Anita chegou ao Parlamento. Metáfora de Centeno faz escola

As histórias da Anita têm mais de 50 anos e hoje ganharam novos volumes. A Anita chegou ao Parlamento e foi andar de comboio no Alentejo, mudou regras, foi aos fundos e está em risco de ir ao fundo.

“O investimento não é como o ‘Anita vai às compras’. Não vamos com o Pantufa, com um cesto, comprar investimento”. A frase é do ministro das Finanças em entrevista ao Público (acesso condicionado). Mário Centeno referia-se às dificuldade em pôr o investimento público no terreno, porque primeiro é necessário lançar concursos públicos que, por vezes, “ficam desertos”, reconheceu o ministro. O mote foi lançado e o imaginário da Anita invadiu o debate político nacional.

Esta terça-feira o ministro do Planeamento esteve na Comissão de Economia, Inovação e Obras Públicas e foi de braço dado com a Anita. Ao longo das quatro horas que durou a audição, a Anita foi ao Alentejo, andou de comboio, foi aos fundos e esteve em risco de ir ao fundo. As bancadas da direita usaram e abusaram da metáfora e o ministro Nelson Souza também não se coibiu de responder.

“O senhor ministro passou pela questão do investimento como cão por vinha vindimada. É grave. O senhor ministro diz que está tudo bem nos fundos e só me lembra aquela velha série da Anita: a Anita vai aos fundos, a Anita vai ao investimento público”, ironizou o deputado centrista Pedro Mota Soares. “Estou a usar uma expressão que, neste momento, faz parte do léxico socialista e que penso que o senhor ministro tem facilidade de apreender”, acrescentou, numa referência velada à entrevista de Mário Centeno.

O senhor ministro diz que está tudo bem nos fundos e só me lembra aquela velha série da Anita: a Anita vai aos fundos, a Anita vai ao investimento público.

Pedro Mota Soares

Deputado do CDS

Mas Mota Soares foi mais além. Criticando o facto de o Executivo fazer a comparação da execução dos fundos europeus apenas entre os países com envelopes financeiros superiores a sete mil milhões de euros e não entre todos, como era feito até 2016 — “em maio de 2016 Portugal era o país que mais fundos tinha recebido da UE e agora é o sétimo”, frisou o deputado do CDS –, disse que o Governo fazia lembrar “a Anita não gosta das regras, a Anita não gosta do resultado do jogo, a Anita muda as regras as meio do jogo”.

Nelson Souza respondeu ao deputado Mota Soares criticando as “testemunhas” que encontrou “para a sua tese e para sua leitura”. “Apresentou-se a tribunal como testemunha de si próprio, acompanhado do Polígrafo. Do meu lado, a semana passada, não pedi a ninguém que testemunhasse a meu favor, mas apareceram no espaço mediático duas testemunhas: a Comissão Europeia, que não põe lá os países todos, mas por acaso faz a segmentação com o mesmo critério que nós utilizamos; e o Banco de Portugal, que apresenta o mesmo gráfico, mas com outro critério. Não tem nada a ver com a dimensão do pacote, mas com o peso dos fundos no PIB, mas por acaso até chega ao mesmo resultado: Portugal está na frente”, sublinhou o ministro apresentando um dos gráficos de pernas para o ar. Depressa corrigiu e gracejou que era só “para baralhar”.

Como vê a Anita passou a estar, a partir da semana passada, bem acompanhada“, concluiu o ministro do Planeamento.

Como vê a Anita passou a estar, a partir da semana passada, bem acompanhada.

Nelson Souza

Ministro do Planeamento

Mas o deputado Mota Soares voltou à carga pedindo ao ministro Nelson Souza que revelasse os níveis de cativação a que o seu ministério está sujeito. Isto porque, apesar de já ser abril ainda não é conhecido o decreto de execução orçamental. Neste está definido o nível de cativações que vão afetar os ministérios nomeadamente aqueles que gerem fundos comunitários e que poderão ver assim comprometida a sua capacidade de fazer face à contrapartida nacional dos investimentos apoiados pelos fundos. “Qual o nível de cativações no seu ministério? O senhor ministro já sabe, mas não responde. Anita que já sabe, Anita que responda senão estaria a faltar aos seus deveres perante o Parlamento”, disse o deputado centrista.

“Isso é grave e nós não aceitamos”, frisou. Mas teve de aceitar porque o ministro se recusou a avançar essa informação já que ela é da competência do ministro das Finanças.

Agarrando no mote, o deputado do PSD, António Costa e Silva, questionou: “A Anita vai aos fundos e à maravilhosa execução e o que é que ela encontra à sua volta? Quando mostram o gráfico à Anita o que lhe tentam dizer é que a pior curvinha de todas” não é a pior. Com os deputados do PS a contrapor que se tratam de projeções e não da execução efetiva, António Costa e Silva atirou: “ó senhor deputado eu sou cegueta, mas não sou daltónico. A corzinha não engana. Estão sistematicamente a tentar demonstrar que 33% de execução é mais do que 39% e estou a juntar o Feader, senão era 29%. A execução é péssima. É a pior de sempre e não é só o Banco de Portugal que o diz”, rematou o deputado do PSD.

O PS respondeu com outro conto infantil: “Usando a fantasia do PSD, o Gastão não sabe ler gráficos”, atirou o deputado Carlos Pereira.

Mas António Costa e Silva resolveu acrescentar mais dois volumes à coleção da Anita. “A Anita quando vai ao Alentejo e vai ao meu distrito o que vê?”, questionou. “O parque de ciência e tecnologia que era para ter continuado e zero; em termos de equipamentos de saúde, a promessa de um novo hospital e nada, nem um centro de saúde arranjado; e nas escolas não vê projeto de obra ser feito.”

A Anita quando vai ao Alentejo não vê nem um equipamento social.

António Costa e Silva

Deputado do PSD

“A Anita quando vai ao Alentejo não vê nem um equipamento social”, remata.

Na versão original a Anita andou de avião, de paquete, bicicleta, de balão e de comboio. Mas António Costa e Silva decidiu reescrever esta história com mais de 50 anos. “A Anita quando anda de comboio no Alentejo, o comboio avaria. A Anita quando anda de comboio no Alentejo, o comboio chega sempre atrasado. A Anita quando anda de comboio no Alentejo, paga muito. Para ir um dia a Lisboa e voltar paga mais do que o passe de Lisboa”. O deputado do PSD frisa que é isso que o executivo tenta “esconder com a fantasia da ‘Anita vai às Compras'”.

E em jeito de conclusão remata: “A Anita quando vai aos fundos, se não tivermos atenção vai ao fundo”.

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