A sua empresa pagou um “cheque” anti-inflação? Veja o impacto real no seu bolso
Várias empresas anunciaram apoios extraordinários para mitigar subida de preços, com diversos modelos de pagamento e valores, influenciando impacto no rendimento líquido. Veja as simulações da EY.
A medida faz lembrar o cheque que o Governo anunciou no final de setembro — os 125 euros — com o objetivo de acomodar a subida generalizada dos preços e a respetiva perda de poder de compra dos portugueses. Agora, são as empresas, um pouco por todos os setores, que têm avançado com “cheques” anti-inflação. Do retalho, passando pelas tecnológicas, até à banca os apoios assumem diversos modelos de pagamento e valores, o que influencia o impacto real no seu bolso, já que estes “cheques” anti-inflação não estão isentos de impostos, como o atribuído pelo Governo.
Os apoios monetários atribuídos pelas empresas, sejam eles pagos de forma isolada ou recorrentes no tempo, estão sujeitos a tributação, pelo menos a retenção de IRS.
Dependendo do cenário isso representa um maior rendimento líquido disponível do que noutros, em que, após os descontos, o colaborador poderá ver reduzido mais de 40% o montante bruto recebido.
No que toca aos pagamentos em cartão ou vouchers — que têm vindo a ser adotados por várias empresas –, “dependendo dos procedimentos assumidos pela entidade empregadora, poderá ser ou não feita retenção na fonte”.
A Pessoas pediu à consultora EY para preparar algumas simulações ilustrativas do impacto dos referidos apoios nos rendimentos líquidos mensais e anuais disponíveis dos profissionais.
“As simulações foram efetuadas para dois tipos de apoios distintos, i.e., apoios com natureza não regular e pagos de forma isolada num único mês (‘Cenário 1’, em que consideramos o pagamento de um apoio único, num montante de 500 euros) e apoios recorrentes no tempo (‘Cenário 2’ em que considerámos o pagamento de um apoio mensal de 100 euros, a vigorar a partir do mês de outubro de 2022)”, explica a consultora.
Além disso, em cada um dos cenários, foi feita a simulação para uma pessoa solteira, sem quaisquer dependentes; e para uma pessoa casada, único titular de rendimentos, que opta pela tributação conjunta de rendimentos e tem um dependente. Interessa ainda salientar que, para o apoio com natureza não regular, assumiu-se que o mesmo não será sujeito a contribuições para a Segurança Social.
Cenário apoio único: Solteiro, sem filhos
No ‘Cenário 1’, um trabalhador solteiro, sem filhos, com um rendimento mensal de 1.000 euros e que receba um apoio extraordinário de 500 euros, vai receber, ao final do mês mais 355 euros do que receberia sem esse bónus. Isto porque 145 euros dos 500 euros do “cheque” são deduzidos em impostos, neste caso apenas em IRS. A variação no líquido anual é, contudo, um pouco superior: 385 euros líquidos de bónus.
Cenário apoio único: Casado, com filhos
Considerando exatamente o mesmo cenário mas para um trabalhador casado, único titular de rendimentos, com um dependente e que opta pela tributação conjunta, os 500 euros de bónus traduzem-se em 405 euros líquidos mensais e 427,5 euros líquidos anuais. Uma tributação menos pesada (95 euros na variação mensal e 72,5 euros na variação anual) do que no caso dos solteiros, sem dependentes.
Cenário apoio mensal: Solteiro, sem filhos
Vejamos agora um novo cenário, em que a empresa atribui um apoio de 100 euros por mês, num total de três meses. Neste caso, o mesmo trabalhador solteiro, receberia, ao final do mês, apenas 58 euros; ao final dos três meses, 174 euros; e na variação líquida anual 198 euros.
Cenário apoio mensal: Casado, com filhos
O mesmo ‘Cenário 2’ para o mesmo trabalhador casado traduz-se, em valores líquidos, num bónus de 69 euros ao final do mês, 207 euros no total dos três meses e 223,50 euros ao final do ano.
“Na preparação das simulações anexas, foram assumidos alguns pressupostos: as presentes simulações foram efetuadas com base nas regras fiscais em vigor à data de preparação dos cálculos e visam quantificar a variação no rendimento líquido, decorrente da atribuição dos apoios extraordinários, nos moldes acima detalhados, para sujeitos passivos que obtenham rendimentos do trabalho dependente, cobertos pelo regime geral de segurança social aplicável a trabalhadores por conta de outrem; e considerando como deduções à coleta exclusivamente as deduções por dependentes (assumindo filhos com idades superiores a três anos) e sem considerar quaisquer outras deduções à coleta ou outros créditos fiscais (e.g., benefício municipal)”, detalha a EY.
E esclarece: “As simulações por nós partilhadas no dia 28/11/2022 ilustram o impacto dos apoios anti-inflação nos rendimentos líquidos mensais e anuais disponíveis em 2022. Por outro lado, as tabelas de retenção na fonte de IRS, publicadas pelo Despacho n.º 14043-A/2022 de 5 de dezembro de 2022, aplicar-se-ão a rendimentos obtidos em 2023, pelo que as mesmas não impactam os resultados anteriormente partilhados.”
Estas empresas já passaram o “cheque”
Face aos elevados níveis de inflação — o Banco de Portugal acaba de rever em alta as previsões de inflação para este ano, para 8,1%, acima das estimativas do Governo (7,4%), bem como as do próximo ano, para 5,8%, igualmente acima das previsões do Orçamento do Estado — muitas empresas têm vindo a avançar com os chamados “cheques” anti-inflação para mitigar o impacto nos rendimentos.
No retalho, há já vários exemplos. A Ikea foi uma das primeiras companhias que anunciou o pagamento extra de um salário e meio a todos os trabalhadores. O bónus surge na sequência dos resultados positivos do grupo e em apoio à subida dos preços.
Já no segmento alimentar, seguiu-se a dona do Pingo Doce, que também avançou o pagamento até 350 euros a cerca de 25 mil funcionários do grupo Jerónimo Martins. Um apoio de mais de oito milhões de euros, em reposta à inflação. A dona do Continente fez o mesmo e decidiu pagar até 500 euros a 36 mil trabalhadores, num investimento total de 15 milhões de euros. Este apoio extraordinário será atribuído em cartão Dá, criado para o efeito, com a validade de um ano.
Ainda no retalho, a Leroy Merlin foi a mais recente empresa a anunciar um apoio anti-inflação, no seu caso pago através de um voucher de 125 euros a todos os 5.750 trabalhadores em Portugal. O voucher é atribuído através de um cartão pré-pago que pode ser utilizado na rede de lojas Auchan ou My Auchan no prazo de um ano.
Estas ajudas estão também a ser anunciadas noutras áreas de atividade. É o caso da Altice, dona da Meo, que vai entregar um “cheque” até 750 euros em janeiro a 6.500 trabalhadores e da seguradora Hiscox, que atribuiu um bónus de 1.500 euros a cerca de 65% dos trabalhadores, cerca de 360 pessoas.
Mas também do grupo de comunicação Havas, que vai atribuir um apoio extraordinário de 500 euros, para os colaboradores com rendimentos mensais até 3.000 euros brutos, abrangendo perto de 85% de 500 colaboradores, bem como da tb.lx, o hub digital da Daimler Trucks, que já atribuiu um bónus de 1.200 euros aos 105 colaboradores com contrato, incluindo estagiários, de modo a mitigar o impacto da inflação.
Em setembro, já tinha sido a vez da fábrica do Tramagal da Daimler Trucks a atribuir aos cerca de 500 trabalhadores, incluindo estagiários, um pagamento extraordinário de 400 euros.
Banca também adere
Na banca, várias instituições também já anunciaram apoios extraordinários para os colaboradores. A Caixa Geral de Depósitos (CGD) irá pagar entre 600 a 900 euros aos funcionários que ganhem até 2.700 euros. O Crédito Agrícola, por sua vez, anunciou um apoio “pontual” de 750 euros, o mesmo valor avançado pelo Santander, que atribuirá a ajuda a todos os trabalhadores que recebem até 30 mil euros por ano.
Também o BCP vai pagar um “apoio extraordinário”, no seu caso de 500 euros, a todos os colaboradores que não tiverem viatura atribuída.
E o Banco Montepio também avançou pelo mesmo caminho: vai fazer um pagamento pontual de 600 euros — equivalente ao subsídio de férias ou Natal — a quem recebe até 1.500 euros. Já os colaboradores com salários entre 1.500 euros e 2.500 euros terão direito a uma ajuda de 400 euros.
E o BNP Paribas também já anunciou que vai dar vales de 300 (com rendimentos entre 30 mil e 60 mil euros anuais/brutos) e 500 euros aos trabalhadores (com rendimentos até 30 mil euros anuais), entre outras medidas de apoio para mitigar o impacto da inflação.
Já no BPI ainda nada foi anunciado e a falta de notícias está a criar mal-estar e descontentamento entre os trabalhadores. “O banco tem bons resultados e é incompreensível que não avance com apoios, como os outros”, disse Sandra Félix Salgado, coordenadora da comissão de trabalhadores do BPI, em declarações recentes ao ECO.
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