Conheça os jovens engenheiros do Norte que venceram na Web Summit

Da fábrica em Barcelos às aulas no Porto, do acelerador chinês ao capital americano, a Smartex.ai que combate desperdício têxtil com tecnologia vai duplicar equipa e já exporta para Itália e Turquia.

Para entender a origem da Smartex.ai, startup portuguesa que venceu o concurso Pitch da Web Summit 2021, a competição anual organizada pela conferência de tecnologia, é preciso recuar cerca de cinco anos e até aos corredores e salas de aulas da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, onde os três fundadores se conheceram, tornaram amigos e – sem o saberem na altura – futuros sócios.

Foi Gilberto Loureiro, que nasceu há 27 anos no seio de uma família de Barcelos ligada desde sempre à indústria têxtil – o primeiro emprego que mete no currículo é inspetor de malhas –, quem falou do problema do desperdício ao penafidelense António Rocha, colega do mesmo ano no curso de Engenharia Física, e a Paulo Ribeiro, de Esposende e um ano mais velho, que estudava Engenharia de Redes e Sistemas Informáticos na mesma faculdade.

“Começámos a trabalhar nisto em cadeiras da faculdade. De formas muito diferentes, mas o conceito base era este problema de os produtores têxteis perderem muito dinheiro devido a fracos processos de controlo de qualidade. Continuámos a desenvolver [no final do curso] e após percebermos que era possível automatizar o processo e reduzir este desperdício usando machine learning, que isto tinha viabilidade técnica e de negócio, criámos a startup”, conta ao ECO o cofundador e CTO, António Rocha.

Gilberto Loureiro, António Rocha e Paulo Ribeiro, cofundadores da Smartex.ai.

Estávamos no final de 2018. Gilberto, CEO da Smartex.ai, saiu do Centro de Nanotecnologia e Materiais Técnicos, Funcionais e Inteligentes (CeNTI), em Famalicão e ligado ao têxtil; António deixou o emprego na Ewen, empresa de eficiência energética industrial em Gaia; e Paulo, vice-presidente para a área da tecnologia, largou a investigação no Instituto de Telecomunicações. Após algumas semanas no UPTEC – Parque de Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto, de onde estão agora prestes a sair, partiram para a China.

Foi em fevereiro de 2019, na fase pré-seed, que receberam 250 mil dólares do fundo de investimento americano SOSV que tinha um projeto de aceleração (HAX) em Shenzhen. Perceberam então ser “o melhor sítio para desenvolver projetos que envolvam hardware”. Em outubro desse ano, já com a sede mudada para São Francisco (Califórnia) porque “facilitava imenso o processo de investimento, levantaram 2,6 milhões de dólares para concretizar o fabrico e venda em escala. O produto chegou ao mercado no início de 2021.

Além dos três fundadores e da SOSV, que participou igualmente na segunda ronda, o grupo de acionistas europeus e americanos inclui a Fashion for Good (fundo da Gucci, Balenciaga, Adidas, etc.), a Spider Capital, a Momenta Partners e a DCVC, que é um dos investidores da fintech Feedzai, que em março desde ano se juntou à Farfetch, OutSystems e Talkdesk na lista de unicórnios com ADN português, reforçada pela Remote no último verão.

Do chão minhoto até à China

Apontada como a segunda maior poluente a nível mundial, a indústria têxtil desperdiça cerca de 10% da produção por defeitos de fabrico, que a Smartex.ai promete reduzir quase a zero com recurso a visão computacional e inteligência artificial. Através de uma câmara industrial, um sistema de iluminação multiespectral e um computador de placa única, deteta falhas no tecido de saída, em tempo real, alerta o operador e interrompe a produção defeituosa. A startup diz já ter poupado aos clientes 67 toneladas de tecido e 7,5 milhões de litros de água.

A Rifertex e a João António Lima Malhas, ambas de Barcelos, foram as primeiras fábricas a testar a solução, ainda numa fase embrionária. O primeiro “cliente real” foi a Tintex, de Vila Nova de Cerveira, estando o sistema já instalado na tricotagem de várias produtoras minhotas, como a Familitex ou a Polopiqué.

António Rocha avança ao ECO que a faturação vai “bater um pouco acima dos três milhões de dólares” no final deste que é o primeiro ano de comercialização do produto. O mercado português vale perto de 40%, tal como a Turquia que está a “ganhar relevância”, fazendo as restantes vendas em Itália.

A Smartex.ai encara igualmente a aposta turca como um passo intermédio para chegar ao extremo oriental da Ásia. “É um dos maiores mercados têxteis no mundo. Em termos geográficos é próximo o suficiente para irmos lá rapidamente; a diferença horária não é grande; culturalmente não é tão distante que impeça de fazer negócios; e porque achamos que é um bom preâmbulo para a meta seguinte da Ásia – a China em particular, que sozinha iguala a produção têxtil no resto do mundo todo junto”, justifica o porta-voz.

Notoriedade para “encaixar” e contratar

Nas perspetivas de longo prazo está a aplicação desta solução a outras indústrias, como o papel, plástico ou metal. Para 2022 e 2023, no entanto, o plano dos jovens engenheiros nortenhos passa por “continuar num ritmo acelerado de vendas e desenvolver novos produtos via software” para os produtores de malhas.

“Para fazer essas duas coisas bem e em escala, precisamos de ajuda financeira e de recursos que normalmente os investidores podem trazer para a mesa”, sustenta António Rocha. Para o primeiro trimestre do próximo ano está prevista a realização de uma nova ronda de investimento, tendo os empreendedores aproveitado a Web Summit para falar com potenciais parceiros de capital.

António Rocha, cofundador e CTO da Smartex.ai.Web Summit via Flickr

Esta é a segunda vez que uma startup portuguesa vence o Pitch final da Web Summit, depois da Codacy em 2014, quando a cimeira ainda era realizada em Dublin, na Irlanda. A vitória alcançada esta semana no concurso realizado no Parque das Nações traz sobretudo “ganhos de notoriedade” que contam aproveitar não só para captar investidores, mas também como uma “ajuda para contratar e atrair talento”.

Esta distinção na Web Summit traz um ganho de notoriedade [útil] para a nova ronda de investimento e que vai ajudar também a contratar e a atrair talento.

António Rocha

Cofundador e CTO da Smartex.ai

A equipa composta atualmente por 30 pessoas – só uma delas está no escritório no sul da China e na sede em São Francisco não há ninguém destacado em permanência – vai mais do que duplicar no próximo ano. A Smartex.ai conta recrutar cerca de 40 profissionais, sobretudo perfis de engenharia, mas também para as áreas de vendas e de operações.

Algumas posições a abrir em 2022 vão poder ser exercidas em trabalho remoto. No entanto, uma vez que a empresa trabalha com hardware e isso exige uma presença física, o responsável da startup ressalvou que estas vagas serão “essencialmente” para trabalhar a partir do Porto, onde já estão à procura de um novo escritório.

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