Recuperação de arte roubada em 2023: Do acaso ao “Indiana Jones da arte”
Histórias de recuperação de obras perdidas e roubadas foram agora reportadas pela Innovarisk, agência portuguesa da seguradora Hiscox, especialista em arte e antiguidades.
Entre as obras de arte mais significativas recuperadas em 2023 estão dois quadros de Dalí e uma pintura de Van Gogh de 1884, revela um relatório da seguradora Hiscox, agora divulgado em Portugal. A companhia faz notar a atividade do recente Museu de Arte Roubada, que surgiu após a invasão da Ucrânia, com o objetivo de recriar e catalogar virtualmente as obras que a Rússia terá subtraído a museus ucranianos, a fim de facilitar uma futura devolução.
Através deste tipo de iniciativas, milhares de obras saqueadas têm sido recuperadas ao longo dos anos. Mas há muitas outras que regressam à sua origem quase por magia, acidente ou negligência.
O que estas situações têm em comum é que, de uma forma ou de outra, as peças foram recuperadas devido a um exaustivo processo de busca e identificação ou a uma componente de acaso.
A Hiscox, seguradora internacional especializada em seguros de arte, representada em Portugal pela Innovarisk, analisou algumas destas obras de arte que foram descobertas ou recuperadas. ECOseguros reproduz o texto.
Obras recuperadas: Também há mérito de um “Indiana Jones”
Houve obras históricas que encontraram o caminho de volta a casa “pelo próprio pé”. Foram o caso de:
- Uma Imaculada Conceição, de Velázquez, esteve durante 97 anos por cima da cabeceira de uma cama. Soledad de Rojas nasceu a 1 de janeiro de 1923, e faleceu a 23 de julho de 2020 no mesmo quarto da casa da sua família na rua Albuera, em Sevilha. Por cima da cabeceira da sua cama, uma Imaculada Conceição repousou durante os seus 97 anos de vida, segurando o filho. Antes de morrer deixou a tela como herança à freguesia de Magdalena e, de lá, foi enviada para o Instituto Andaluz de Património Histórico para ser restaurada. Foi assim que os especialistas descobriram ser uma obra de um jovem Diego de Velázquez, um dos maiores génios da arte espanhola, quando tinha apenas 15 anos;
- Pedido de certificação devolve pintura do século XVIII. Há quase 20 anos, em 2005, cinco pinturas foram roubadas do Museu Histórico Regional “Palacio Inca Garcilaso de la Vega” em Cuzco, no Peru. Entre eles “O Batismo de Cristo no Jordão”, um valioso óleo sobre tela do século XVIII que fazia parte do património cultural do país. Em fevereiro de 2023, o seu proprietário, um cidadão peruano, solicitou o certificado de origem à instituição responsável pela emissão destas, que encontrou no verso da tela uma etiqueta e um código de catalogação que indicava como proveniência o referido museu. Após a sua deteção, foi imediatamente contactada a Direção de Recuperação, que comprovou tratar-se de uma das obras roubadas, tendo sido devolvida ao seu verdadeiro dono;
- Os ladrões desconheciam o verdadeiro valor de duas obras de Dalí. Em 1922, Salvador Dalí pintou dois desenhos a carvão para ilustrar uma edição do livro ‘Les gràcies de l’Empordà’, de Pere Coromines, que nunca viu a luz do dia. No entanto, as obras ‘Vino rancio’ e ‘Las Sardanas de la fiesta mayor’ passaram a ser propriedade da família Coromines, em Barcelona. Mais de 100 anos depois, no início de 2022, três ladrões assaltaram a casa e roubaram os dois desenhos. No entanto, após uma tentativa de venda dos quadros em maio de 2022, um comprador anónimo alertou a polícia dado que uma obra deste tipo, atualmente avaliada em 300 mil euros, nunca passaria despercebida no mercado. Em 2023, os desenhos foram finalmente devolvidos aos seus proprietários.
O outro lado da moeda, investigações cinematográficas que envolvem polícia, detetives e até a Interpol:
- Arthur Brand, o “Indiana Jones da arte”, recupera um Van Gogh de 1884. Em março de 2020, no início do confinamento devido à pandemia, um ladrão invadiu o Museu Singer, na cidade holandesa de Laren, e roubou uma pintura de Van Gogh de 1884, avaliada em vários milhões de euros, conhecida como o ‘Jardim Reitoral em Nuenen na primavera’. Após três anos de investigação, Arthur Brand, detetive conhecido como o “Indiana Jones da arte”, em colaboração com a polícia holandesa, descobriu que o ladrão tinha conseguido chegar a casa, em Amsterdão, com a pintura dentro de uma almofada num saco da IKEA. Não demoraram muito tempo a localizar o ladrão, já que o seu ADN foi encontrado tanto no local deste crime, como de outros;
- Uma pintura de São Dimas de Juan de Ribalta foi localizada pela Interpol. No início do ano de 2023, ‘A Crucificação de São Dimas’, da autoria do pintor da escola valenciana Juan de Ribalta do século XVII, foi finalmente devolvida ao Museu da Cidade de Valência. 44 anos antes, em 1979, o quadro foi roubado do mosteiro de San Miguel de los Reyes e, alguns anos depois, em 2000, foi localizado pela Interpol na cidade italiana de Spezia, nas mãos de um cidadão italiano, e exposto no Museu Amedeo Lía. No entanto, só agora o Tribunal de Recurso de Génova decidiu a favor do Município de Valência, tendo a obra sido transferida para o museu valenciano.
Alguns bens artísticos que ainda não regressaram às origens
As descobertas e recuperações não fazem esquecer obras e património que são muito procuradas pelas autoridades e pelas seguradoras. São exemplo:
- Joias antigas do Museu Britânico vendidas no eBay. Em agosto de 2023, os responsáveis do Museu Britânico detetaram que, entre 1.000 e 2.000 peças em ouro e pedras semipreciosas, datadas do século XV, da sua coleção e no valor de milhões de libras, tinham desaparecido, desencadeando vários rumores e polémicas. Apesar do seu valor histórico e material, poucos dias após o evento, foi relatado que uma parte delas, com um valor estimado de 50 mil libras, estavam a ser vendidas na plataforma eBay por cerca de 40 libras. Até ao momento, a Polícia Metropolitana de Londres e a divisão de crimes económicos da Scotland Yard continuam a tentar esclarecer os factos, e procuram recuperar as obras roubadas ao museu;
- 12 esculturas à venda no mercado internacional para financiar o Estado Islâmico. Em 2016, o estudante Morgan Belzic estava a recolher informação para a sua tese de doutoramento, quando descobriu que 12 esculturas que tinham desaparecido na Líbia, após a queda de Muammar Kaddafi em 2011, estavam em antiquários, e algumas delas em Espanha. Sem hesitar, denunciou a descoberta e, após um processo de investigação, descobriu-se que não se tratava de um roubo de arte comum, mas sim de uma parte do que se conhece como “antiguidades de sangue”, ou seja, obras saqueadas e vendidas ilegalmente para financiar o Estado Islâmico. Estas obras, que estavam guardadas no Museu Arqueológico Nacional, e no Instituto do Património Cultural de Espanha, foram, entretanto, entregues ao embaixador da Líbia em Espanha, estando neste momento a aguardar a sua devolução definitiva.
André Carvalho, subscritor de Arte e Clientes Privados da Innovarisk, conclui: “O mundo da arte está repleto de histórias curiosas relacionadas com o furto de obras: seja pela audácia ou pela complexidade, a nossa curiosidade desperta quando ouvimos falar sobre o roubo de uma obra. O mesmo acontece quando sabemos que foi recuperada e devolvida ao seu proprietário, especialmente quando regressa “a casa” sã e salva. Com a tecnologia que usufruímos hoje e a competência das autoridades, fica a esperança de que mais histórias com um desfecho feliz aconteçam”.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Recuperação de arte roubada em 2023: Do acaso ao “Indiana Jones da arte”
{{ noCommentsLabel }}