Rui Pinto sabe esta segunda-feira se é condenado ou absolvido no caso Football Leaks

Rui Pinto vai finalmente conhecer o desfecho do processo em que está acusado de 90 crimes, no caso Football Leaks. A leitura do acórdão está agendada para as 14h30.

Três anos após o início do julgamento, que foi interrompido por diversas vezes, o hacker Rui Pinto vai finalmente conhecer o desfecho do processo em que está acusado, no âmbito do caso Football Leaks. A leitura do acórdão está agendada para as 14h30, no Juízo Central Criminal de Lisboa.

Rui Pinto está acusado de 90 crimes, sendo 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.

Entre os visados estão Jorge Jesus, Bruno de Carvalho, o então diretor do DCIAP Amadeu Guerra e os advogados José Miguel Júdice, João Medeiros, Rui Costa Pereira e Inês Almeida Costa.

Mas afinal quem é o famoso hacker? Natural de Mafamude, Vila Nova de Gaia, Rui Pinto, de 34 anos, é considerado por muitos como um denunciante, em inglês whistleblower, e por outros um pirata informático, ou seja hacker.

Corria o ano de 2019, quando Rui Pinto se assumia colaborador do site “Football Leaks”, criado em 2015. Segundo o arguido, esta plataforma surgiu após a divulgação do escândalo de corrupção na FIFA, que levou à detenção de vários dirigentes, e tem como objetivo divulgar a “parte oculta do futebol”. Assim, a partir de Budapeste e através desta plataforma, Rui Pinto divulgou diversos documentos polémicos sobre o futebol português e mundial.

No âmbito de um mandato de detenção europeu, foi detido no dia 16 de janeiro de 2019 em Budapeste. Após o “rebentar” do escândalo, em março de 2019, Rui Pinto foi entregue pelas autoridades húngaras à justiça portuguesa, tendo ficado em prisão preventiva no âmbito de um inquérito do Departamento Central de Investigação e Ação Penal. Inicialmente foi apenas indiciado por seis crimes.

Amnistia pode salvar hacker de quantos crimes?

O Governo aprovou e Marcelo promulgou. Desde o dia 1 de setembro, jovens com menos de 30 anos (à data dos factos praticados) condenados por crimes com moldura penal até oito de prisão estão a ser amnistiados. O motivo? A vinda do Papa e a realização da Jornada Mundial da Juventude, em Lisboa.

Pelo menos em 14 dos 90 crimes em que está acusado, o arguido pode vir, de facto, a aproveitar a amnistia. Isto porque, pelo menos o crime de violação de correspondência é punível apenas com pena de prisão até um ano ou pena de multa e que, por isso, pode ser enquadrado na amnistia.

Mas há outros crimes pelos quais o hacker está a ser julgado como sabotagem informática (punido de três a dez anos), extorsão, na forma tentada e de acesso indevido (68) pelos quais pode vir ainda a ser condenado no âmbito do processo Football Leaks.

A lei compreende exceções ao perdão e amnistia, não beneficiando, nomeadamente, quem tiver praticado crimes de homicídio, infanticídio, violência doméstica, maus-tratos, ofensa à integridade de física grave, mutilação genital feminina, ofensa à integridade física qualificada, casamento forçado, sequestro, contra a liberdade e autodeterminação sexual, extorsão, discriminação e incitamento ao ódio e à violência, tráfico de influência, branqueamento ou corrupção.

Defesa quer pena suspensa para hacker. MP quer pena efetiva

A defesa de Rui Pinto, advogado Francisco Teixeira da Mota, defendeu em tribunal que a decisão do coletivo de juízes deverá ser a de pena de prisão suspensa, sublinhando que será “suficiente”. No encerramento das suas alegações finais, o advogado do criador da plataforma eletrónica assumiu somente a prática de três crimes de acesso ilegítimo (Sporting, FPF e PLMJ) e quatro de acesso indevido (Sporting, FPF, PLMJ e PGR).

Francisco Teixeira da Mota argumentou ainda sobre o contexto da tentativa de extorsão à Doyen, com o conhecimento de negociações, mas vincou a desistência por escrito, que deveria redundar num facto não provado: “ele escreveu que não queria nem um cêntimo”.

Francisco Teixeira da MotaMARIO CRUZ/LUSA

Também a defesa de Aníbal Pinto, o outro arguido do processo acusado de extorsão na forma tentada, pediu a absolvição e considerou que a pronúncia contra o seu cliente foi a “cola” para a prisão preventiva de Rui Pinto. Nas alegações finais, o advogado João Azevedo questionou a credibilidade do trabalho dos inspetores da Polícia Judiciária (PJ) que estiveram envolvidos na operação de vigilância ao encontro entre o antigo CEO do fundo de investimento Doyen, Nélio Lucas, e o seu colaborador Pedro Henriques com o arguido Aníbal Pinto, na área de serviço da autoestrada A5, em Oeiras, em 2015.

O advogado considerou que Aníbal Pinto merecia duas medalhas: uma por ter cumprido “religiosamente” o estatuto da Ordem dos Advogados (OA) e outra por ter “recusado a oferta de um milhão de euros [feita por Nélio Lucas] para identificar o seu cliente [Rui Pinto]”. João Azevedo tentou ainda contrariar a acusação de que Aníbal Pinto terá intermediado, com intenção de também lucrar, uma tentativa de extorsão de Rui Pinto à Doyen, afirmando que o arguido se limitou a “representar um cliente num ato legal”.

João Azevedo afirmou o seu cliente questionou a OA sobre se deveria denunciar Rui Pinto às autoridades, lembrando que lhe foi dito que deveria cumprir o estatuto da ordem, ou seja, não denunciar. O advogado rebateu a acusação do MP de que Aníbal Pinto queria receber honorários muito acima do que se praticava, lembrando que “desde o primeiro contacto de Rui Pinto, Aníbal Pinto escreveu sempre que nunca pactuaria com qualquer irregularidade”, lendo uma mensagem de correio eletrónico enviada pelo seu cliente a Artem Lobuzov [nome utilizado por Rui Pinto].

Já o Ministério Público (MP) pediu pena de prisão efetiva para o hacker por crimes de extorsão, acesso ilegítimo e violação correspondência. A procuradora do MP, Marta Viegas, considerou que o único crime que não foi provado foi o de sabotagem informática à SAD do Sporting. No entender do MP, os acessos ilegítimos de Rui Pinto a contas de email de trabalhadores do Sporting, entre os quais Bruno de Carvalho, ex-presidente, e Jorge Jesus, antigo treinador da equipa de futebol, “não foram o motivo da queda do sistema, que já se encontrava em baixo”.

Marta Viegas considerou também provado que o outro arguido do processo, o advogado Aníbal Pinto, deve ser condenado pelo crime de extorsão na forma tentada, pelo qual está acusado. De acordo com a procuradora, Aníbal Pinto teve acesso a toda a rede de caixas de correio, conteúdos que foram depois exfiltrados.

Julgamento sucessivamente interrompido a pedido da defesa

Desde impossibilidade de inquirir testemunhas por se encontrarem de férias até surtos de Covid-19 e greves, o julgamento do processo Football Leaks ficou marcado por sucessivos adiamentos. Um deles tem a ver com o o facto de Rui Pinto ter ido às instalações consultar a prova do apenso F e o disco rígido RP3, que contém alguns dos e-mails pirateados pelo próprio.

O arguido Rui Pinto pediu o acesso aos e-mails que terá pirateado por considerar “indispensável para se poder defender em tribunal”. Os e-mails que alegadamente roubou encontram-se no chamado apenso F — uma parte do processo onde a PJ guardou as caixas de correio eletrónico integrais encontradas nos discos apreendidos e que pertencem a responsáveis de clubes de futebol, a alguns dos mais importantes escritórios de advogados portugueses, como a PLMJ.

O objetivo do pedido de cópia do apenso, alegou a defesa de Pinto, seria o de “analisar os ficheiros informáticos constantes no Apenso F, exclusivamente, do ponto de vista técnico, através de pesquisa forense, procedendo à análise de metadados e estruturas de dados, com recurso a ferramentas forenses que lhe permitam ter um conhecimento diferenciado da prova.

“Todos os elementos acedidos ilicitamente por Rui Pinto, que constam do apenso F, apenas podem ser relevantes para a defesa se forem para a acusação, pelo que o arguido não precisa de ir procurá-los, o Ministério Público já o fez e disponibilizou-os aos sujeitos processuais. Permitir ao arguido que consulte e armazene tudo o que obteve ilicitamente e que, por isso, se encontra a ser julgado, apenas com base no jargão intimidatório de ser necessário à defesa é grave e inadmissível, além de ridículo”, alegaram os assistentes, no pedido de recurso que fizeram para a Relação.

A Relação veio decidir que “em caso algum serão entregues as duas pen drives que constituem o apenso F ao arguido para que este pura e simplesmente as consulte”, disseram na altura os desembargadores. Mas aceitou que Rui Pinto tenha acesso aos ditos e-mails nas instalações da PJ, sob a supervisão da mesma. Para os assistentes e para o Ministério Público, o facto de Rui Pinto ter acesso às caixas de correio eletrónico — que no fundo é a razão pela qual está a ser julgado — seria uma duplicação do crime e de penalização das vítimas.

Da prisão preventiva à liberdade

Rui Pinto esteve em prisão preventiva entre o dia 22 de março de 2019 e 8 de abril de 2020 e em prisão domiciliária até ao dia 7 de agosto de 2020, tendo sido libertado “devido à sua colaboração” com a PJ e ao seu “sentido crítico”, mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.

Na altura em que foi preso preventivamente, a juíza de instrução criminal, Margarida Alves, justificou a medida com a inversão da postura do arguido, que passou a apresentar “um sentido crítico e uma disponibilidade para colaborar com a justiça” e, por outro, dizendo que as fronteiras se encontravam sujeitas a elevados controles devido à pandemia de Covid-19, razão pela qual entendeu “que se mostrava reduzido o perigo de fuga”.

No início de junho de 2020, o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso do Ministério Público e manteve a decisão instrutória, proferida em 17 de janeiro de 2020, que pronunciou Rui Pinto por 90 crimes e não pelos 147 que constavam da acusação do MP.

Em setembro de 2019, o MP acusou Rui Pinto de 147 crimes, 75 dos quais de acesso ilegítimo, 70 de violação de correspondência, um de sabotagem informática e um de tentativa de extorsão, por aceder aos sistemas informáticos do Sporting, da Doyen, da sociedade de advogados PLMJ, da Federação Portuguesa de Futebol, da Procuradoria-Geral da República (PGR) e da Plataforma Score e posterior divulgação de dezenas de documentos confidenciais destas entidades.

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