Resultados positivos da TAP não são “atenuante para não cumprir a lei”, diz Medina
O ministro das Finanças garante que não avançou para a demissão da ex-CEO da TAP sem sustentação jurídica. "A base da decisão [de demissão] é uma e só uma, o relatório da IGF".
O ministro das Finanças considerou “totalmente falsa e absurda” a ideia de que o Ministério avançou para a demissão da ex-CEO e do chairman da TAP sem uma base jurídica prévia. Fernando Medina afirmou na comissão parlamentar de inquérito (CPI) à TAP que a decisão foi sustentada na solidez do relatório da Inspeção-Geral de Finanças. Revelou também que deu a possibilidade à gestora francesa para apresentar ela a demissão, para proteger a sua reputação.
“É totalmente falsa e absurda”, a “ideia que foi posta a correr” de que as bases jurídicas para a demissão da ex-CEO e do presidente do conselho de administração só tenham sido pedidas após ter sido anunciada, no dia 6 de março, afirmou Fernando Medina. “É uma ideia que tem sido propalada e difundida pelos que só pretendem atacar o Governo, fragilizar a posição do Governo e criar um embaraço que leve ao pagamento de uma indemnização” aos antigos gestores, acusou.
“A decisão é fundada em algo muito mais sólio e robusto do que qualquer parecer jurídico. O relatório da IGF faz um levantamento exaustivo dos factos, há convergência entre os diferentes intervenientes, foi construído ouvindo a totalidade dos intervenientes no processo, promoveu o contraditório entre as partes e faz uma exaustiva e profunda classificação jurídica dos factos”, apontou Fernando Medina.
O ministro sublinhou na 46.º e última audição da CPI à TAP que “a base da decisão [de demissão] é uma e só uma, o relatório da IGF”.
Filipe Melo, do Chega, insistiu: Existiu ou não um parecer jurídico, como referiram as ministras da Presidência e dos Assuntos Parlamentares. “Não existiu um parecer jurídico. Houve um lapso na comunicação que foi feita que tem responsabilidade no Ministério das Finanças e não das ministras”, respondeu Fernando Medina. “Foram classificadas como parecer jurídico notas de trabalho dos juristas para a escrita da Deliberação Unânime por Escrito”, da demissão dos gestores da TAP.
O ministro foi questionado sobre o envolvimento da sociedade de advogados Vieira de Almeida no processo. O advogado Jorge Bleck, sócio do escritório, afirmou ao Jornal Económico que o Ministério das Finanças contactou a sociedade para prestar serviços jurídicos relacionados com as conclusões do parecer da IGF.
“Depois de tomada a decisão de início da demissão foi necessário proceder à construção da deliberação da Assembleia Geral, que foi feita unicamente com base no relatório da IGF. Houve uma reunião em que esteve a Parpública, que se fez acompanhar dos seus consultores para as questões da TAP, que é a sociedade Vieira de Almeira. No início da reunião foi considerado que não seria adequado continuar e saiu“. Acrescentou que Jorge Bleck remeteu uma carta à Parpública onde esclarece tudo o que aconteceu.
Medina reconheceu também que não usou a expressão ideal quando anunciou, no dia 6 de março, a saída dos administradores da companhia aérea. Na conferência de imprensa afirmou que “o Governo decidiu a exoneração com justa causa”. “O Governo irá dar início ao processo de demissão: esta era a frase correta. Não foi a frase que foi utilizada”, assumiu.
O governante quis salientar a sua convicção de que todos os intervenientes agiram de boa-fé: “A CEO, o presidente do conselho de administração, o secretário de Estado das Infraestruturas e o ministro das Finanças, todos agiram achando que a lei estava a ser cumprida. A verdade é que lei não estava a ser cumprida. Como a violação é grave a sanção é a demissão”.
Hugo Carneiro, do PSD, aproveitou para perguntar se o ministro diria o mesmo em tribunal (ex-CEO vai contestar judicialmente a decisão) caso fosse chamado. “Julgo que estou impedido e declarar-me-ei impedido se alguma vez tiver de estar presente numa decisão contra o Estado português”.
Filipe Melo, do Chega, quis saber se não havia outro caminho tendo em conta os bons resultados conseguidos pela gestora francesa, com o regresso da TAP aos lucros. “Seria caminho impróprio do Estado de direito se começássemos a separar o cumprimento da lei dos resultados obtidos pelas empresas. Onde é que parávamos? Há 71 empresas públicas com resultados positivos. Acha que pelo facto de terem resultados positivos estão cima da lei?”, atirou.
“Ter resultados positivos não é atenuante para não cumprir a lei. O cumprimento da lei é condição básica, nuclear. Confundir os dois planos seria contrário ao Estado de direito”, reiterou.
Medina deu possibilidade à ex-CEO de apresentar demissão
O relatório da IGF que considerou ilegal a demissão foi entregue no dia 3 de março, uma sexta-feira. O ministro das Finanças relatou que lei “profundamente” o documento no fim de semana e conclui que não restava alternativa a não ser a demissão de Christine Ourmières-Widener e do chairman, Manuel Beja. Disse que partilhou essa leitura com o ministro das Infraestruturas, João Galamba, que foi da mesma opinião.
No domingo, dia 5, chamou a ex-CEO da TAP para uma reunião no Ministério das Finanças, onde lhe comunicou a intenção de a exonerar “com justa causa”, como fez questão de sublinhar. Fernando Medina afirmou que deu a Christine Ourmières-Widener a possibilidade de sair da companhia aérea por sua própria iniciativa, “para procurar minorar danos reputacionais”.
“Consciente que [a demissão] teria danos profissionais na sua carreira. Se tivesse o entendimento de apresentar a sua demissão com o objetivo de proteção face a situação mais danosa. A engenheira Christine assim não o entendeu e no dia 6 eu e o ministro das Infraestruturas comunicámos ao país a decisão que tinha sido tomada”, afirmou.
O pagamento de uma indemnização à gestora francesa nunca esteve em causa. “Dei a oportunidade de apresentar a demissão. “Foi uma possibilidade que abri por respeito pelo seu trabalho, o seu desempenho e a convicção de que restava a cumprir a lei, não estando. Os pedidos por renúncia própria não dão direito ao pagamento de indemnização“, respondeu a Hugo Carneiro, do PSD.
Fernando Medina disse que informou o primeiro-ministro sobre as conclusões a que ele e João Galamba tinham chegado em relação ao relatório da IGF. “O senhor primeiro-ministro respeitou o âmbito da decisão que o ministro das Finanças e ministro das Infraestruturas têm nesta matéria”, afirmou.
Já na última ronda de audições, Paulo Rios Oliveira fez uma intervenção em jeito de conclusão onde deixou uma série de críticas ao Governo socialista e governantes, desde a indemnização a Alexandra Reis aos 55 milhões pagos a David Neeleman.
“Desde o início que o PSD vem com uma ideia peregrina que atingindo o ministro das Finanças provocariam a queda do Governo, desde o início procuraram que a CPI me envolvesse o mais possível clamando a minha demissão”, acusou.
“Foi o serviço que entenderam prestar. Eu respondo como respondi ao longo desta comissão. Perante situação particularmente difícil para o país, agimos com rigor, procurando o apuramento verdadeiro do que aconteceu, resistindo a todas as pressões, seguindo todos os processos formais”, acrescentou.
A comissão parlamentar de inquérito para “avaliar o exercício da tutela política da gestão da TAP” foi proposta pelo Bloco de Esquerda e aprovada pelo Parlamento no início de fevereiro com as abstenções de PS e PCP e o voto a favor dos restantes partidos. Nasceu da polémica sobre a indemnização paga a Alexandra Reis para deixar a administração executiva da TAP em fevereiro de 2022, mas recuou até à privatização da companhia em 2015. Tomou posse a 22 de fevereiro, estando a votação do relatório final prevista para 13 de julho.
(notícia atualizada às 19h51)
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