão, como foi o caso da Grécia e de Portugal, e que quiseram ver as suas dívidas aliviadas. Como um dos principais credores, a Alemanha de Merkel sempre se mostrou intransigente a alívios ou benefícios. Ferramentas como a mutualização da dívida também são deixadas de parte.

Uma apoiante do SPD segura um cartaz onde se pode ler “Juntos pela Europa”.Jasper Juinen/Bloomberg

Por outro lado, e apelando aos valores de esquerda que o constituem como partido de centro-esquerda, o SPD apresenta uma proposta em que a aproximação à União Europeia se estabelece como uma das principais bandeira, havendo uma partilha de competências mais alargada. Inclui a criação de um orçamento, um parlamento e um ministro comuns para a zona euro e uma maior coordenação de políticas entre países.

O assunto em que os dois principais partidos divergem totalmente é aquele que diz respeito às regras orçamentais, com o partido liderado por Martin Schulz a defender uma maior flexibilidade e relaxamento destas, principalmente quando se fala em compromissos entre estados-membros.

No entanto, o consenso entre os dois candidatos é possível em dois aspetos: na criação de Fundo Monetário Europeu e na aproximação com a vizinha França. O Fundo Monetário Europeu teria como objetivo intervir em caso de crise antes do Fundo Monetário Internacional; seria uma evolução do atual Mecanismo Europeu de Estabilidade.

Reforçar a aliança com França

E se Schulz garante uma aproximação com todos os estados-membros da União Europeia, Angela Merkel tem apenas um na mira: França. Desde que Emmanuel Macron conquistou a presidência do país vizinho, que a Alemanha se tem aproximado. Com os dois governantes a juntarem forças em assuntos como as sanções à Coreia do Norte, a segurança europeia ou o, já falado, Fundo Monetário Europeu, mas a divergirem noutros assuntos.

Apoiantes de Angela Merkel esperam pela chegada da chanceler. Um deles segura um cartaz onde, carinhosamente, a trata por “Angie”. Krisztian Bocsi/Bloomberg

Assim, o manifesto da CDU/CSU fala abertamente sobre a resolução destas divergências, considerando que o partido está “pronto para desenvolver gradualmente a zona euro com o novo governo francês”. Criar-se-ia assim uma aliança das duas maiores economias europeias. Essa aproximação será ainda mais natural se for Schulz a entrar na chancelaria. Os ideais do antigo presidente do Parlamento Europeu estão ainda mais em linha com os do presidente de França, na medida em que ambos defendem uma partilha federal de competências mais ampla.

Solidariedade para além fronteiras

A Alemanha foi um dos países que recebeu mais refugiados aquando das crises políticas e sociais no norte de África. O país aumentou em 1% a sua população desde que os requerentes de asilo começaram a chegar, em 2015. No entanto, este não é um assunto que merecerá diferentes abordagens se for a CDU/CSU ou o SPD a ganhar. Os dois candidatos consideram que as fronteiras não podem ser fechadas a quem foge da guerra.

Este será então um dos tópicos em que, mais uma vez, a palavra dos alemães se conseguirá sobrepor à dos outros países que defendem um controlo fronteiriço mais restrito. Se a Alemanha disser não a isso, com certeza que grande parte da Europa acatará. É esse o poder do país na União Europeia.

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