Economia terá abrandado no segundo trimestre, antecipam os economistas

O comportamento do PIB no segundo trimestre poderá oscilar entre um crescimento de 2% e uma contração de 0,8%. Mas será sempre um abrandamento face aos 2,6% registados nos primeiros três meses do ano.

A economia no segundo trimestre desacelerou. Esta é a convicção unânime dos economistas consultados pelo ECO, em antecipação dos dados que serão divulgados esta sexta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). O “dinamismo fora do comum” registado no primeiro trimestre (um crescimento de 2,6%) não deixa grande margem para outro desempenho que não seja um abrandamento. Além disso, o arrastar da guerra na Ucrânia e das suas consequências nefastas ao nível do agravamento dos preços, que forçou os bancos centrais a agir para travar a subida da inflação, também terá pesado. Mas a dimensão desse abrandamento não é consensual, oscilando entre uma contração de 0,8% e um crescimento de 2% face ao trimestre anterior.

“A nossa previsão para o segundo trimestre é de 0,3% em cadeia, e um crescimento homólogo de 7,5%”, antecipa ao ECO Vânia Duarte da Unidade de Estudos Económicos e Financeiros do BPI. “No conjunto do trimestre, o consumo privado e as exportações serão os principais impulsionadores do crescimento: o primeiro beneficia da robustez do mercado de trabalho e ainda das poupanças acumuladas durante os confinamentos; as segundas serão positivamente impactadas pela recuperação da atividade turística, que tem superado as expectativas”, explica.

Já o departamento de estudos económico do BCP avança que “o PIB deverá exibir uma taxa de variação em cadeia de 0,1%, o que representa um abrandamento muito significativo do ritmo de expansão da atividade”. “Em termos homólogos, espera-se um crescimento de 7,3%, beneficiando ainda de efeitos base significativos inerentes à queda expressiva da atividade que se registou em igual período de 2021”, precisa a nota divulgada.

O abrandamento da trajetória de recuperação, após o forte crescimento no início do ano, “deverá refletir uma queda do consumo privado determinada, por um lado, pela dissipação dos efeitos positivos associados ao levantamento das medidas de contenção sanitária no primeiro trimestre, e, por outro lado, por uma redução dos gastos das famílias num contexto de subida dos preços e das taxas de juro”, justificam os economistas do banco. “Por sua vez, as exportações deverão ter tido um contributo positivo para o crescimento do PIB, refletindo o forte dinamismo da atividade turística entre abril e junho. No que respeita ao investimento, a persistência de restrições nas cadeias de produção globais, bem como o aumento da incerteza, poderão ter contribuído para uma maior moderação das despesas de investimento no segundo trimestre”, acrescentam.

Mais otimista, o Fórum para a Competitividade considera que no segundo trimestre, “a economia portuguesa sofreu um impacto limitado da guerra e da inflação, não tendo chegado a cair, como se chegou a temer”. As consequências economia da invasão da Ucrânia “demoraram um pouco a fazerem-se sentir”, afirma o economista Pedro Braz Teixeira que se socorre do indicador diário de atividade, calculado pelo Banco de Portugal, para demonstrar este facto. O DEI “mostrou mesmo uma aceleração em março, um crescimento ainda robusto em abril, com o enfraquecimento forte a sentir-se em maio, e algum alívio em junho”. Por isso, o Fórum estima que o crescimento em cadeia do PIB terá desacelerado de 2,6% para entre 0,5% e 2%, a que corresponde uma desaceleração homóloga, de 11,9% para entre 7,7% e 9,3%.

Já os economistas do ISEG consideram que “os dados disponíveis apontam para que a economia tenha continuado a crescer em cadeia num intervalo entre 0,1% e 0,5%, a que corresponde, em termos homólogos, um crescimento entre 7,3% e 7,7%”. Na síntese de conjuntura de julho, sublinham “a pronunciada inversão pessimista dos indicadores de confiança dos consumidores e de alguns setores empresariais, tanto em Portugal quanto na União Europeia”. Mas, “o setor dos serviços manteve-se, nomeadamente em Portugal, à margem do acentuar do pessimismo, continuando a recuperar a quebra de atividade homóloga relacionada com a pandemia e a sustentar o crescimento da economia por via do consumo privado e da procura turística externa”.

“No segundo trimestre do ano, a economia portuguesa poderá ter operado a 100,3% do nível pré-pandemia, ou seja, um pouco acima do quarto trimestre de 2019”, escreve o economista João Borges de Assunção na folha trimestral de conjuntura. Assim a Católica antecipa que a “variação em cadeia do PIB no segundo trimestre poderá ser negativa, previsivelmente de -0,8%, de modo a compensar o crescimento anormalmente elevado de 2,6% observado no primeiro trimestre do ano”. Um crescimento que segundo Borges de Assunção “dificulta a interpretação em termos das variações homólogas dos indicadores habituais”.

O Montepio também aponta para contração. “É expectável que o PIB possa ter caído no segundo trimestre numa “correção técnica” (resultante de alguns enviesamentos nesta estimativa, nomeadamente, ao nível da contabilização dos deflatores das várias componentes no atual contexto de forte subida dos preços das commodities, mas também de potenciais enviesamentos dos fatores de sazonalidade resultantes das fortes quedas da atividade económica no primeiro trimestre de 2020 e primeiro trimestre de 2021, em consequência das medidas de confinamento)”, diz ao ECO José Miguel Moreira, economista do gabinete de estudos económicos e financeiros do banco. “Os dados de atividade divulgados já para o segundo trimestre têm-se revelado melhores do que o esperado”, admite o economista, e “deixam antever uma correção inferior à que chegou a ser antecipada, apontando-se atualmente para uma ligeira descida em cadeia do PIB entre -0,1% e -0,4%, a qual deverá resultar essencialmente do efeito correção face ao inesperado forte comportamento do PIB no arranque do ano”.

“Estas variações estão influenciadas por efeitos de base anormais, independentemente do período escolhido como base. Assim, a economia portuguesa deverá registar oscilações significativas nos próximos meses, que não deverão ser interpretadas como contrações ou acelerações do crescimento, mas antes como movimentos de ajustamento próprios desta fase pós-pandémica”, alerta João Borges de Assunção. “De igual modo, a ocorrência de um episódio de crescimento muito elevado num determinado ano, como previsivelmente ocorrerá este ano, deverá seguir-se uma compensação, pelo menos parcial, na forma de crescimento mais fraco”, acrescenta o economista.

Segundo semestre mais sombrio

Os economistas apontam todos para um arrefecimento ainda maior na segunda metade do ano em virtude das incertezas em torno da crise energética na zona euro e com impacto na confiança dos agentes económicos.

“O aumento das taxas de juro, a par da ainda elevada inflação, terá impacto na redução do rendimento disponível e, por essa via, afetar o consumo. Ao mesmo tempo, o contexto de elevados custos poderá adiar decisões de investimento por parte das empresas”, explica Vânia Duarte. Mas, “a época de turismo pode ser bastante mais positiva do que o esperado, e pode atenuar os impactos negativos que se esperam nos últimos meses do ano”, acrescenta. Por isso, o BPI antecipa um crescimento do PIB em torno de 6,6% em 2022.

Os economistas do ISEG apontam para um crescimento anual entre 6,4% e 6,8%, em virtude de as perspetivas de crescimento, em cadeia, serem “praticamente nulas” na segunda metade do ano, “porque a procura externa turística está a atingir os níveis de 2019, a partir dos quais crescer é mais difícil, porque a inflação vai limitar o consumo em volume e porque o investimento é mais incerto”.

“Para a segunda metade do ano antecipamos ligeiros crescimentos em cadeia da atividade económica, sendo que, em termos anuais, continuamos a perspetivar um crescimento do PIB para o total de 2022 dentro do intervalo [+5,7%; +6,5%], com o centro em 6,1%, representando uma aceleração face ao crescimento de 4,9% observado em 2021”, diz José Miguel Moreira. Mas esta previsão “permanece rodeada de riscos ascendentes”. “Esperamos uma continuação da recuperação do setor do turismo no segundo semestre, permitindo, dessa forma, que o crescimento do PIB português supere o da média da Zona Euro, quer no segundo semestre, quer, sobretudo, no conjunto do ano”, acrescenta o economista do Montepio.

A Católica tem uma previsão anual mais conservadora: 5,2%, uma variação “amplificada pela base favorável”. “Tal seria consistente com um crescimento de apenas 0,3% em 2023, que incorpora um efeito base desfavorável resultante do grande ressalto do primeiro trimestre do corrente ano”, explica a nota do NECEP.

Recorde-se que Bruxelas, a instituição internacional que publicou as previsões mais recentes para Portugal, antecipa um crescimento recorde de 6,5%, acima dos 5,8% estimados anteriormente. Em 2023, haverá um abrandamento para 1,9%, refletindo “um crescimento menor também no consumo privado e no investimento, bem como uma procura externa moderada”. Também o FMI reviu em alta as suas previsões para Portugal, depois de incorporar mais informação sobre o primeiro trimestre, e antecipa uma evolução do PIB de 5,8% este ano.

O Banco de Portugal também já tinha revisto em alta a previsão para o crescimento da economia portuguesa este ano de 4,9% para 6,3%, no boletim económico de junho. O Governo, por seu turno, está convicto que o PIB terminará o ano 0,7% acima do nível pré-Covid, apesar do impacto da guerra, sendo a previsão para o conjunto do ano do Executivo é de 4,9%, de acordo o Orçamento do Estado para 2022 (OE2022), um valor que ainda não foi revisto em alta, apesar de todas as instituições já o terem feito.

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