Megaprocessos duram em média oito anos. Investigação é mais demorada que o julgamento
Entre todas as fases do processo, a duração total até trânsito em julgado na Comarca de Lisboa é, em média, de oito anos e um mês. 77% têm uma fase de investigação mais demorada face à de julgamento.
A duração total de cada megaprocesso até trânsito em julgado, sem possibilidade de recurso, é, em média, de oito anos, sendo a fase de investigação mais demorada que a fase de julgamento. Estas são duas das conclusões apresentadas no estudo “Processos de especial complexidade” feito pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa e divulgado pelo Conselho Superior da Magistratura.
O estudo é apresentado esta quinta-feira, no âmbito da conferência “Megaprocessos – Quando a justiça criminal é especialmente complexa”, que decorre entre quinta e sexta-feira no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa. Foi realizado a partir de 140 processos de criminalidade complexa distribuídos na comarca de Lisboa, desde 2013 até 2023. Entre estes estão processos como o BPN, o caso EDP (que envolve Salgado e Manuel Pinho), a Operação Marquês mas exclui a mais recente Operação Influencer e um dos maiores processos da justiça portuguesa: o caso do Universo Espírito Santo.
Segundo este estudo, todas as fases processuais são mais céleres quando existem medidas de coação privativas da liberdade, como a preventiva ou a prisão domiciliária, sendo que os períodos mais rápidos neste contexto são entre a acusação e a fase seguinte e a decisão instrutória e o julgamento.
“Na totalidade dos processos analisados, 77% têm uma fase de investigação mais demorada face à fase de julgamento“, lê-se no estudo que a Advocatus teve acesso. Ainda assim, os processos mais morosos na fase de inquérito não correspondem aos mais demorados na fase de julgamento.
Entre as causas apontadas para a morosidade nos processos está o número de testemunhas quando são ouvidas mais do que uma vez ou quando se ouvem menos testemunhas por sessão, o número de sessões de julgamento e a existência de “incidentes”, como pedido de escusa do juiz, pedido de perícias, recusas do juiz, arguição de nulidades ou conflito negativo de competência.
Entre os tipos de crime dos processos que mais demoram a investigar na fase de inquérito está o de terrorismo, fraude, discriminação racial, branqueamento e abuso de confiança. Na fase de instrução os de abuso de poder, falsificação, corrupção e peculato. Já na fase de julgamento, de extorsão/coação, abuso de poder, abuso de confiança, abuso de autoridade militar e peculato.
Processos duram em média oito anos
Entre todas as fases do processo, a duração total até trânsito em julgado na Comarca de Lisboa é, em média, de oito anos e um mês. Ainda assim, 6% dos processos demoram mais de 15 anos até ficarem concluídos.
Já nos 57 processos sem trânsito em julgado a decorrer na Comarca de Lisboa, a média é de nove anos e três meses, ou seja, superior aos processos que já transitaram em julgado. O maior número de processos situa-se entre os oito e nove anos (21%). Cerca de 9% dos processos demoram mais de 15 anos.
Analisando a duração total dos processos com e sem medidas de coação, conclui-se que há uma predominância de processos até oito anos de duração total quando existem medidas de coação privativa da liberdade. Já nos processos sem medidas de coação existe uma maior distribuição ao longo do tempo.
Relativamente às fases processuais, dos processos sob estudo conclui-se que é possível verificar a relação de tempo das três fases, “sendo que em 77% dos processos, a fase de investigação é superior à fase de julgamento”.
Na fase de inquérito, dos 132 processos analisados, verificou-se que, em média, a duração é de três anos e oito meses. A maioria dos processos duram até três anos e apenas 6% duraram mais de sete anos.
Por outro lado, na fase de instrução, dos 118 processos considerados, a duração média foi de cinco meses e 25 dias. “Apesar do valor médio indicado, verifica-se que na maioria dos processos, 53% (62), esta fase dura até três meses. No entanto, 18% (21) dos processos apresentam uma duração superior 14 a nove meses”, lê-se.
“Se for tida em consideração metade do tempo médio de instrução, dois meses e 28 dias, existem 51 processos com esse tempo ou tempo inferior. Assinala-se, porém, que em 10 processos a instrução durou menos de um mês”, refere o estudo.
Por fim, na fase de julgamento, dos 109 processos analisados, a duração média é de cerca de dois anos e três meses. “Na maioria dos processos, 57% (62) a fase de julgamento tem uma duração inferior a dois anos e somente 9% (9) dos processos duram mais de cinco anos”, explicam.
Com julgamento realizado até metade do tempo médio, um ano e um mês, encontraram-se 44 (40,4%) processos, havendo seis processos em que esta fase durou menos de seis meses. “Quando se tem em consideração o dobro do tempo médio de julgamento, quatro anos e seis meses, encontram-se 11 (10,1%) processos com valores iguais ou superiores. Destes sobressaem
4 processos em que o julgamento durou mais de 7 anos”, lê-se.
Burla é o crime com maior incidência
Os megaprocessos, ou processos de especial complexidade, englobam vários tipos de crimes que podem ir do branqueamento ao peculato. Neste estudo foram analisados apenas o crime principal ou mais relevante tendo em conta o número de crimes totais no processo associado ao crime base, a distinção do crime base dos crimes instrumentais e o crime base numericamente prevalecente em sede das várias fases.
Em 55 processos, o crime principal é o de associação criminosa (40%), mas como este crime “tendencialmente cai em sede de julgamento”, nestes casos o estudo focou-se no crime seguinte mais relevante.
“Verifica-se que o crime com maior incidência é a burla (com 35 processos – 25% do total), logo seguida da fraude e da corrupção. No outro extremo (com apenas um processo) temos vários tipos de crimes”, refere o estudo.
Considerando os processos já com trânsito em julgado, 68 processos, os mais morosos foram os relativos à extorsão/coação, fraude e abuso de poder, que tiveram uma média de duração de mais de 10 anos. Já os menos morosos, foram os processos com crimes de auxílio à imigração ilegal e roubo, com uma média de quatro anos.
O estudo apresentado esta quinta-feira conclui ainda que, relativamente ao número de crimes, não parece haver uma relação com a duração da fase de inquérito. “Apesar do processo com o maior número total de crimes (7679 crimes) ter demorado quase sete anos em fase de inquérito, o processo que demorou mais tempo tinha apenas um total de 32 crimes”, referem.
Também tendo em consideração o prazo médio da fase de inquérito, por grupo de número de arguidos, parece haver uma ligeira relação, mas não muito definida. Ou seja, conforme aumenta o número de arguidos, o prazo do inquérito diminui.
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