CEO demissionária da TAP contrata advogada para contestar despedimento

Sem o pagamento de qualquer tipo de indemnização, Christine Ourmières-Widener já ameaçou retirar “consequências legais”. Inês Arruda é a nova advogada da CEO demissionária da TAP.

Inês Arruda, sócia da Vasconcelos, Arruda & Associados, é a nova advogada da ex-CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener. A gestora francesa foi demitida esta segunda-feira da companhia aérea portuguesa, onde estava desde Junho 2021.

O mandato da gestora francesa ficou marcado por várias polémicas, sendo a mais recente relacionada com o pagamento de uma indemnização de 500 mil euros a Alexandra Reis. Esta polémica veio ditar a sua saída da companhia.

Na segunda-feira, após analisarem o relatório da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) sobre a saída de Alexandra Reis da TAP, Fernando Medina e João Galamba decidiram demitir a liderança da companhia aérea: o presidente do conselho de administração, Manuel Beja, e a CEO, Christine Ourmières-Widener. Para o ministro das Finanças é necessário “um virar de página que recupere laços de confiança da TAP com o país”.

Os dois gestores foram demitidos com “justa causa”, pelo que não terão direito a qualquer indemnização. Sobre o pagamento de eventuais bónus relativos aos resultados alcançados, Fernando Medina disse apenas que “serão pagas as compensações legalmente devidas pela TAP no âmbito da lei”.

Sem o pagamento de qualquer tipo de indemnização, Christine Ourmières-Widener já ameaçou retirar “consequências legais”, abrindo espaço espaço para novos capítulos da sua passagem pela TAP.

A nova defesa de Ourmières-Widener

Inês Arruda, sócia da Vasconcelos, Arruda & Associados

Inês Arruda é atualmente sócia coordenadora das áreas de Direito Laboral e Segurança Social, Insolvência e Recuperação de Empresas, Contencioso e Arbitragem da Vasconcelos, Arruda & Associados.

Licenciou-se em direito pela Universidade Católica Portuguesa de Lisboa em 2001. O “pontapé de saída” do seu percurso profissional foi dado na Vasconcelos, F. Sá Carneiro, Fontes & Associados, entre 2001 e 2003, enquanto estagiária. Após a inscrição na Ordem dos Advogados em 2004, Inês Arruda integrou a equipa da Uría Menéndez Advogados até 2011. Entre setembro de 2011 e abril de 2012, integrou a equipa da Arruda Advogados.

Em 2012 fundou a Vasconcelos, Arruda & Associados, uma boutique law firm, com sede em Lisboa, especializada na advocacia de negócios e empresarial, assessorando clientes nacionais e internacionais.

A advogada foi premiada como várias distinções, como Lawyer of the Year – Agency Relationship – Iberian Lawyer Labour Awards | Portugal 2020; Lawyer of the Year – Advertising – Iberian Lawyer IP & TMT Awards | Portugal 2021; Best Lawyers | Recomendada em Labor and Employment Law; Lawyer of the Year – Advertising – Iberian Lawyer IP & TMT Awards | Portugal 2022; e Lexology Client Choice Awards 2022 | Labour & Employment.

Ex-CEO da TAP “perplexa” com a atuação dos advogados da SRS e da Morais Leitão

Entre os vários anexos que foram juntos à auditoria realizada pela Inspeção-Geral de Finanças (IGF) encontram-se várias referências negativas à atuação da SRS Legal, que assessorou a TAP, e à da Morais Leitão, que esteve do lado de Alexandra Reis.

A IGF foi clara nas conclusões sobre este processo de indemnização em causa, com o recurso a uma figura jurídica que não existe, isto é, um despedimento com acordo. Isto levou a IGF a concluir que o acordo da TAP com Alexandra Reis é mesmo nulo. Assim, em cinco pontos, ficaram explicadas as razões que levaram a inspeção a comunicar ao ministro das Finanças a necessidade da ex-administradora devolver 450 dos 500 mil euros brutos pagos e que levou Fernanda Medina a decidir a demissão da presidente executiva Christine Ourmières-Widener.

Mas logo nas respostas ao relatório preliminar, apresentado às partes pela IGF no final de fevereiro, Christine Ourmiére-Widener e Alexandra Reis apontam responsabilidades às sociedades de advogados Morais Leitão e SRS Legal, a que ambas recorreram externamente.

Em resposta à IGF, é respondido que Christine Ourmières-Widener “não é jurista de formação nem tem quaisquer conhecimentos jurídicos ou experiência de gestão de empresas públicas em Portugal”. Por isso, sempre que necessário, “solicita aconselhamento externo especializado”, como foi o caso. Sublinha ainda que “não foi alguma vez alertada para qualquer risco específico” que as decisões dos assessores jurídicos pudessem acarretar ou que a hipótese de enquadrar a saída de Alexandra Reis à luz das regras do estatuto do gestor público era mais favorável à TAP no que respeita a uma eventual indemnização.

E, por isso, foi com “perplexidade” que se viu confrontada, recentemente, com “as dúvidas quanto à solução jurídica encontrada”. Perplexidade essa que foi “ainda maior”, quando Christine Ourmières-Widener leu a fundamentação jurídica do relatório preliminar da IGF, explicando que “não compreende nem aceita que, no decorrer de todo o processo negocial, esses argumentos não tenham sido suscitados quer pelos consultores jurídicos da TAP (SRS Legal), quer mesmo pelos consultores jurídicos de Alexandra Reis (Morais Leitão) e ainda pelos representantes do Governo”.

Christine Ourmiére-WidenerLusa

A defesa da ex-CEO da TAP admitiu ainda que “não lhe caberia a si, pelas razões apresentadas, sequer equacionar a hipótese do enquadramento legal, à luz do Estatuto do Gestor Público”. Solução essa que “nunca foi sequer invocada pela equipa de assessores jurídicos, ao longo de todo o processo negocial”.

Tendo este “detalhe” escapado a pessoas que a ex-CEO da TAP descreve como tendo “conhecimento jurídico qualificado e com especiais deveres de zelo e diligência, quanto ao estudo de todos os cenários legais aplicados ao caso, como poderia antever outros cenários jurídicos?”, questiona a defesa da ex-líder da transportadora aérea.

No seu contraditório, a ex-CEO começa por dizer que “a condução do assunto foi atribuída a um escritório de advogados de renome que, na altura, já assessorava a TAP em questões laborais”. Relembrando que, à data, a diretora jurídica da TAP, Stéphanie Silva, se encontrava em licença de maternidade, pelo que, na equipa, não havia nenhum jurista com o perfil para matéria de tal complexidade. “Sempre que necessário, a TAP recorre a serviços jurídicos externos, fazendo-o junto de escritórios de advogados de primeira linha, como foi o caso, ao recorrer à SRS Legal”. “Foi de total boa-fé” que Christine assume ter assinado “o acordo de cessação de relações laborais”.

Por seu turno, nessas mesmas respostas aos resultados preliminares da IGF, a TAP considera que é “absolutamente normal, com base num princípio de confiança, se atue com base no aconselhamento jurídico externo (a SRS Legal)”, acrescentando que “é ainda relevante referir que a TAP já tomou a iniciativa de fazer cessar este contrato de serviços prestados pela sociedade de advogados em causa“. O mesmo foi confirmado pelo escritório liderado por Pedro Rebelo de Sousa: “a SRS Legal confirma que a assessoria jurídica à TAP — iniciada em outubro de 2020 para o processo de reestruturação da empresa — cessará a 31 de maio de 2023”, referiu fonte oficial da sociedade de advogados, cujo dossier estava entregue ao sócio César Sá Esteves.

O mandato de Christine Ourmières-Widener

Várias foram as polémicas que marcaram a passagem de Christine Ourmières-Widener na TAP. Desde logo o despedimento de milhares de trabalhadores e dos cortes salariais impostos pelo plano de reestruturação desenhado pela Comissão Europeia, que aprovou a injeção de 3,2 mil milhões de euros de verbas do Estado.

Entre as polémicas está a transformação de dois aviões A330 que foram convertidos em cargueiro. Estes aviões ficaram mais de um ano sem voar até que, em agosto, a companhia decidiu recuar e os transformou novamente em avião de passageiros. Também os vários contratos com companhias em regime ACMI (aluguer de aviões, incluindo pilotos, tripulação e manutenção), por causa do atraso da entrega de aviões Embraer, foram alvo de duras críticas.

Depois de marchas silenciosas e protestos à porta da empresa, no final do ano passado, a 8 e 9 de dezembro, Christine Ourmières-Widener enfrentou a primeira greve da companhia desde 2017, marcada pelos tripulantes de cabine. O protesto foi convocado pelo Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil, numa altura em que arrancava a negociação do novo Acordo de Empresa. E quando a companhia ainda regista prejuízos, a greve levou a TAP a cancelar 360 voos durante os dois dias, provocando perdas de oito milhões de euros em receitas e afetando 50 mil passageiros.

Antes da greve, em outubro, estalou a polémica com uma notícia, avançada pela TVI, que dava conta que Isabel Nicolau tinha sido contratada pela TAP para assumir a direção do departamento de melhoria contínua e sustentabilidade da transportadora portuguesa, por 15 mil euros mensais. Isabel Nicolau é amiga de Christine Ourmières-Widener e nunca tinha trabalhado no ramo da aviação. A nova diretora da TAP é ainda a mulher do personal trainer do marido de Christine Ourmières-Widener e um mês antes de ser contratada pela transportadora aérea nacional, o companheiro abriu uma associação sem fins lucrativos, ligada ao triatlo, com o marido da presidente executiva da TAP.

Dias antes, ainda em outubro, Christine Ourmières-Widener tinha sido envolvida numa outra polémica depois de a CNN Portugal ter revelado que a companhia tinha encomendado uma nova frota de 79 automóveis BMW para a administração e diretores, substituindo os da Peugeot. A gestora defendeu que esta renovação permitiria uma poupança de 630 mil euros anuais mas, depois das fortes críticas à administração da companhia aérea, recuou na renovação da frota automóvel. No entanto, a companhia decidiu atribuir um vale de 450 euros mensais aos diretores e administradores da TAP para serem usados na plataforma Uber, de forma a compensar a não renovação dos automóveis.

Por fim, a mudança da sede da companhia para o edifício Báltico, no Parque das Nações, foi outra das medidas da administração de Christine Ourmières-Widener que provocou forte contestação. A TAP tinha a intenção de sair do histórico edifício na Portela até março deste ano, vendendo o imóvel para passar a pagar uma renda mensal entre 3,8 milhões e quatro milhões de euros.

Tanto os sindicatos como a Comissão de Trabalhadores, assinalaram a medida como mais um caso de má gestão, alertando para a duplicação de recursos, como a segurança por exemplo. E alertaram ainda que as futuras instalações não tinham espaço para a creche que funciona 24 horas todos os dias da semana, um serviço que consideram ser “essencial” para os horários dos tripulantes, dos pilotos e dos restantes profissionais que trabalham na companhia. No início deste ano, Christine Ourmières-Widener deixou cair esta intenção.

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