BCP diz que processo em que AdC multou bancos em 225 milhões contém “erros graves”
O mandatário do BCP criticou a “estratégia mediática” seguida pelo regulador e a duração “inaceitável” da instrução (sete anos), que lesou “gravemente as visadas”.
O BCP considerou esta sexta-feira “um caso raro e nunca visto” o processo que ficou conhecido como “cartel da banca”, apontando “erros graves” na decisão e a intenção de “promover o julgamento público e mediático dos visados”.
Nas alegações finais, no julgamento dos recursos interpostos por 11 bancos às coimas de cerca de 225 milhões de euros aplicadas pela Autoridade da Concorrência (AdC) por partilha de informação sensível durante mais de 10 anos, que decorre desde outubro de 2021 no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, o mandatário do BCP criticou a “estratégia mediática” seguida pelo regulador e a duração “inaceitável” da instrução (sete anos), que lesou “gravemente as visadas”.
O advogado do BCP criticou o facto de a AdC ter “alimentado” a imprensa com um “suposto cartel da banca”, nunca clarificando que não era este o objeto do processo, ou seja, que não está em causa uma combinação de preços entre concorrentes, mas sim partilha de informação, a qual procurou demonstrar que até teve efeitos favoráveis à concorrência.
Para o mandatário, “fica clara a intenção da Autoridade da Concorrência de promover um julgamento público e mediático dos visados”, ao colocar na imprensa “notícias cirúrgicas para condicionar o processo”.
Entre as “vicissitudes” do processo, apontou, ainda, a sua duração na fase administrativa, sete anos desde a abertura do inquérito, em 2012, até à conclusão da instrução, em 2019, de que responsabilizou a AdC, dando o exemplo da apreensão de 97.000 ficheiros, 95.000 dos quais não usou, ”gerando o caos” no acesso para impugnação.
Dos recursos interpostos, foi confirmada uma gestão “criticável” do dossier, bem como a violação do direito de defesa, por a AdC não ter permitido a presença de advogados quando interrogou testemunhas indicadas pelas visadas, disse.
Referindo as mudanças que ocorreram na AdC ao longo dos sete anos da instrução, nomeadamente o facto de o processo ter tido três instrutores, o advogado concluiu que o resultado é que “ninguém na Autoridade parece ter conhecimento claro do processo”, o qual apresenta “erros incompreensíveis numa decisão tão importante e tão mediática”.
Sobre as coimas aplicadas pela AdC, o BCP alegou que “parecem arbitrárias, aleatórias”, carecendo de fundamentação e de um tratamento equitativo das visadas.
Para o BCP, é “incompreensível” ter-lhe sido aplicada uma coima de 60 milhões de euros (a segunda maior, a seguir à CGD, multada em 82 milhões de euros), questionando qual a razão para a AdC considerar 3,4% do volume de negócios do banco em 2018, quando considerou 2% para o Santander para um volume de negócios similar, apesar de concluir por um grau de participação inferior a outras visadas.
“Não conseguimos perceber porque temos o dobro da coima de outros”, declarou o advogado, defendendo que, “no cenário improvável de condenação”, a juíza Mariana Machado reduza “substancialmente” a coima, considerando, nomeadamente, tal como fez o Ministério Público nas suas alegações, os impactos que vai gerar no banco, tendo em conta o negócio na Polónia, pelo que vai juntar ao processo as contas de 2021.
Insistindo na nulidade da prova, assente na apreensão de correio eletrónico, que os bancos alegam ser inconstitucional, o BCP centrou as suas alegações na “grande questão do processo”, a da existência de uma infração por objeto, apontando “erros graves de direito e de qualificação dos factos” na decisão administrativa e insistindo que a jurisprudência aponta para a necessidade de “comprovadamente prejudicar os consumidores”, o que, assegurou, não aconteceu.
O BCP salientou a importância do contexto jurídico e económico e referiu jurisprudência que aponta para a necessidade de serem analisados eventuais efeitos pró concorrenciais, que no processo, afirmou, não foram considerados.
O processo, em que está em causa a prática concertada de troca de informação comercial sensível, entre 2002 e 2013, nomeadamente com partilha de tabelas de ‘spreads’ a aplicar aos créditos a clientes (habitação, consumo e a empresas) e de volumes de produção, teve origem num pedido de clemência apresentado em 2013 pelo Barclays.
Neste processo, a CGD foi condenada ao pagamento de 82 milhões de euros, o Banco Comercial Português (BCP) de 60 milhões, o Santander Totta de 35,65 milhões, o BPI em 30 milhões, a CEMG em 13 milhões (coima reduzida em metade por ter aderido ao pedido de clemência), o Banco Bilbao Vizcaya Argentaria em 2,5 milhões, o BES em 700.000 euros, o Banco BIC em 500.000 euros, o Deutsche Bank (cuja infração prescreveu em outubro de 2020) e a Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo em 350.000 euros cada um, a Union de Créditos Inmobiliarios em 150.000 e o Banif (que não recorreu) em mil euros.
O Abanca, também visado no processo, viu a infração prescrever ainda na fase administrativa e o Barclays, que apresentou o pedido de clemência viu suspensa a coima de 8 milhões de euros que lhe foi aplicada. As alegações prosseguem à tarde com a audição dos mandatários do BBVA e da CCAM, seguindo-se CGD e Santander, segunda-feira, e BPI, BES, UCI e CEMG, quarta-feira, 02 de março.
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