Confinamento de 2021 tem menos impacto na economia

Até ao momento, os dados económicos apontam para uma contração do PIB no primeiro trimestre de 2021 significativamente inferior à do segundo trimestre de 2020, período do primeiro confinamento.

No primeiro trimestre deste ano, Portugal completará pelo menos dois meses de confinamento severo. No segundo trimestre de 2020, o primeiro confinamento durou apenas um mês (abril), tendo arrancado depois o desconfinamento gradual em maio e junho. Apesar de durar mais agora do que há um ano, o impacto económico deve ser, na realidade, cerca de metade. É isso que mostram os dados económicos e as previsões disponíveis até ao momento.

Um ano depois da chegada da Covid-19 a Portugal, já há indicadores de elevada frequência criados especificamente para a crise pandémica que nos permitem tirar conclusões sobre o andamento da economia semana a semana, bem antes da divulgação preliminar do PIB por parte do Instituto Nacional de Estatística (INE), a qual acontece um mês após o fim do trimestre em causa. Esses indicadores são o do Banco de Portugal — com base em dados como os do multibanco e o tráfego — e o da OCDE, que se baseia num algoritmo e nas pesquisas no Google.

Os valores para janeiro e fevereiro destes indicadores estão mais próximos do comportamento do PIB no quarto trimestre de 2020 — em que o PIB cresceu 0,2% face ao terceiro trimestre (melhor do que todas as previsões) — do que com o desempenho no segundo trimestre do ano passado, período em que o PIB contraiu cerca de 14% em cadeia. Os gráficos com a evolução dos dois indicadores mostram bem a diferença.

Fonte: Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE).

No caso do indicador da OCDE, este aponta para uma contração do PIB de 7,5% em cadeia e de 9,4% em termos homólogos no primeiro trimestre. No caso do Banco de Portugal, esses valores não é revelado, mas segundo contas do Fórum para a Competitividade (com base nos valores até 21 de fevereiro) o indicador aponta para uma quebra de 1% em cadeia e de 4,5% em termos homólogos. O valor final dependerá da evolução da economia em março, mas para já tudo indica que a contração será “cerca de metade” da do ano passado, confirma o economista Pedro Braz Teixeira ao ECO.

Fonte: Banco de Portugal.

“Apesar de os indicadores sinalizarem, em geral, quedas maiores do que no 4º trimestre, a dimensão atual dessas quedas não chega aos valores registados em março e abril passados“, diz ao ECO António da Ascenção da Costa, do ISEG, evitando, porém, “arriscar” uma quantificação. João Borges da Assunção, da Católica, concorda que “é ainda cedo para avançar com uma estimativa quantitativa dessa quebra“, temendo que “o confinamento severo e a eternização dos estados de emergência venham a criar ‘mossa’ significativa na atividade económica pela sua dimensão e transversalidade”.

É ainda preciso ressalvar que há um efeito parcial de comparação: o segundo trimestre de 2020 comparou com níveis mais elevados de atividade económica, tanto em cadeia como em termos homólogos, do que o primeiro trimestre de 2021 que já está a comparar com trimestres afetados pela pandemia, como é o caso do primeiro trimestre de 2020 em que já se registou uma pequena contração do PIB (2,2% em termos homólogos e 3,9% em cadeia).

Além dos indicadores avançados, há outros dados que já foram divulgados e mostram que a quebra não está a ser tão grande quanto no ano passado. Em fevereiro, as vendas de carros caem 59% em fevereiro ao passo que tinham caído 85% em abril de 2020, sendo que ambos os períodos os stands estavam de porta fechada. O inquérito do INE/BdP mostrou que 67% das empresas registaram um volume de negócios, na primeira quinzena de fevereiro, “igual ou superior” ao registado durante o primeiro confinamento (primeira quinzena de abril de 2020). Além disso, 92% das empresas estavam em produção ou funcionamento, mesmo que parcialmente, o que compara com 82% no confinamento anterior.

Adaptação das empresas e consumidores explica menor impacto

Ainda assim, o que explica esta diferença de desempenho do PIB entre dois confinamentos restritivos? Tal como explicaram vários economistas ao ECO logo no início de janeiro, a palavra-chave é “adaptação“: as empresas e os consumidores estão mais adaptados à nova realidade (com o comércio online, por exemplo) e já sabem que a situação é temporária. O impacto será negativo, claro, e até pior do que o das restrições do quarto trimestre, mas não tão grave quanto o do primeiro confinamento.

Desde logo, há uma questão puramente matemática: o PIB já caiu bastante em 2020 pelo que o ponto de partida é mais baixo, nomeadamente no caso do turismo que dificilmente irá contribuir para mais quedas significativas do PIB. Acresce que os apoios do Estado, como o do lay-off simplificado, já estão no terreno, evitando-se os atrasos do ano passado. Há ainda a confiança de que o processo de vacinação está em curso, perspetivando-se uma retoma mais forte com o desconfinamento.

Porém, também há fatores em sentido contrário, como o facto de as empresas terem menos margem para aguentar novos choques à medida que o tempo passa e a situação financeira dos próprios cidadãos estão mais desgastados com a situação. E mesmo que o PIB possa mostrar uma maior resiliência, tal não quer dizer que a economia sofra, nomeadamente o mercado de trabalho. Os dados de janeiro já mostraram uma redução muito significativa da população empregada no primeiro mês do ano e o número de beneficiários do subsídio de desemprego aumentou 37% em janeiro, na comparação homóloga).

“Apesar das medidas de apoio ao emprego serem um importante instrumento de suporte ao mercado de trabalho, estima-se que o agravamento da situação pandémica no início de 2021, o lento processo de vacinação e a incerteza quanto à capacidade das empresas em relançar a sua atividade no pós confinamento marquem as perspetivas para 2021”, antecipa o BPI, concluindo que prevê “um aumento da taxa de desemprego na segunda metade do ano, após o fim das medidas de apoio ao emprego“.

Previsões confirmam dados dos indicadores de alta frequência

As previsões de várias instituições para o primeiro trimestre confirmam esta expectativa. Em fevereiro, na atualização das suas previsões económicas, a Comissão Europeia estimou que a economia portuguesa irá contrair 2,1% em cadeia no primeiro trimestre, o que a confirmar-se será a maior queda entre os Estados-membros da União Europeia. Essa quebra compara com uma contração de 0,8% em cadeia do PIB da UE e de 0,9% no caso da Zona Euro.

Já o Fórum para a Competitividade está mais pessimista ao prever uma queda em cadeia entre 3% a 6%, o que é compatível com uma contração homóloga entre 5,5% e 8,5%. O Fórum explicou esta previsão com “o confinamento muito mais estrito que entrou em vigor a 16 de janeiro, e que deverá durar até ao final do 1.º trimestre”, o qual “deverá ter um claro efeito recessivo, como o próprio Governo reconhece”. A expectativa do Fórum para a Competitividade é que o impacto deste novo confinamento seja maior nos serviços do que na indústria e construção, uma tendência que se tem verificado desde o início da pandemia.

O BPI está também certo de que no primeiro trimestre “a economia voltará, muito provavelmente, a registar contração, refletindo o retorno de medidas de confinamento muito restritivas”. Porém, “a informação disponível até à data indica que será uma queda relativamente moderada, sobretudo quando comparada com a registada no segundo trimestre de 2020“, confirma a equipa de research do banco.

No início de fevereiro, na expectativa de que o confinamento fosse de apenas um mês, os economistas do Montepio apontam para uma contração do PIB em cadeia de 4,3%, apesar de alertarem para a “elevada incerteza”. “Os riscos descendentes decorrem da futura evolução da crise pandémica (…) e da possível necessidade de reforço do confinamento, tanto em termos de severidade das medidas adotadas, como em termos de duração do confinamento”, explicavam.

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Trabalhadores que estiveram em lay-off têm de declarar complemento de estabilização no IRS

Os trabalhadores que estiveram em lay-off na primavera de 2020 tiveram direito ao complemento de estabilização, que deve agora ser declarado no IRS, explica o Fisco ao ECO.

Os trabalhadores que, por terem estado, pelo menos, 30 dias em lay-off, receberam o complemento de estabilização, no verão do ano passado, vão ter agora de o incluir na declaração anual de IRS. A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) explicou ao ECO que não está em causa um “apoio social”, o que significa que os valores recebidos por esta via estão sujeitos a tributação em sede de IRS, sendo considerados rendimentos de categoria A (fruto de trabalho dependente).

O complemento de estabilização foi criado com o objetivo de dar apoio aos trabalhadores que sofreram cortes nos seus rendimentos em resultado da pandemia, tendo sido atribuído, no verão do ano passado, pela Segurança Social aos trabalhadores que estiveram em lay-off (clássico ou simplificado) por, pelo menos, 30 dias, entre abril e junho, e cuja remuneração-base não fosse superior ao valor de 1.270 euros, em fevereiro de 2020.

Esta prestação não esteve sujeita a qualquer requerimento, isto é, foi paga de forma automática e oficiosa pela Segurança Social, por transferência bancária. O apoio correspondeu à diferença entre a remuneração-base declarada em fevereiro de 2020 e a declarada nos 30 dias em que o trabalhador esteve em lay-off. Isto com o mínimo de 100 euros e o máximo de 351 euros.

De acordo com o Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) do Ministério do Trabalho (MTSSS), 353.296 trabalhadores receberam o complemento em causa.

Com o aproximar da campanha de IRS relativa aos rendimentos recebidos em 2020, o ECO foi perceber junto de fiscalistas se este complemento deverá ou não ser declarado, tendo encontrado respostas díspares.

Por exemplo, Ernesto Pinto, fiscalista da DECO, explicou que, uma vez que o apoio foi pago diretamente ao contribuinte, a interpretação possível é a de que esses valores não estão sujeitos a IRS. Já o fiscalista Rogério Fernandes Ferreira defendeu que, “não havendo isenção ou exclusão de imposto expressa, o apoio em causa deverá ser considerado rendimento de trabalho dependente e tributado no âmbito da categoria A do IRS“.

Perante a falta de uma interpretação consensual, o ECO questionou a Autoridade Tributária, que esclareceu que o complemento de estabilização está efetivamente sujeito a tributação em sede de IRS. Ou seja, tem mesmo de ser incluído na declaração anual que os contribuintes deverão apresentar entre abril e junho.

“O complemento de estabilização, enquanto apoio financeiro extraordinário, concedido no âmbito da situação pandémica devido à Covid-19, está sujeito a tributação em sede de IRS, sujeito a retenção na fonte nos termos gerais, sendo que não há lugar a retenção na fonte quando os rendimentos, em termos gerais, sejam de valor igual ou inferior a 659 euros”, frisa o Fisco. Isto é, uma vez que o valor máximo do complemento ficou abaixo dos 659 euros, não houve lugar a retenção na fonte, mas deverá agora ser incluído na declaração anual.

O Fisco salienta que não pode, contudo, haver lugar a imposto “caso se verifique o mínimo de existência” — que foi reforçado em 100 euros, no Orçamento do Estado, para 9.315,01 euros — e explica que este complemento, “sendo considerado rendimento do trabalho dependente”, deve ser declarado pela entidade pagadora, “utilizando os códigos já existentes”.

A Autoridade Tributária detalha: “O legislador não considerou esta medida como ‘apoio social’, porque não se confunde com as prestações sociais atribuídas pela Segurança Social, as quais visam garantir o pagamento de prestações pecuniárias substitutivas de rendimentos do trabalho perdido em consequência da verificação das eventualidades legalmente definidas em que não se inclui este apoio”. O Fisco justifica deste modo a decisão de sujeitar o complemento de estabilização a IRS, ao contrário do que acontece, por exemplo, com o subsídio de desemprego.

Aliás, de acordo com um ofício-circulado da Autoridade Tributária, todos os apoios concedidos aos trabalhadores por conta de outrem no âmbito das medidas extraordinárias devem ser considerados rendimentos de trabalho dependente, estando sujeitos a tributação. É o caso, por exemplo, do apoio à família e do lay-off. A dúvida relativa ao complemento de estabilização prendia-se com o facto de, ao contrário dos demais, este ter sido pago diretamente ao trabalhador, mas o Fisco garante que o tratamento fiscal deverá ser o mesmo.

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