Schroders: Lagarde vai apoiar tanto ações como dívida, mas retornos serão limitados
A aliança entre política monetária e orçamental será o segredo para o sucesso da Europa nos próximos anos. A gestora de ativos alerta, no entanto, não se podem esperar ganhos como antes da crise.
Quem preferiu Estados Unidos à Zona Euro nos últimos meses conseguiu melhores retornos dos seus investimentos. Mas a tendência pode estar próxima do fim. É esta a convicção da gestora de ativos Schroders, que vê maior potencial de “surpresas positivas” nos mercados da moeda única. E o Banco Central Europeu (BCE), sob a liderança da nova presidente Christine Lagarde, vai ajudar.
“A Europa tem sido preterida pelos investidores. Não é surpresa que tenha vivido tempos difíceis”, diz Nicholette MacDonald-Brown, líder da equipa de ações europeias da Schroders, que tem atualmente 496,6 mil milhões de euros sob gestão, numa conferência com jornalistas, em Londres. “Os mercados têm-se focado no curto prazo. Não querem saber o que vai acontecer nos próximos dois anos, mas apenas na próxima época de resultados. Tem sido difícil tirar daí valor”.
A guerra comercial e o Brexit têm sido — e continuarão a ser — os grandes temas a influenciar os mercados na Europa. Em simultâneo, os investidores parecem ignorar cada vez mais os ciclos eleitorais, enquanto a política monetária reforçou, desde a crise, o impacto que tem tido nos investimentos.
Fevereiro de 2019 foi o pior mês desde janeiro de 2008
Além destes fatores, os últimos meses foram pautados por receios de uma recessão global. “O mercado já praticamente incorporou uma recessão europeia pelo que não temos de nos preocupar tanto“, afirmou MacDonald-Brown, que considera que “é um risco maior para a Europa que haja uma recessão nos EUA do que na própria Europa”.
Do lado dos EUA — que vivem o maior ciclo de crescimento económico de sempre –, há menos espaço para atuar, tendo em conta que o presidente Donald Trump implementou um mega programa de estímulos fiscais para manter a economia a expandir. Apesar de alertar que “não se deve subestimar a vontade de Trump de ter um mercado acionista forte”, a gestora sublinha: “Quando se olha para o potencial de surpresas positivas, está a transitar mais para a Europa. A Europa está a parecer cada vez mais interessante”.
Finanças ajudam o BCE?
Foi neste cenário, de incerteza externa, que Lagarde chegou ao BCE, no início de novembro. O caminho já estava traçado: taxas de juro em mínimos históricos e o relançamento do programa de compra de ativos. A expectativa é, assim, que não tenha grande margem para mudanças nestes instrumentos. Mas a Schroders espera mudanças.
“Estamos num claro momento de mudança e vai ser interessante ver como ela [Lagarde] responde a isso”, afirmou a gestora. A francesa abraçou o discurso do antecessor Mario Draghi sobre a necessidade de os países da Zona Euro colaborarem com a política monetária e, ainda antes de assumir o cargo, já dizia a Estados-membros com excedente orçamental que é preciso usá-los para estimular a economia.
“Claramente há muito debate sobre cooperação entre política monetária e orçamental e penso que haverá algum tipo de trabalho em parceria“, explicou MacDonald-Brown, que acredita que será este o segredo para o sucesso de Lagarde: não ter de fazer nada ela própria, mas sim usar as suas armas políticas para incentivar os Estados a fazê-lo. “Não quer dizer que a política monetária perca destaque. A política monetária vai manter-se substancialmente acomodatícia e apoiar tanto o mercado acionista como obrigacionista“, sublinhou.
Menos otimista quanto à cooperação entre BCE e ministérios das Finanças do euro está Azad Zangana, economista e estratega sénior para a Europa da Schroders. “O BCE já não tem instrumentos para impulsionar o crescimento e a inflação e agora precisa que a política orçamental tome o controlo, mas os ministros das Finanças têm outras preocupações de longo prazo como a degradação da demografia”, alertou.
"Em terreno acionista, temos de trabalhar muito para ter retornos. No mercado obrigacionista, é ainda mais dramático. Não seria um problema se os investidores não estivessem a imaginar que esse nível de retornos ainda existe.”
Retornos não são o que eram
Com maior ou menor impulso orçamental, certo é que o BCE irá manter uma mão forte no mercados. Por um lado, enquanto grande comprador de dívida pública, o que tem levado a uma forte quebra nas yields (incluindo em Portugal, cuja dívida a dez anos tem um juro próximo de 0,2%). Cerca de 30% da dívida global (ou 17 biliões de euros) tem mesmo juro negativo. Por outro, o baixo custo do dinheiro pressiona os retornos de todos os ativos, com os investidores a serem atirados para maior risco.
As projeções da Schroders é que as obrigações soberanas da Zona Euro gerem um retorno de apenas 0,2% nos próximos dez anos, em comparação com os 5,8% da década anterior. Já no caso dos EUA, a estimativa é que o juro da dívida se situe em 1,9% até 2028, contra os anteriores 4,2%.
Juros das dívidas não recuperam na próxima década
Já no que diz respeito ao mercado acionista, a dificuldade em conseguir ganhos não é tão grande, mas a expectativa também é de descidas nas taxas. Para a Zona Euro, a Schroders antecipa que as ações gerem 4,1% na próxima década (face a 10,8% na última) e nos EUA que rendam 6% (abaixo dos 14,7% até 2019). A exceção são os mercados emergentes, onde a gestora espera retornos de 9%, acima dos 8,2% da década anterior.
“Em terreno acionista, temos de trabalhar muito para ter retornos. No mercado obrigacionista, é ainda mais dramático“, explicou Charles Prideaux, diretor global de investimentos da Schroders. “Não seria um problema se os investidores não estivessem a imaginar que esse nível de retornos ainda existe. Teremos todos de trabalhar mais para cumprir essas expectativas”, afirmou, admitindo que “ninguém pode esperar um retorno igual ao anterior à crise“.
(A jornalista viajou a convite da Schroders)
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