Grupo dos BRICS cresce e faz frente ao G7. Dólar pode ser a vítima

Os BRICS vão acolher mais seis países, passando a representar mais de um terço do PIB mundial e quase metade da população global. Grupo alargado pode diminuir influência do dólar.

Norte e sul, ocidente e oriente, desenvolvidos e emergentes. Há muitas formas de dividir o mundo e uma delas acabou de se aprofundar: os BRICS, grupo de países em desenvolvimento criado há 16 anos, vão acolher seis novos membros, num conjunto de economias que contrasta com o G7, que agrega os países mais industrializados do mundo. A força que o bloco agora alargado terá é ainda incerta, mas a inclusão de exportadores de petróleo pode dar gás à desdolarização.

Este grupo começou por ser composto por apenas quatro países – Brasil, Rússia, Índia e China – com o acrónimo BRIC, cunhado pelo economista Jim O’Neill. O impulso inicial para esta plataforma foi dado pela Rússia em 2009, com o objetivo de desafiar a posição dominante dos Estados Unidos e aliados ocidentais (organizados no grupo G7). O primeiro alargamento ocorreu em 2011, acrescentando-se o S de África do Sul. Foi apenas agora, doze anos depois, que o grupo concordou em alargar de novo e admitir novos membros, sendo que existiam mais de 40 países interessados em entrar.

“A expansão é também um novo ponto de partida para a cooperação dos BRICS. Vai trazer novo vigor ao mecanismo de cooperação e fortalecer mais a força para a paz mundial e o desenvolvimento”, disse Xi Jinping, presidente chinês, na Cimeira onde se decidiu esta mudança. A escolha acabou por recair em seis economias: Arábia Saudita, Argentina, Egito, Etiópia, Irão e Emirados Árabes Unidos.

A escolha dos novos membros não se afigura “óbvia” para os analistas internacionais, sendo que até Jim O’Neill apontou à BBC que não lhe parece que tenha havido um “critério objetivo para determinar que países seriam convidados a aderir”. No entanto, uma nota de análise do banco ING destaca que a inclusão destas economias “parece refletir os crescentes laços comerciais com os países originais do BRICS”. “Ao longo dos últimos anos, a participação dos principais BRICS nas importações dos novos convidados aumentou de 23% para 30%, substituindo a Zona Euro, os EUA e outras economias desenvolvidas”, apontam os analistas.

O presidente do Brasil, Lula da Silva, defende que o grupo “não quer ser contraponto ao G7 ou ao G20, nem aos Estados Unidos”, mas sim que os países se organizem. Apesar destas declarações, são vários os sinais que apontam para esta ambição e divisão. Um responsável da equipa chinesa, que não quis ser identificado, disse ao Financial Times que ao expandirem os BRICS para “representar uma fatia semelhante do PIB mundial ao G7, então a voz coletiva no mundo ficará mais forte”, o que sugere a intenção de rivalizar com o grupo ocidental de grandes economias.

Se este alargamento terá impacto no poder do grupo, está ainda por apurar. Mas como aponta Henrique Tomé, analista da XTB, ao ECO, “até ao momento, conseguimos ver que o alargamento dos BRICS tem tido impacto no dólar americano, uma vez que este deixou de ser utilizado em algumas trocas comerciais, e foi substituído pela rúpia indiana e yuan chinês”.

“Além das trocas comerciais, neste momento, o alargamento dos BRICS conta com os principais produtores de petróleo a nível mundial. Sendo o petróleo a principal fonte de energia para o desenvolvimento económico, a importância do bloco aumenta consideravelmente”, acrescenta.

A desdolarização é assim uma das tendências que se poderá intensificar, sendo que “o dólar americano corre o risco de perder ainda mais a sua influência nos mercados internacionais”.

“No caso dos BRICS, por exemplo, as transações comerciais de petróleo passarão a ser em rúpias ou yuans, como alternativa ao dólar americano”, salienta o analista, ainda que seja “difícil perceber qual a moeda mais bem posicionada para substituir o dólar americano nas transações comerciais dos BRICS, uma vez que nenhuma das moedas são estáveis, aumentando ainda mais o risco cambial para eles”.

Além disso, a chances destes dos BRICS adotarem uma moeda comum, como o euro ou dólar, parece ainda muito distante, dada as divergências económicas entre todos os países membros”, admite.

Já os economistas do ING apontam que “as notícias desta expansão mais rápida – especialmente entre os exportadores de petróleo – acrescentam claramente algum impulso ao debate sobre a desdolarização”, mas salientam que “a energia representa apenas 15% do comércio global e os preços das exportações de petróleo sauditas para a China e a Índia em moedas diferentes do dólar não significam o fim do dólar como moeda internacional preferida”.

BRICS ganham terreno na comparação com o G7

Antes das novas adições, olhando apenas para os cinco membros atuais, os BRICS “representam quase metade da população mundial, são responsáveis pela produção de 30% do PIB mundial, têm as maiores reservas de divisas, no valor de 4,4 biliões de dólares, e representam 16% de todo o comércio mundial”.

Agora, as diferenças vão ser ainda maiores. Segundo as projeções do FMI, os BRICS vão representar uma fatia maior da economia mundial em 2023 (56 mil milhões de dólares) do que o G7 (52 mil milhões de dólares), utilizando PIB ajustados às paridades de poder de compra (PPP). E isto apenas contando os cinco países que atualmente davam nome ao bloco.

Já em termos de população, os BRICS também são mais expressivos. Os dois países mais populosos do mundo estão neste grupo: China e Índia. Ainda que os EUA sejam o terceiro país mais populoso, os restantes membros do G7 acabam por não representar uma grande fatia da população mundial.

Mesmo assim, entre os novos membros dos BRICS incluem-se países com uma alta taxa de crescimento populacional, como é o caso da Etiópia, o que poderá fazer com que representem metade da população mundial.

No que diz respeito ao comércio internacional, é a China que lidera as exportações nos BRICS, que atingiram mais de três biliões de dólares no ano passado. Segue-se a Índia e a Rússia, sendo que é a África do Sul que tem um desempenho mais “tímido” neste indicador. Nos novos membros, apenas a Arábia Saudita se destaca, ao ficar à frente do Brasil nas exportações.

Os restantes países têm uma fatia menor do comércio internacional: os novos membros do BRICS representam 3,7% das exportações globais e 3,0% das importações.

Diferenças entre os BRICS podem prejudicar força do grupo

Mas estes números traduzem-se numa vantagem real? Como aponta Henrique Tomé, “há muito que se discute a possibilidade dos BRICS virem a ser uma ameaça para o G7″, mas os BRICS são um grupo “muito mais heterogéneo que o G7, o que pode ser visto como um desafio”. Existem diferenças profundas em campos para além do económico, em particular na política.

“Os países membros diferem em matéria de política, economia e militar”, salienta o analista, apontando que o Brasil, a Índia e a África do Sul são democracias, mas “a Rússia e a China não o são”. “A Rússia, a China e a Índia têm armas nucleares. O Brasil e a África do Sul não têm”, acrescenta.

Se já antes tinham diferenças, “a entrada de novos membros – Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Argentina, Egito, Irão e Etiópia – continua a fazer com que seja difícil chegar a um consenso comum dentro do bloco, uma vez que todos os novos países membros têm também necessidades, políticas e culturas diferentes”, salienta.

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