Têxtil dá “respaldo” a Costa Silva “para que exista mais economia no Governo”
A viver “um ano para esquecer”, indústria têxtil queixa-se que “empresas estão esquecidas” e Ministério da Economia é “voz pouco atendida dentro do Executivo”, atacando falta de "ambição" no OE2024.
A enfrentar os “graves problemas” de uma conjuntura “profundamente negativa”, marcada pelo “contexto geopolítico delicado e perigoso” e pelos efeitos de uma crise económica que “condiciona o poder de compra dos principais mercados de exportação”, a indústria portuguesa do têxtil e vestuário (ITV) admite que “este será certamente um ano para esquecer, pela dimensão da queda nas vendas ao exterior, tanto em valor como em quantidade”, mesmo com um desempenho acima da média europeia.
No tradicional discurso do Estado do Setor, com que encerrou o fórum anual desta indústria, realizado esta tarde em Barcelos, Mário Jorge Machado, presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal (ATP) dramatizou que “é nestes momentos que as políticas públicas deverão ajudar, mitigando os efeitos negativos da conjuntura, neutralizando os custos de contexto e tendo políticas públicas ativas para apoiar as empresas a aumentar, a reestruturar e a relançar a atividade”. “As empresas, ao dia de hoje, estão esquecidas”, lamentou.
O porta-voz dos empresários têxteis pediu “muito mais ambição” no Orçamento do Estado para 2024, onde não encontra medidas de estímulo à atividade económica, “estando muito focado na distribuição, ignorando quem cria valor, realiza investimento e tem talento e mérito no país”.
O setor ouve pedidos para ganhos de escala nas organizações, mas o documento apresentado há duas semanas por Fernando Medina não trouxe “medidas que incentivem o crescimento, a produtividade e a expansão, tendo como consequência a previsão de um fraco crescimento económico”.
Temos de ter muito mais ambição no Orçamento do Estado, onde não se encontram medidas de estímulo à atividade económica e à geração de riqueza, estando muito focado na distribuição, ignorando quem cria valor, quem realiza investimento e quem tem talento e mérito no país.
Perante o secretário de Estado da Economia, Pedro Cilínio, Mário Jorge Machado disse “compreender e louvar o esforço” do Ministério da Economia para se tornar o “provedor das empresas”. No entanto, lamenta que a tutela liderada por António Costa Silva seja “uma voz pouco atendida, talvez por razões ideológicas” dentro do Executivo.
O líder do setor têxtil dispõe-se, por isso, a “reforçar o respaldo das suas iniciativas, dando a força que falta, para que exista mais economia no Governo, mais fomento nas políticas públicas, mais atenção às empresas e aos empresários, pois serão estes – e sobretudo estes – que farão de Portugal um país mais prospero e desenvolvido”.
Em particular, este setor composto por mais de 5.000 sociedades e que assegura perto de 128 mil postos de trabalho nas contas da ATP, embora mais de metade das empresas estime cortar no emprego até ao final deste ano, aponta o dedo ao Banco de Fomento, que “ainda não funciona nem consegue cumprir a missão para que foi criado, tolhido pela burocracia e pela falta de recursos”.
Mário Jorge Machado diz que a instituição liderada por Ana Carvalho não auxilia a capitalização das empresas nem não dá a “indispensável cobertura sequer a operações de risco”, recusando-se a aprovar projetos de investimento que permitiriam às empresas ganhar escala e mercados.
Os fundos comunitários estão igualmente na mira da indústria nacional do têxtil e do vestuário. É que se o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) foi destinado à Administração Pública e “a poucas empresas, excluindo praticamente todo o tecido empresarial privado”, alega o responsável, também o Portugal 2030 “tarda em arrancar”, estando a chegar ao final deste ano “sem sequer os regulamentos estarem fechados e as call abertas”.
“Como é possível manter programas de internacionalização, conjuntos ou individuais, num quadro desta natureza, exigindo-se o desembolso antecipado de recursos que são muito escassos, mas que, a não ser feito o sacrifício – diria mesmo o milagre –, criaria descontinuidades gravíssimas, que deitariam por terra o esforço de décadas e que asseguram que o país realiza mais de 50% do PIB nas exportações, seja afinal sustentável?”, questionou.
Contra o green washing, com “vantagem comparativa” na sustentabilidade
O setor do têxtil e vestuário português vive hoje “um dos momentos mais desafiantes da sua história recente”. Mas a verdade é que, desde o início do século, tem atravessado sucessivos “choques competitivos”. Desde a abertura do comércio têxtil à concorrência chinesa até ao período da troika, passando pela pandemia e pela guerra na Ucrânia que “obrigou as empresas a verdadeiros exercícios de sobrevivência”.
A resposta tem sido o reforço da presença nos mercados internacionais e a fuga ao estatuto de “passivos tomadores de encomendas”.
“Resiliência e tenacidade têm sido a chave para que a ITV se mantenha viva, com uma reputação global de excelência, tornando-se em muitos casos trend setters na inovação de produtos e processos. Contudo, os mais recentes sinais fazem-nos pensar que todos os argumentos que nos permitiram estar aqui hoje, não serão suficientes no futuro, pois, simultaneamente, com as oscilações da conjuntura, que exigem flexibilidade e imaginação, existem mudanças profundas e estruturais na indústria da moda e que estão a tornar-se um verdadeiro game changer, que será ainda mais seletivo para quem nela opera”, completa o líder da ATP.
Neste particular, Mário Jorge Machado defende que a indústria portuguesa tem uma “vantagem comparativa” quando o fator da sustentabilidade entra na equação do setor. Isto porque, frisa o dirigente associativo, as empresas nacionais já incorporam esta realidade “há muito” e têm sido “capazes de demonstrar a sua genuinidade nos materiais que usam, na energia limpa que empregam, nas condições de trabalho que asseguram e na logística que utilizam para fazer chegar os produtos aos seus clientes”.
“Não há muitas indústrias do mundo em que a ‘traceabilidade’ do produto e do processo seja tão transparente como a portuguesa, diferenciando-se especialmente da concorrência de países terceiros, cujas práticas de green washing já são bem conhecidas do público em geral”, conclui Mário Jorge Machado.
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