Otimismo contagia Zona Euro e recessão parece evitável. Mas “ainda não estamos completamente safos”

Previsões e dados económicos já começam a apontar para abrandamento em vez de recessão na área do euro. Queda dos preços do gás ajudou, mas há ainda riscos.

Depois de um ano em que muitos davam como certa a recessão na Zona Euro em 2023, a maré virou e o otimismo começou a tomar conta dos políticos e economistas. Um inverno mais quente que o normal e a resiliência das indústrias permitiu mitigar o impacto da guerra na Ucrânia e perspetiva-se um abrandamento económico mais moderado, ainda que não estejamos “completamente safos”, como alerta um economista do think tank Bruegel ao ECO. As reservas para o próximo inverno, a inflação e as políticas monetárias são alguns dos riscos ao cenário mais animador.

Existem “vários elementos que melhoraram a situação”, nomeadamente a descida dos preços da energia, aponta Gregory Claeys, economista sénior do think tank Bruegel, ao ECO. “Outro fator foi que muitas indústrias conseguiram substituir o gás por outras fontes de energia” e os “europeus conseguiram reduzir o consumo de gás e eletricidade”, uma situação que não era certa antes.

Finalmente, “tivemos sorte”, brinca o economista, “porque o clima foi muito melhor que em outros invernos“, o que ajudou a poupar no gás e a mitigar o impacto da guerra.

Como salienta também Sean Shepley, economista sénior da AllianzGI, a queda dos preços do gás beneficia a Zona Euro de três maneiras: reduz a pressão sobre os consumidores, o que deve “permitir alguma recuperação da procura”; para os governos comprometidos com apoiar os consumidores, através do preço da energia, o custo dessas promessas será inferior e, finalmente, “a queda nos custos de energia impulsiona os termos de troca da Zona Euro”.

Um dos indicadores que mais ajuda a mostrar a recuperação é o PMI, um índice de gestores de compras, que tira a temperatura à atividade nos setores de indústria e serviços, indica o economista do Bruegel. O PMI atingiu este mês o nível mais alto desde junho, subindo para 50,2 pontos. Além disso, a produção industrial também é um bom sinal, sendo que “muita gente esperou que caísse muito por causa da falta de fornecimento de energia, mas está a ter um desempenho melhor que o esperado”.

Sean Shepley nota também que se verifica uma melhoria nos inquéritos e expectativas para os negócios da área do euro, mas “a perspetiva de novos ganhos no dinamismo económico parece estar provavelmente dependente de uma rápida viragem do núcleo da inflação na área do euro”.

Nas últimas semanas, várias instituições reavaliaram em alta as estimativas sobre a evolução económica para este ano. Foi o caso do Goldman Sachs, que já não antecipa uma recessão na Zona Euro, e entretanto voltou até a rever em alta as suas previsões de crescimento para o PIB da área da moeda única para este ano.

GS Zona Euro 2023

Depois de uma revisão no início de janeiro, em que colocava a Zona Euro a crescer 0,6%, esta quinta-feira voltou a fazê-lo, antecipando agora um crescimento de 0,7% do PIB da Zona Euro este ano, ficando acima de uma taxa de crescimento média de 0,1% do consenso das previsões dos analistas recolhidos pela Bloomberg.

Os economistas da ConsensusEconomics também alteraram as previsões na semana passada, esperando agora que o bloco europeu registe um ligeiro crescimento. Com as nuvens a dissiparem na Alemanha, o chanceler Olaf Scholz disse à Bloomberg que a maior economia da zona do euro evitaria uma recessão, o que ajuda a impulsionar o desempenho económico do bloco.

Em Davos, o ambiente também foi de maior otimismo perante o que aí vem, sendo que até Mário Centeno se mostrou confiante de que a Zona Euro pode escapar à recessão. No Fórum Económico Mundial, Gita Gopinath, vice-diretora administrativa do FMI, também sinalizou que o fundo iria atualizar as previsões económicas. Em vez de prever um 2023 “mais difícil”, espera agora uma “melhoria” na segunda metade do ano e em 2024.

Apesar destes sinais, Gregory Claeys assume que “não diria que estamos safos: todos esperam um crescimento muito baixo e em alguns países recessões temporárias”. Existem assim ainda riscos para o desempenho económico, admite. Preparar para o próximo inverno “vai ser um desafio”, já que será necessário “voltar a encher as reservas, sem gás russo, pelo que teremos de encontrar outras fontes e usar outra energia”.

A inflação é também “um desafio, em particular para as pessoas mais vulneráveis”. Ainda assim, “tendo em conta que o preço da energia, em particular do gás, tem vindo a cair comparado com alguns meses antes, a inflação também deve cair durante 2023”. Mesmo assim, a presidente do Banco Central Europeu (BCE) já alertou que as taxas de juros vão continuar a subir rapidamente para desacelerar a inflação, que permanece muito alta.

Gregory Clays mostra-se algo “cético” com a política do BCE, já que a inflação que se vive atualmente vem de fatores externos, o que acaba por não se inserir “dentro do poder do banco central”. O economista defende que o “BCE não deve esperar para a inflação cair até 2%” para parar com a subida de juros, “porque há um atraso” no impacto desta medida.

Para o economista, as “políticas monetárias deviam ser forward looking“, ou seja, devia ser posto um travão às subidas de juros quando as previsões indicarem que a inflação vai cair para 2% no ano.

Sean Shepley salienta também que, “embora os mercados tenham ficado otimistas com a perspetiva de um declínio generalizado das pressões inflacionárias, o BCE alertou na reunião de dezembro para a possibilidade de novos aumentos de preços de bens e serviços com preços irregulares no início de 2023”. Se tal se verificar “o aperto da política monetária deve continuar a apoiar uma maior valorização do euro, mas pode atuar como um vento contrário mais forte para as ações europeias na primavera”, alerta.

Já a economia global poderá ainda sofrer um forte abrandamento este ano, acompanhado de inflação elevada, segundo antecipam as Nações Unidas. A ONU prevê que o crescimento mundial abrande para 1,9% em 2023, depois de registar uma evolução de 3% em 2022. As economias desenvolvidas deverão crescer apenas 0,4% em 2023, segundo as previsões da ONU, uma forte desaceleração face aos 2,6% estimados para 2022.

Economia portuguesa também poderá crescer acima do esperado

O primeiro-ministro, António Costa, já admitiu uma revisão em alta das perspetivas de crescimento para a economia portuguesa em 2023. “Depois destes anos difíceis com a pandemia, a guerra e a inflação, há uma resiliência grande no tecido empresarial, que tem sustentado o crescimento da economia e a evolução do emprego, e que dá a confiança de que, agora que a nível internacional há melhores perspetivas para a economia europeia e mundial, até poderemos crescer mais do que o previsto”, indicou, na semana passada.

Segundo as mais recentes previsões do Banco de Portugal, divulgadas no boletim económico de dezembro, a economia portuguesa deverá crescer 1,5% em 2023. Um valor mais otimista do que o inscrito pelo Executivo socialista no Orçamento do Estado para este ano (1,3%), que já admitiu que a realidade poderia ser melhor.

Em 2022, o comportamento da economia nacional também acabou por ser mais positivo do que o esperado, com António Costa Silva a perspetivar que o crescimento possa ter chegado aos 6,8%, três décimas acima das projeções oficiais.

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